Por Marcelo Alves Muniz
Após sete anos de existência e de três anos de aplicabilidade fática, a
Lei de Recuperações Judiciais e Falências desperta calorosos debates,
provocados e defendidos sob o enfoque do devedor.
Tendo como principio basilar a chamada função social da empresa,
expressão abstrata e que deve ser interpretada como a defesa de postos
de trabalho, geração de riquezas e contribuição para incremento da
atividade nacional, ainda que justo, não se deve ignorar o interesse dos
credores, os quais, em sua maioria, também são empresas e necessitam de
amparo para continuidade e viabilidade de sua própria atividade.
Por meio de uma visão imediatista, criou-se a cultura do oprimido no
ambiente recuperacional, na qual as empresas em recuperação são tratadas
como vítimas e seus credores tratados como opressores. Tal visão foi
criada por vários fatores que transitam entre o preconceito da falência
como oportunidade, da cultura profissional de salvar a todo custo a
empresa em dificuldade e da visão de nossos parlamentares que visam a
implementação de mudanças na Lei nº 11.101, de 2005, para proteção única
das recuperandas, como se hipossuficientes fossem. Entendemos que tais
fatos aliados a deficiências colaboram para o enfraquecimento da
legislação recuperacional e poderá conduzir o diploma à pecha que
maculava a antiga concordata.
Grande parte das empresas que entram em recuperação judicial está falida
São situações que entendemos devam ser debatidas para melhoria do
ambiente, como a extensão do período de fiscalização. É sabido que a
determinação de término do processo pós-aprovação do plano e concessão
da recuperação judicial em dois anos se mostra na atual conjuntura como
raso e responsável pelas famigeradas carências, que por vezes buscam,
apenas, evitar a convolação da recuperação judicial em falência, ou
seja, uma vez não cumprido o plano e ocorrido o término do processo, o
credor se vê obrigado a ingressar com um novo processo de cobrança para
fazer valer o plano aprovado, o que evidentemente gera insegurança e
deve ser repelido.
Faz-se necessário também um maior aculturamento para utilização da
recuperação judicial. É verificado que grande parcela das empresas que
lançam mão do processo de recuperação judicial encontra-se falida,
impondo aos credores a responsabilidade pelo insucesso, bem como para o
seu soerguimento. Nesta situação, evidenciasse a imposição de descontos
estratosféricos, remissão de dívidas, bem como a concessão obrigatória
de insumos. Entendemos que a responsabilidade para tanto é o fardo que a
sociedade impõe ao falido. Devemos enxergar soluções de mercado, em que
as empresas sem condições de sobrevivência devam ser afastadas dando
lugar a outras mais prósperas, fato que provocará uma otimização na
realização do ativo, uma maior possibilidade de satisfação dos credores e
de diminuição da possibilidade de crimes falimentares.
Em contrapartida, as empresas viáveis e que estejam em dificuldades
devem deter um planejamento de sobrevivência no período recuperacional,
pois é sabido que, uma vez em recuperação, as chances para realização de
novos negócios se mostram reduzidas. Tal situação deve ser também
inspirada na realidade americana, a exemplo da American Airlines, que
programou sua recuperação judicial tendo em caixa o suficiente para as
despesas nos 12 meses posteriores ao pedido e que culminou para a
criação da maior companhia aérea do mundo, isto considerando a fusão com
a US Airways.
Entendemos ainda que os prazos para participação do credor no processo
são parcos e somados à forma de comunicação dos atos levam ao credor a
uma situação de incerteza, o que provoca distorções gravíssimas entre o
valor declarado e o devido. Hipoteticamente, o credor que não observa a
relação de credores, e não apresenta tempestivamente sua divergência,
amarga uma diminuição sensível de seu crédito, visto que a maioria
esmagadora dos planos prevê deságios que oscilam entre 40% a 85% sobre o
crédito.
Assim, a publicidade dos atos deve ser realizada pelo Poder
Judiciário e não pelos devedores, prosseguindo o entendimento que uma
vez que o crédito embora existente seja omitido pelo devedor este não se
submete à recuperação judicial, permanecendo válidas as formas
originárias de contratação e direitos de cobrança.
Preocupa a forma com a qual se instituem as assembleias gerais, as
quais devem contar com maior publicidade, com a exteriorização das
causas subjacentes e de originação dos créditos, bem como com uma
atuação imparcial dos administradores judiciais, evitando assim a
possibilidade de fraude na listagem de credores e com isso a imposição
de planos esdrúxulos. Tais pontos são preocupantes. Seguramente não são
os únicos pontos de melhoria, vez que estamos tratando de um diploma
inovador e que ainda se encontra em período de maturação. Boas
iniciativas, como as decisões proferidas pelas Câmaras Reservadas de
Direito Empresarial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, devem
ser exaltadas, visto que colaboram com a criação de um ambiente
saudável e profícuo entre detentores de posições tão antagônicas como o
são os credores e devedores.
Marcelo Alves Muniz é advogado em São Paulo e especialista em direito empresarial pela PUC-SP
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor
Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser
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natureza em decorrência do uso dessas informações
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Fonte: Valor Econômico |
Atuação: Consultoria multidisciplinar, onde desenvolvemos trabalhos nas seguintes áreas: fusão e aquisição e internacionalização de empresas, tributária, linhas de crédito nacionais e internacionais, inclusive para as áreas culturais e políticas públicas.
domingo, 24 de fevereiro de 2013
Uma nova perspectiva sobre a Lei de Falências
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