Responsáveis pela coordenação jurídica das campanhas da senadora Gleisi
Hoffmann (PT-PR) em 2008, 2010 e 2014, escritórios do advogado Guilherme
Gonçalves receberam R$ 7,2 milhões de empresas suspeitas de
participarem do esquema de corrupção e pagamento de propina ligado à
atuação da empresa de tecnologia Consist no Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão.
Segundo a investigação, os pagamentos suspeitos começaram após a
assinatura de acordo de cooperação técnica entre o Ministério do
Planejamento em 2010 - à época ocupado por Paulo Bernardo (PT-PR),
marido de Gleisi -, a Consist e a Associação Brasileira de Bancos e o
Sindicato das Entidades Abertas de Previdência Privada.
Pelo acordo, a Consist passou a gerir o sistema de empréstimos
consignados no Ministério do Planejamento a partir dos dados de 2
milhões de servidores federais. A empresa era remunerada pelos bancos
com uma parte da amortização mensal de cada empréstimo de funcionário
público.
A tese do Ministério Público é que os cerca de R$ 53 milhões pagos pela
Consist às empresas indicadas pelos operadores - o ex-vereador de
Americana (SP) Alexandre Romano (PT), preso hoje, e Milton Pascowitch -
seriam, na realidade, propina pela prestação de serviços nos empréstimos
consignados junto ao Ministério do Planejamento.
De acordo com investigadores da Operação Lava Jato, os pagamentos aos
escritórios de advocacia foram feitos a pedido do ex-vereador de
Americana (SP) Alexandre Romano (PT), preso hoje sob suspeita de ser um
dos operadores do esquema que envolvia um sistema para a concessão de
empréstimos consignados.
Segundo a investigação, o escritório de advocacia Guilherme Gonçalves
& Sacha Reck Advogados recebeu R$ 4,65 milhão entre setembro de 2010
e janeiro de 2013 diretamente da Consist Software e R$ 423 mil entre
janeiro e abril de 2012. Uma outra empresa do grupo Consist, a SWR
Informática, realizou repasses que somaram R$ 1,2 milhão entre fevereiro
de 2013 e janeiro do ano passado.
Com o desmembramento da sociedade de advogados, o especialista em
direito eleitoral que assessorou as campanhas de Gleisi passou a atuar
no escritório Gonçalves, Razuk, Lemos & Gabardo Advogados recebeu R$
957 mil entre maio de 2014 a março de 2015 da Consist Business Software
a título de honorários advocatícios.
De acordo com os investigadores, a Consist pagou propina ao PT para ser
beneficiada como operadora dos sistemas de empréstimo consignado,
através de dois operadores indicados por João Vaccari Neto - Milton
Pascowitch, que se tornou delator, e Alexandre Romano.
Uma das novidades da fase Pixuleco 2 da Operação Lava Jato foi a
suspeita de que escritórios de advocacia poderiam estar sendo usados
para escoar a propina.
Também foram alvos de busca os escritórios Oliveira Romano Sociedade de
Advogados, do próprio Alexandre Romano, e o Portanova Advogados
Associados, que recebeu R$ 270 mil entre janeiro e maio deste ano da
Consist Business.
OUTRO LADO
Por meio de assessoria, a senadora Gleisi Hoffmann disse que não existe
nenhuma relação entre pagamentos da Consist ao advogado Guilherme
Gonçalves e as suas campanhas eleitorais. Segundo a congressista, o
advogado tem trabalhado em suas campanhas desde 2008 - muito antes da
assinatura do acordo técnico entre a Consist e o Ministério do
Planejamento.
Conforme a assessoria, Gonçalves, que já militou no PT, prestou
assessoria jurídica às campanhas de Gleisi para prefeita de Curitiba
(2008), ao Senado (2010) e ao governo do Paraná (2014). O advogado,
frisou a assessoria, também trabalhou para outros candidatos e partidos.
OUTRO LADO
O advogado Guilherme Gonçalves confirma que prestou serviços à Consist.
"Eu tenho contrato, impetrei ação em Goiás, fiz parecer jurídico, fiz
consultoria", disse à Folha. Segundo ele, o escritório deu
assessoria jurídica à empresa, na área de Direito Administrativo, para o
contrato das operações de crédito consignado.
Gonçalves afirma ter trocado e-mails e participado de reuniões com o
diretor jurídico da Consist, Valter Pereira, e disse que recebia valores
periodicamente em troca do serviço. Quem o indicou para o trabalho foi
Alexandre Romano. No entanto, Gonçalves nega qualquer irregularidade."O
que eu recebi está absolutamente nos termos do contrato, por serviços
prestados", afirmou. "Cumpri meu papel de advogado."
O escritório informa ter fornecido à Polícia Federal os comprovantes de
sua atuação, e disse estar em total cooperação com os investigadores. Em
nota também destacou que não há ligações entre o antigo sócio de
Gonçalves, o advogado Sasha Reck, e a Consist.
Reck, cujo escritório também foi alvo da operação, afirmou que
compareceu espontaneamente à Polícia Federal para prestar
esclarecimentos e forneceu documentos provando que nunca atendeu a
Consist nem recebeu honorários da empresa.
"O escritório, na sua antiga composição, já mantinha clara divisão entre
seus sócios, devido à notória especialização em áreas diferentes do
direito, os quais possuíam carteiras próprias de clientes, sem
comunicação, inclusive financeira, entre ambos", escreveu o advogado, em
petição encaminhada à Justiça no final da manhã.
Alvo de um mandado de busca e apreensão em Porto Alegre, o Portanova
Advogados Associados, afirma que seu escritório tinha a Consist como
cliente, prestando serviços como de consultoria previdenciária e
propositura de ação para reaver parte do FGTS depositado pela empresa
(tese jurídica que questiona parte do fundo de garantia depositado pelas
empresas e que vão para o governo, e não para o trabalhador), entre
outras.
O advogado Daisson Portanova, do Portanova Advogados Associados, nega
que tenha emitido notas frias em favor da empresa. "Temos contrato,
notas fiscais e balancete que comprovam o serviço prestado, inclusive
e-mails cobrando atrasos no pagamento", disse ele.
O PT de Americana informou que Romano deixou os quadros do partido em
2005 e que, no tempo em que ele esteve no partido, "nenhum tipo de
denúncia houve".
"Portanto, as atividades particulares que estão sob investigação,
período entre 2010 e 2015, não guardam qualquer relação com sua
militância partidária no PT", informou a sigla.
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