terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Decisões políticas tomadas do passado chegaram ao Supremo Tribunal Federal, que volta a julgar a perda dos planos econômicos na semana que vem


Divulgação/STF
 
Pleno do STF em 2013: Tribunal, que volta a julgar os planos econômicos na próxima semana, também terá de avaliar perdas do FGTS

O Supremo Tribunal Federal (STF) está incumbido de dar vida  ou  enterrar  definitivamente  três esqueletos que,  nos  cálculos  mais  alarmistas,  podem  tomar  a  forma     de R$ 422 bilhões: a correção do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS)  pela  inflação,  as  perdas  da  poupança  causadas  pelos     planos econômicos  e  a  desaposentação   –   possibilidade de renunciar a uma aposentadoria para tentar uma mais vantajosa.

Todos  decorrem  de  decisões  políticas  tomadas  no  passado,  geraram  cerca  de  422  mil processos,  e chegaram à mais alta Corte do Brasil nos anos 2000 – a última, na semana passada.

“Até  o  passado no Brasil é incerto, e isso não é algo muito positivo [para a economia do País]”, afirma o pesquisador  do  Instituto  Brasileiro  de Economia da Fundação Getulio Vargas (IBRE/FGV), Fernando de Holanda Barbosa Filho, sobre as perdas da poupança, cujo julgamento será retomando na semana que vem.
José Cruz/ABr
Collor: combate à inflação está na raiz dos questionamentos da poupança e do FGTS
Planos: ideia boa, execução nem tanto

No caso, os poupadores alegam  ter sido prejudicados pelos planos Verão, Bresser e Collor 1 e 2, editados pelo governo para coibir  a superinflação.   A ideia até era certa. O problema foi a forma como foi efetivada, avalia  Rodrigo  De  Losso  da  Silveira  Bueno,  professor  associado  do  Departamento  de  Economia da Universidade de São Paulo (USP).

“Com os planos, o que a gente resolveu fazer: vamos corrigir por 50% da inflação do período e não 100%. Do ponto de vista econômico, isso é justo. Mas por uma falha de comunicação ,  não é  visto como justo”, afirma o economista.

Caso o STF decida a favor dos poupadores, o Banco Central (BC) estima que a conta ficará em R$ 150 bilhões e deverá ser arcada pelos bancos. Esses, porém, muito provavelmente, as instituições financeiras buscariam ser indenizadas pelo governo, com o argumento de que apenas cumpriram a legislação.

“O governo  diz  que  [a adoção dos planos] foi  para  garantir  a  estabilidade, evidentemente prejudicando parte  da  correção  monetária.         Os que tiveram prejuízo decorrente dessa manipulação entendem que o governo  é  sempre  responsável.   Pela Constituição, o governo é sempre responsável”, afirma o jurista Ives Gandra Martins, sobre os poupadores.


Para especialistas, passado do FGTS deveria ser esquecido


A  mudança  do  FGTS  também  está  relacionada  às  políticas  para controlar a alta de preços.      A Taxa Referencial (TR),   criada  em 1991  para  substituir a inflação como critério atualização monetária, passou a ser  usada  para  fazer  a  correção  dos saldos do fundo.    Desde 1999, entretanto, a taxa tem ficado muito abaixo da inflação, o que leva à corrosão do poder de compra do dinheiro do trabalhador.

Depois que o  STF  decidiu,  em  março  do  ano passado, que a TR não serve como índice de correção de precatórios (dívidas judiciais do governo com a população), milhares de trabalhadores foram à Justiça para pedir a aplicação do mesmo entendimento ao FGTS.    té janeiro deste ano, a Caixa Econômica Federal já era alvo de 39 mil ações.

Na   semana   passada,  o  partido  Solidariedade,           de  oposição,  apresentou  uma  Ação  Direta  de Inconstitucionalidade (ADI)  contra  a  TR e  a favor de um índice inflacionário.     Nos cálculos do Instituto FGTS Fácil, a troca resultaria num esqueleto de R$ 203,4 bilhões para o governo, e num reajuste de cerca de 102,3% para saldos que estavam em vigor em janeiro de 1999.

Os  economistas  Bueno  e  Barbosa  Filho  entendem  que  a  fórmula  deve,  de  fato,  ser     corrigida, mas questionam o pagamento retroativo.

“[O rendimento com a fórmula atual]  é  de  fato  um  rendimento  negativo  para  o  trabalhador”,   afirma Barbosa  Filho,  do  Ibre/FGV. “[Mas] talvez  fosse  mais racional discutir para a frente:  fazer  o  cálculo  de forma retroativa, como as coisas tendem a ser feitas, podem gerar problemas muito graves.”


Desaposentação é a ameaça mais real para o governo, vê economista


A  desaposentação  também  surge  de  um problema na legislação, avalia Bueno, da USP.         Em 1999, o governo  criou  o  fator  previdenciário, um pedágio que reduz o benefício de acordo com a idade e o tempo de contribuição do trabalhador.

O objetivo da medida era  desestimular  aposentadorias  precoces,   mas os trabalhadores continuaram a se aposentar cedo. Como continuavam a trabalhar e a contribuir para a Previdência, foram à Justiça para pedir um recálculo do benefício com base nas novas condições.

O  caso  gerou  24 mil  ações, das quais duas chegaram ao STF, onde o ministro Marco Aurélio de Mello já deu voto favorável.    Nos cálculos oficiais, se o Tribunal der o sinal verde para a medida, a Previdênica terá um  impacto  de  R$ 69 bilhões no longo prazo.              Assim como o caso do FGTS, não há prazo para o julgamento

Para Bueno,  é justamente nesse caso que reside a maior ameaça para o governo.

“O FGTS vai virar precatório. Você vai receber daqui a três gerações se isso acontecer de verdade, então não preocupa tanto. No caso da desaposentação é imediato", afirma. "No caso da poupança dos bancos se eles perderem eles vão negociar os pagamentos [aos poupadores] num prazo meio longo e aí vão entrar contra o governo em seguida. E aí vai ser uma batalha jurídica que vai durar vários anos."

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