Movimentação
reflete inserção de pequenas e médias cidades no mercado internacional.
Perfil inclui trabalhadores especializados e intensa mobilidade.
Os novos grupos de imigrantes que chegam ao Estado de São Paulo
começam a se fixar não só na capital, mas preenchem postos de trabalho
em vagas criadas pela internacionalização de pequenas e médias cidades
do interior. Além disso, eles tomam antigos postos ocupados pelos
migrantes internos provenientes do Nordeste, cada vez mais raros por
conta do desenvolvimento da região nos últimos anos.
A distribuição destes grupos no Estado compõe parte do Atlas Temático
do Observatório das Migrações em São Paulo, lançado em dezembro pelo
Núcleo de Estudos de População (Nepo) da Unicamp. A análise inclui quem
nasceu fora do Brasil e vive em São Paulo, sem contabilizar as novas
gerações nascidas no País.
O Atlas aborda uma série de movimentos migratórios nacionais e
internacionais, além do fenômeno da emigração, do mapeamento da
população indígena e dados de economia, politicas públicas, e população e
taxas de crescimento no Estado. Na análise sobre os fluxos
internacionais, o estudo se divide em duas linhas, uma é a comparação
histórica da distribuição de grupos que chegaram na virada do século 18
para o 19 e outra que mostra a ocupação em 2010 pelos grupos mais
recentes, que começaram a chegar em meados do século 20 e ganharam novos
contornos nas últimas décadas.
Bolivianos, paraguaios, chineses e coreanos estão entre os grupos
mais numerosos do novo perfil de imigrante. Há representantes destas
nacionalidades no Estado desde as décadas de 1940 e 1950, mas atualmente
possuem um novo perfil. Hoje são trabalhadores especializados que não
necessariamente criam raízes no País, optando por seguir o fluxo da
demanda de um determinado setor.
“Eles estão ora em Americana, ora em São Paulo, ora na Argentina, ora
na região metropolitana, ora de novo na Bolívia. Depende de onde o
capital internacional está alocando recurso”, conta a coordenadora do
estudo, Rosana Baeninger. “Essa mobilidade tem a ver com a dinâmica de
nichos econômicos e com o mercado internacional.”
Para além das tradicionais confecções do Brás, podemos encontrar
parte dos 22,6 mil imigrantes bolivianos de São Paulo trabalhando no
setor têxtil de Americana e no pólo de produção de jeans de Indaiatuba.
Os cerca de 4,2 mil paraguaios que vivem no Estado seguem caminho
parecido.
“A rede para a construção do nicho econômico é uma rede de capital
internacional. O empresário deixa de usar insumo de Americana, por
exemplo, para importar da China. A isso soma-se a mão-de-obra que, para
ajudar a a manter a lucratividade, precisa não demandar direitos
trabalhistas.” diz Baeninger.
O custo é baixo, mas os empregados são qualificados para as funções
no setor em que atuam e com experiência de trabalho. “Eles têm uma rede
que vai movimentando também esse grupo, ligado a um nicho econômico.
Tudo tem uma lógica com a qual vamos conviver nesses espaços, com uma
rotatividades enorme de imigrantes. Alguns ficam, formam família aqui e a
rede migratória vai se ampliando.”
O alto custo de vida em São Paulo é um dos fatores que impulsiona a
interiorização. “A chegada pode ser na metrópole, mas com as redes que
vão se tecendo e as mudanças na economia, eles podem ir pro interior e
seguir na mesma atividade.”
Os coreanos, por exemplo, foram atraídos pelo negócio de joias e
semijoias e se fixaram principalmente na região de Limeira, pólo de
distribuição para a capital. Os chineses, que são cerca de 9,3 mil em
todo o Estado, se dedicam ao comércio de baixo custo (como as lojas
populares que vendem tudo a R$ 1,99) nas cidades de Campinas, Jundiaí e
Ribeirão Preto.
O perfil abrange não só pequenos comerciantes, mas também
estrangeiros altamente qualificados, como os executivos de grandes
empresas que se concentram em São Paulo, Campinas e São José dos Campos.
“O século 21 nos anuncia tanto na metrópole, como no interior, fluxos
que mesclam alta e baixa qualificação e que não necessariamente ficam
por aqui”, detalha Baeninger.
Antigos imigrantes
O movimento dos novos grupos de imigrantes é contrário ao das levas
de estrangeiros que chegaram a São Paulo no início do século,
incentivadas por meio de acordos entre governos a ocupar o território do
Estado e substituir a mão-de-obra escrava durante a expansão cafeeira.
Entre as levas mais numerosas, estavam as de italianos, portugueses,
japoneses e espanhóis. O Atlas compara a distribuição geográfica destes
grupos no final do primeiro período migratório, em 1920, com os dados do
Censo de 2010. Os italianos formaram o grupo mais expressivo, com
398.797 imigrantes. Hoje são 15.388.
Ao contrário dos grupos de latinos, que a partir da capital, seguiram
para o interior, a imigração mais antiga, que ocupava todo o interior,
passou a se concentrar nas proximidades da região metropolitana e
próximos às plantas de empresas internacionais das regiões de Piracicaba
ou Sorocaba, por exemplo.
Os grupos de novos imigrantes também receberam incentivos, mas já em
meados do século 20. Grupos de chineses chegaram ao país nos anos 1940,
para trabalhar em colônias agrícolas do oeste do Estado. A empreitada
não deu certo e os imigrantes passaram a investir nas hoje tradicionais
pastelarias. Nos anos 1950, um acordo entre Brasil e Bolívia favoreceu a
vinda de estudantes de medicina. A partir destas primeiras
movimentações, formou-se a rede migratória que favorece a mobilidade dos
grupos atuais.
Como é baseado nos dados do Censo de 2010, o mapa não registra, por
exemplo, a recente movimentação de haitianos a partir de 2012. Com o
desenvolvimento do Nordeste e a redução do fluxo migratório da região em
direção a São Paulo, a alternativa das grandes empreitaras foi buscar
os haitianos no Acre para trabalhar na construção civil de Campinas,
Jundiaí e Limeira. Eles também são encontrados na indústria de calçados
de Franca. A estimativa é que cerca de cem imigrantes do Haiti tenham se
deslocado para cada uma destas cidades.
(Último Segundo – 21/02/2014)
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