terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Orgulho caipira


Bolinho típico das festas juninas do Vale do Paraíba, em São Paulo, é saboreado o ano inteiro na cidade de Jacareí

Por Janice Kiss
receitas_bolinho_caipira (Foto: Fernanda Bernardino/Ed. Globo)

É secular a tradição do bolinho caipira no Vale do Paraíba, região que abrange cidades paulistas e fluminenses. Na maioria delas, esse é o principal quitute oferecido nas festas juninas, deixando para trás o bolo de fubá, o pé de moleque, a canjica e a batata-doce. Mas, em Jacareí, a 70 quilômetros de São Paulo, o salgado recheado e frito, feito com farinha de milho, é uma verdadeira instituição - e pode ser encontrado o ano inteiro no mercado municipal. A consideração do povo de Jacareí pelo bolinho é tal que, neste mês, ele será reconhecido oficialmente como patrimônio cultural da cidade.

Os primeiros registros da comercialização do petisco datam de 1925, quando era preparado por Nicota Gehrke, dona de uma banca no mercado e que vendia o produto também nas festas religiosas da cidade. Há quase 50 anos, essa tradição vem sendo mantida por José Maria de Souza, o Zequinha do Mercadão. Num box montado 80 anos atrás por sua família, ele serve salgadinhos variados - mas o campeão de vendas é mesmo o bolinho caipira. "Por baixo, saem umas 120 unidades por dia, pelo preço de 40 centavos cada. Mas, quando faz frio, a quantidade duplica", garante Zequinha. Ao longo do tempo, a receita original de seu salgado mais famoso sofreu uma adaptação, passando a usar um tempero pronto com glutamato monossódico. "Os mais tradicionais condenam, mas o paladar das pessoas muda, e a gente tem de agradar o freguês", defende-se.

Diferentes versões do bolinho também são motivo de discórdia no Vale do Paraíba. Em Jacareí, ele é comprido, feito com farinha de milho branca e recheio de linguiça de porco. Na vizinha São José dos Campos, o costume é prepará-lo com farinha amarela e carne moída e moldá-lo no formato arredondado. As duas cidades asseguram ter a receita mais genuína. Porém, o jornalista João Rural, nascido João Evangelista de Faria, um estudioso da gastronomia do vale, acha difícil provar quem tem razão. "Como nada foi documentado, ficam as histórias contadas pelos antigos", comenta João, que prepara um livro sobre a culinária local.

Baseado nesses relatos, o jornalista concluiu que o preparo apareceu na época da escravatura, sendo consumido após o trabalho braçal nas fazendas da região. Já o historiador Alberto Capucci, diretor do Patrimônio Cultural de Jacareí, acredita que a primeira versão do bolinho - feita de beiju e recheada com peixes como lambari e pequira - apareceu com os índios puris, que viviam nas margens do Rio Paraíba do Sul.

receitas_bolinho_caipira_barraca (Foto: Fernanda Bernardino/Ed. Globo)

Uma terceira teoria é apresentada por Eduardo e Jussara Gehrke, netos de dona Nicota, a pioneira do mercado municipal. Eles sustentam que o bolinho teria surgido entre os séculos XVII e XVIII por obra dos tropeiros que atravessavam a região em direção a Minas Gerais à procura de ouro. Entre as tralhas carregadas no lombo das mulas, figurava a farinha de milho. O recheio do bolinho variaria conforme as paradas: feito de peixe, se apeavam próximo aos rios, ou de porco, quando encontravam criações pelos caminhos.

Essas duas preparações ao "estilo tropeiro" - com massa envolvendo peixe e linguiça suína - poderão ser apreciadas num evento especial em Jacareí neste mês. Entre os dias 11 e 13, o bolinho caipira ganha uma festa só sua na cidade, para marcar seu reconhecimento como patrimônio cultural.

receitas_bolinho_caipira (Foto: Fernanda Bernardino/Ed. Globo)
 
BOLINHO CAIPIRA
100 unidades | Tempo de preparo: Cerca de uma hora | Dificuldade: baixa
 
INGREDIENTES
 
Massa
>>> 1 kg de farinha de milho branca
>>> 1 copo (tipo americano) de óleo
>>> 4 dentes de alho
>>> 1 maço de cheiro-verde
>>> 2 sachês (10 gramas) de tempero pronto com glutamato monossódico
>>> 3 litros de água
>>> sal a gosto
 
Recheio
 
>>> 300 g de linguiça de porco (ou a mesma quantidade de carne moída)
>>> 1 cebola ralada
>>> 1 sachê (5 gramas) de tempero pronto com glutamato monossódico
>>> cheiro-verde a gosto

COMO FAZER
 
Refogue em óleo quente o alho e o cheiro-verde juntamente com o tempero pronto. Coloque um litro de água e espere ferver. Em separado, esfarele os flocos da farinha em uma bacia e adicione a água com os temperos. Mexa com força, usando uma colher de pau. Acrescente aos poucos dois litros de água fria, até a massa se desprender das mãos e ficar no ponto de enrolar. Faça um furo no bolinho, recheie com a carne crua e temperada de sua preferência e molde-o num formato alongado. Frite em óleo bem quente. Nas festas juninas, o quitute é acompanhado de um copo de quentão. Na banca do Zequinha do Mercadão, o costume é comê-lo com café fresquinho.
 

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