segunda-feira, 4 de novembro de 2013

FORTALEZA COSMOPOLITA

Atraídos pelas belezas naturais, imigrantes se apaixonam, fixam residência e aproveitam os espaços da cidade.

Quando começou a estudar a cultura e literatura brasileira, em Berlim, a alemã Ute Hermanns sequer imaginou que um dia o Brasil seria a sua segunda morada. Apaixonada pelo mar, por costumes simples e querendo se livrar do inverno rigoroso do seu país de origem, encontrou na capital cearense um bom lugar para viver, trabalhar e ampliar seus horizontes.

“Quando apareceu a oportunidade de vir para o Brasil, pude escolher entre quatro outras cidades”, lembra. Depois de eleger Fortaleza como lar e se acostumar com as diferenças culturais que surgiram no cotidiano, Ute passou a aproveitar todos os espaços possíveis da Capital e, consequentemente, acabou se apaixonando por muitos deles.

Há três anos morando na cidade, ela cita seus lugares favoritos: Theatro José de Alencar, Mercado Central e, como não poderia ficar de fora da lista, a praia. Mas, dentre todos os locais que frequenta, é no Passeio Público onde fica mais à vontade, tanto é que foi o lugar escolhido por ela para fazer a foto que ilustra e reportagem. “Amo as árvores, o verde e a feijoada que servem aqui. É um espaço tão bonito! Fortaleza merece mais lugares assim”, diz. Entre seus programas preferidos, visitar livrarias, procurar artesanatos e experimentar novos pratos é o que mais gosta. “Amo tanto a comida do Ceará que comprei até uma cuscuzeira”, diverte-se.


Influências


A professora de alemão, entretanto, não é a única estrangeira que foi cativada pelas delícias da nossa culinária. Quem também foi atraído pela particularidade da gastronomia cearense foi o francês Patrick Gerinette, 62. Há 12 anos, depois de idas e vindas, resolveu ficar de vez na cidade.

Hoje, comanda o Chez Patrick, um restaurante francês localizado na Praia de Iracema, que é instalado dentro de sua própria casa. “O clima, o mar e a receptividade das pessoas foram as principais influências para minha mudança. Eu adoro passear pelo bairro e conversar com meus vizinhos”, compartilha. Dentre os outros atrativos que a cidade oferece, sem dificuldade, ele cita preferidos: o Mercado São Sebastião e o Mercado Central.

“Ali têm tanta variedade. Eu gosto de olhar e cheirar os alimentos. Logo que cheguei, me apaixonei pelos temperos, como o cheiro verde, que não temos na França, e também pela manga, tanto que comprei minha casa porque nela tem um enorme pé da fruta”, conta. E Fortaleza foi responsável não só por inspirar o chefe de cozinha a abrir um restaurante, mas também por lhe dar a oportunidade de formar uma família, pois foi aqui onde conheceu a secretária Regina Magalhães, com quem é casado há 11 anos.

Mas será que a professora Ute e o chefe de cozinha Gerinette amam Fortaleza e utilizam os espaços cidade só porque são estrangeiros e não vivenciaram, desde pequenos, o cotidiano da Capital? Os dois garantem que não. Ciente dos problemas da Capital, a professora Ute destaca as qualidades, mas também aponta críticas. Nas paradas de ônibus, ela sente medo, e sobre o trânsito, enfatiza: “Estou resistindo a comprar um carro, mas estou para desistir”. Outro problema que incomoda Ute é a poluição visual. “Fortaleza é uma cidade tão fotogênica. Se os muros fossem mais limpos, tudo ficaria mais bonito”.

O francês Gerinette também cita o que o incomoda: o trânsito. “Os pedestres devem ser mais respeitados”, opina.

Conhecimento

Na avaliação do historiador e turismólogo Gerson Linhares, o cearense precisa conhecer melhor sua história para, assim, amá-la mais, tanto quanto os estrangeiros amam. Quem costuma passar pelo Centro de Fortaleza, certamente já deve ter cruzado com Linhares. Há 18 anos, ele é responsável por realizar caminhadas com grupos de alunos e turistas que passam por pontos históricos da cidade.

“Temos mais de 30 museus na Capital que são poucos divulgados e visitados pelos cidadãos e turistas”, lamenta. Para ele, um povo que não conhece sua história, está fadado a perder suas raízes e sua memória. Por isso, acredita que um pouco mais de cuidado dedicado aos museus e praças ajudará não só os estrangeiros, mas também a população a se sentir incentivada a circular, viver, amar e zelar mais pelo o que é seu.

Ceará, paraíso tropical para imigrantes?

A crise econômica internacional contribuiu para que os cearenses retornassem e para que muitos estrangeiros passassem a ver na nossa terra uma chance de recomeçar uma nova vida. Alguns vieram por amor, casados com cônjuges cearenses, outros vieram em busca de estudo ou oportunidades de trabalho e de negócios.

Algumas vezes, brinco com um amigo português, dizendo que os portugueses estão redescobrindo o Ceará. Mas não são apenas eles que estão vindo de forma significativa, pois americanos, italianos e franceses também parecem acreditar que aqui poderão viver com qualidade seu sonho tropical. Afinal, não é qualquer um que pode dizer que mora, onde milhares sonham em passar as suas férias.

Precisamos reconhecer que essa realidade começou a mudar com o esforço para que houvesse um projeto consistente de industrialização do Ceará. Da construção civil à indústria automobilística, algumas cidades do Brasil e do mundo deve muito da sua hegemonia econômica às mãos alencarinas. O cearense já foi chamado de “judeu” brasileiro, dada a sua presença em todos os rincões do Brasil e mundo à fora.

Dentre as tentativas de alavancar a indústria do turismo e construir uma imagem positiva do estado do Ceará, destaca-se a produção da novela “Tropicaliente”, ambientada em Fortaleza e veiculada durante quase todo o ano de 1994, na gestão do governador Ciro Gomes, integrante do governo das mudanças.

Nas últimas duas décadas, assistimos um processo de fortalecimento da autoestima dos cearenses e fortalezenses em relação à nossa terra, diminuindo drasticamente o processo de emigração e o crescente aumento da imigração de pessoas de outros estados brasileiros e, principalmente, de outros países. (Rosendo Amorim – Sociólogo e professor da Unifor)

Oportunidades, estudo e clima são grandes atrativos

Entre os objetivos dos que deixam sua terra natal e fixam residência em Fortaleza, segundo a Delegacia de Imigração da Polícia Federal (PF), estão negócios, trabalho, investimento e estudo. Parte dessa procura pelo Ceará deve-se, principalmente, à crise europeia dos últimos anos, prova disso é a facilidade de encontrar estrangeiros em diversas partes do Estado, sobretudo no Litoral.

No Ceará, segundo a Delegacia de Imigração, chegam, sobretudo, europeus, latinos-america nos e africanos de baixa formação. A idade varia entre 25 e 40 anos, a maioria homens. O último senso realizado em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)apontou que, nos últimos 20 anos, a quantidade de estrangeiros no Estado cresceu 70%.

Há registro, ainda, de um considerado número de mão de obra em áreas como Medicina, Arquitetura, Informática e Engenharia. São profissionais que vêm para trabalhar em grandes empresas, universidades e hospitais. Pessoas que se deixam cativar não só pelas oportunidades, mas pelas qualidades e desafios que o Ceará tem a oferecer.

Lívia Lopes
(Diário do Nordeste – 04/11/2013)

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