Sergio Moraes/ Reuters
Petrobras: "Planejamos restituir quase US$ 200 milhões (R$ 680 milhões) ao Brasil no caso Petrobras"
Jamil Chade, do Estadão Conteúdo
Londres - O ministro das Relações Exteriores da Suíça,
Didier Burkhalter, anuncia que seu país planeja devolver aos cofres
públicos brasileiros cerca de US$ 200 milhões em ativos bloqueados por
conta das investigações no marco da Operação Lava Jato.
Em um discurso em Londres durante a cúpula anti-corrupção organizada
pelo governo de David Cameron, Burkhalter insistiu que o gesto em
relação ao Brasil mostra que a Suíça está disposta a cooperar.
Publicidade
"Planejamos restituir quase US$ 200 milhões (R$ 680 milhões) ao Brasil
no caso Petrobras", disse em sua intervenção diante de chefes de estado
de todo o mundo.
Até agora, o Ministério Público da Suíça já aceitou a transferência de
cerca de US$ 120 milhões, em especial de casos relacionados com
ex-diretores da Petrobras que fecharam acordos de delação premiada e
aceitaram devolver os recursos bloqueados.
O governo suíço não explicou de onde seria o restante do volume de recursos repatriados.
No total, Berna indica que já congelou mais de mil contas bancárias
relativas à suspeitos no caso da Operação Lava Jato, num valor de cerca
de US$ 800 milhões.
Em seu discurso pela manhã, Burkhalter admitiu que repatriar os recursos da corrupção no mundo tem sido um trabalho lento.
"Apesar de todos os esforços, entre US$ 20 bilhões e US$ 40 bilhões
deixam os países em desenvolvimento todos os anos. Nas últimas décadas,
US$ 5 bilhões foram retornados aos países originais. Desses, quase US$ 2
bilhões foram enviados pela Suíça", defendeu.
"Os processos são muito longos, levam anos e produzem poucos
resultados", criticou. Para ele, governos precisam fechar acordos
políticos e parcerias para mudar essa realidade.
Para o ministro suíço, congelar dinheiro deve ser apenas uma medida de
"última instância" para lutar contra a corrupção. "Prevenir a corrupção
deve ser nossa prioridade", disse.
Segundo ele, governos precisam garantir regras de maior transparência
para evitar o uso de empresas de fachada para esconder recursos.
A permissão da existência de "beneficiários" em contas secretas, como no caso de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) precisa ser tratada.
"Infelizmente, estamos distantes de uma implementação", alertou.
"Precisamos ter leis que permitam coletar dados domésticos sobre
informações de beneficiários", defendeu o suíço. "Nossa Justiça precisa
ter acesso rápido a informações atualizadas de empresas, acionistas e
beneficiários no país para identificar os donos físicos", disse.
Considerada por anos como um dos centros da lavagem de dinheiro no
mundo, a Suíça adotou hoje um tom diferente ao falar do assunto.
"A corrupção é uma força destrutiva. Ela mina o melhor dos feitos
humanos. É um obstáculo para a igualdade e uma taxa sobre o
desenvolvimento econômico", disse o ministro.
Burkhalter, apesar de prometer que seu país vai lutar contra o problema,
também fez um alerta aos demais governos. Segundo ele, a melhor
prevenção é "boa governança, estado de direito e distribuição adequada
de poder".
Oposição
A declaração do governo suíço vem no momento em que advogados em Genebra
que defendem brasileiros em processos liderados pelo Ministério Público
em Berna protestam contra a cooperação da Suíça e pedem que a
transferência de dados para os procuradores da Operação Lava Jato seja
suspensa.
Uma carta enviada pelos advogados Patrick Hunziker e Valentine Bagnoud,
do escritório RVMH, ao procurador-geral da Suíça, Michael Lauber, alerta
que a Justiça brasileira não é "imparcial" e que, portanto, não
existiriam garantias de que os princípios adotados em Berna pelo sistema
legal sejam respeitados também no Brasil.
Os advogados dizem representar "clientes brasileiros", ainda que os nomes dos envolvidos não tenham sido revelados.
Segundo o jornal Le Temps, em um ofício ao MP em Berna, os advogados
alertaram ao procurador que "a organização judicial penal brasileira é
contrária às garantias essenciais de processos, em especial a garantia
da independência e imparcialidade".
Um dos ataques se refere ao poder de um só juiz no sistema brasileiro de
investigar e julgar os casos. "Trata-se de algo inaceitável", alertam.
O ataque se dirige diretamente ao juiz Sérgio Moro que teria ordenado a
"detenção preventiva" do cliente dos advogados suíços, confiscado seus
ativos e o condenado. Para os advogados, o mesmo ocorrerá com o outros
casos que o MP enviar ao Brasil.
Outro advogado que defende o interesse de brasileiros na Lava Jato na
Suíça, Saverino Lembo, confirma que o questionamento a Moro é o tom da
defesa de vários escritórios em Genebra.
"Que Moro faça seu trabalho e combata à corrupção é totalmente legítimo.
O que é menor é o quadro jurídico que ele atua", disse.
"O fato que um juiz tutti frutti tenha o poder de colocar as pessoas em
prisão, mandar a julgamento e decidir sua pena coloca um grande
problema", indicou.
O que tem assustado os advogados é o fato de que a transmissão de dados ao Brasil tem ocorrido em uma alta velocidade.
No caso de Eduardo Cunha, a decisão de transferir o caso ao Brasil foi
tomado no dia 28 de setembro de 2015 e, no dia 7 de outubro, o caso
estava indo ao MP brasileiro.
Segundo o advogado Hunziker, a decisão do procurador suíço de desmembrar
o caso em várias partes tem como objetivo justamente o de enviar os
dados de cada um dos suspeitos ao Brasil, evitando que haja um freio ao
caso nos tribunais.
A reação dos advogados ainda ocorre no momento em que o procurador-geral
da República, Rodrigo Janot, e Lauber fecharam um acordo para
intensificar a cooperação e criar uma força tarefa conjunta entre Brasil
e Suíça.
Nas últimas semanas, a defesa dos brasileiros na Suíça tem sido derrotada em todas as instâncias.
Cunha, apesar de apresentar dois recursos para evitar a transferência de
seus dados ao Brasil, teve o caso arquivado pelo Tribunal Superior da
Suíça, alegando que o envio dos dados eram legais.
A Odebrecht tentou o mesmo caminho. Mas também não conseguiu impedir o envio dos dados. O caso ainda está pendente.
Nem mesmo em outro processo, envolvendo o cartel do Metrô em São Paulo,
os suspeitos também não conseguiram evitar o envio dos dados ao Brasil
para que o caso seja investigado.
Há dez anos, o ex-prefeito Paulo Maluf também havia entrado com um
recurso para evitar a cooperação bilateral. Mas seus advogados também
fracassaram e a colaboração foi mantida.
Nenhum comentário:
Postar um comentário