A nova fase
da Operação Lava Jato, deflagrada nesta quinta-feira (13), abre uma
frente a ser explorada na investigação: contratos com escritórios de
advocacia, que seriam usados para o pagamento de propina, segundo a
Polícia Federal.
"Podemos estar diante de um novo modelo: depois das consultorias, das
empresas de fachada e das agências de publicidade, surgem os escritórios
de advocacia", disse o delegado federal Igor Romário de Paula, que
coordena as investigações.
Quatro escritórios foram alvo de busca e apreensão nesta quinta: dois em
Curitiba, um em São Paulo e outro em Porto Alegre. Segundo as
investigações, eles receberam parte do dinheiro repassado pelo esquema.
Os valores vinham da empresa Consist, que já foi alvo da fase anterior
da Lava Jato. Ela fazia a gestão de empréstimos consignados concedidos a
servidores federais, que foram acordados com a Associação Brasileira de
Bancos pelo Ministério do Planejamento.
Segundo as investigações, a Consist repassava 40% de seu faturamento a
empresas indicadas pelos operadores Milton Pascowitch e Alexandre Romano
–ex-vereador em Americana (SP) pelo PT–, que foi preso temporariamente
nesta quinta acusado de ser um operador do esquema. Os dois são ligados
ao ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, também preso na Lava Jato.
As notas fiscais dos pagamentos feitos aos escritórios pela Consist eram
"ideologicamente falsas", disseram os investigadores. Os contratos
falam em "honorários advocatícios", mas os sócios da Consist admitiram,
segundo os policiais, que nunca houve prestação de serviços à empresa.
Foram R$ 21 milhões movimentados em pagamentos aos escritórios, entre 2010 e 2015. Um dos contratos soma R$ 7,2 milhões.
Em pesquisa em fontes abertas, os investigadores não encontraram ações
de empresas do Grupo Consist que foram defendidas pelos advogados
beneficiados pelos repasses.
GLEISI HOFFMANN
Em Curitiba, os escritórios investigados prestavam serviços para o PT e
candidatos do partido; pertencem aos advogados Guilherme Gonçalves e
Sacha Reck, que eram sócios até o ano passado.
Gonçalves é advogado do Diretório Estadual do PT no Paraná e atuou nas
campanhas da senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) em 2008, 2010 e 2014.
Também coordenou a campanha de Ratinho Júnior (PSC-PR) à Prefeitura de
Curitiba, em 2012.
Seu escritório, segundo as investigações, recebeu R$ 7,2 milhões da Consist entre 2010 e 2015.
O escritório de Gonçalves, segundo a Folha apurou, enviou
documentos à PF para comprovar que houver prestação de serviços não só
em relação ao caso em questão, mas em outros, inclusive com interposição
de ações.
Em São Paulo, o escritório Oliveira Romano Sociedade de Advogados, que pertence a Romano, também foi alvo de busca e apreensão.
Em Porto Alegre, houve busca e apreensão no Portanova Advogados
Associados, que recebeu R$ 270 mil entre janeiro e maio deste ano da
Consist Business.
"Eles podem ter recebido por serviços prestados a terceiros. É algo que
ainda será alvo de investigação", disse o delegado Márcio Anselmo.
Na decisão que autorizou as buscas e apreensões, o juiz federal Sergio
Moro pondera que "não está claro se os dirigentes desses escritórios
participaram conscientemente da fraude ou de crimes supostamente
perpetrados pela Consist e por Alexandre Romano".
OUTRO LADO
O advogado Guilherme Gonçalves confirma que prestou serviços à Consist.
"Eu tenho contrato, impetrei ação em Goiás, fiz parecer jurídico, fiz
consultoria", disse à Folha. Segundo ele, o escritório deu
assessoria jurídica à empresa, na área de Direito Administrativo, para o
contrato das operações de crédito consignado.
Gonçalves afirma ter trocado e-mails e participado de reuniões com o
diretor jurídico da Consist, Valter Pereira, e disse que recebia valores
periodicamente em troca do serviço. Quem o indicou para o trabalho foi
Alexandre Romano. No entanto, Gonçalves nega qualquer irregularidade."O
que eu recebi está absolutamente nos termos do contrato, por serviços
prestados", afirmou. "Cumpri meu papel de advogado."
O escritório informa ter fornecido à Polícia Federal os comprovantes de
sua atuação, e disse estar em total cooperação com os investigadores. Em
nota também destacou que não há ligações entre o antigo sócio de
Gonçalves, o advogado Sasha Reck, e a Consist.
Reck, cujo escritório também foi alvo da operação, afirmou que
compareceu espontaneamente à Polícia Federal para prestar
esclarecimentos e forneceu documentos provando que nunca atendeu a
Consist nem recebeu honorários da empresa.
"O escritório, na sua antiga composição, já mantinha clara divisão entre
seus sócios, devido à notória especialização em áreas diferentes do
direito, os quais possuíam carteiras próprias de clientes, sem
comunicação, inclusive financeira, entre ambos", escreveu o advogado, em
petição encaminhada à Justiça no final da manhã.
Alvo de um mandado de busca e apreensão em Porto Alegre, o Portanova
Advogados Associados, afirma que seu escritório tinha a Consist como
cliente, prestando serviços como de consultoria previdenciária e
propositura de ação para reaver parte do FGTS depositado pela empresa
(tese jurídica que questiona parte do fundo de garantia depositado pelas
empresas e que vão para o governo, e não para o trabalhador), entre
outras.
O advogado Daisson Portanova, do Portanova Advogados Associados, nega
que tenha emitido notas frias em favor da empresa. "Temos contrato,
notas fiscais e balancete que comprovam o serviço prestado, inclusive
e-mails cobrando atrasos no pagamento", disse ele.
O PT de Americana informou que Romano deixou os quadros do partido em
2005 e que, no tempo em que ele esteve no partido, "nenhum tipo de
denúncia houve".
"Portanto, as atividades particulares que estão sob investigação,
período entre 2010 e 2015, não guardam qualquer relação com sua
militância partidária no PT", informou a sigla.
Colaboraram GRACILIANO ROCHA e BELA MEGALE, de São Paulo
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