Em diversas partes do país, jovens estudantes do ensino médio à
universidade vêm desenvolvendo projetos acadêmicos usando a biomassa da
cana-de-açúcar como base para a criação de produtos biodegradáveis. O
consultor de Emissões e Tecnologia da União da Indústria de
Cana-de-Açúcar (UNICA), Alfred Szwarc, cita duas destas soluções
inovadoras premiadas no exterior: um detergente de origem renovável com
potencial para ajudar no combate aoAedes aegypti sem causar
grandes impactos ao meio ambiente, e uma bandeja de bagaço e palha de
cana que pode substituir algumas embalagens de isopor usadas por
padarias e supermercados.
“É estimulante notar como a cana continua contribuindo para o futuro
da ciência brasileira, motivando estes jovens pesquisadores a criarem
produtos cada vez mais alinhados com a questão ambiental”, avalia o
executivo.
Biodetergente
Reconhecido na premiação “Idea to Products”, organizado pela
Universidade do Texas, nos Estados Unidos, um projeto criado pelos
alunos Paulo Franco e Guilherme Fernando Dias Perez, do campus de Lorena
da Universidade de São Paulo (USP), concebeu um detergente “verde”. Com
características de aplicação semelhantes a outros produtos fabricados a
partir de derivados do petróleo, o biodetergente apresentou o
diferencial de ser menos agressivo ao meio ambiente graças a presença do
bagaço de cana em sua composição.
Segundo o professor orientador do trabalho, Silvio Silvério da Silva,
a utilização deste resíduo de origem renovável, abundante em nosso país
e de menor custo operacional em relação às fontes fósseis, faz com que o
produto tenha um grande potencial de preço reduzido em relação aos seus
concorrentes não biodegradáveis. “Além disso, sendo um produto natural
produzido a partir do bagaço de cana, há diversos estudos que apontam
vantagens como a biodegradabilidade e atoxicidade frente aos detergentes
sintéticos, não apresentando riscos ambientais e a saúde”, explica.
Outra vantagem, de acordo com Silva, é que ele também tem
características de um larvicída biológico, podendo ser usado para
combater o mosquito transmissor da Dengue, vírus Zika e febre
Chikungunya. “Testamos sua eficácia no combate de larvas de Aedes, em
testes in vitro, demonstrando seu potencial neste sentido”, conclui o
docente. Após quatro anos de desenvolvimento, a novidade já foi
patenteada e, por enquanto, segue disponível nos laboratórios da USP
para mais estudos.
Bandeja
Reduzir a quantidade de isopor descartado no meio ambiente, onde o
processo de decomposição do material pode durar até 300 anos.
Especialmente aquelas embalagens de carne, embutidos, frutas e verduras
encontradas nas prateleiras de padarias e supermercados. Motivada por
este objetivo, a aluna do ensino médio Sayuri Miyamoto Magnabosco criou
uma solução sustentável inovadora: bandejas a partir do bagaço da
cana-de-açúcar.
“Se mantida em estoque, com boas condições de preservação, a
embalagem se mantém boa para o uso por até dois anos. Quando vai para os
lixões e aterros sanitários, em menos de seis meses já está decomposta.
E se ficar em contato constante com a água, em quatro horas já está
dissolvida”, informa a jovem de 16 anos.
Apoiada
pelo programa Iniciação Científica do Colégio Bom Jesus, em Curitiba, a
estudante criou o produto a partir de um processo de fabricação
relativamente simples, em que utilizou biomassa de cana, temperos
naturais e uma cola caseira feita de água e farinha. A ideia lhe rendeu
medalhas na feira de ciências da Usina Itaipu, o terceiro lugar na
Olimpíadas dos Gênios, em Nova York, e o título “Jovens Inventores” do
programa Caldeirão do Huck.
De acordo com Sayuri, o maior desafio da sua invenção foi encontrar
um modo para dar uma função antimicrobiana à bandeja, garantindo mais
segurança alimentar para o consumidor. “Pesquisei nos produtos de
limpeza, vi o que era utilizado, e encontrei uma substância que não
teria nenhum efeito tóxico sobre o bagaço de cana”, explica, guardando
segredo sobre o componente usado. “Há sempre algo que você deve melhorar
e que pode ser ainda mais refinado”, complementa a menina.
Segundo o orientador da pesquisa de Sayuri e coordenador do projeto, o
professor Cornélio Schwambach, no programa de Iniciação Científica do
colégio Bom Jesus estão em cursos outros projetos visando a redução do
uso de adubos químicos em monoculturas como a canavieira. “A cana tem um
potencial fenomenal que pode ser mais investigado. Creio que o Brasil
tem potencial para fazer uma revolução agrícola que considere fatores
econômicos, sociais e ambientais”, explica.
“Sempre
pergunto aos meus alunos: O que te incomoda? Crie soluções simples para
problemas simples. Quantos problemas simples os produtores de cana
devem ter? Muitos. Isto é fazer ciência”, encerra Schwambach.
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