No
início de outubro, Michael Irvin se levantava para deixar um
restaurante em Nova York quando olhou para o seu iPhone e notou que ele
estava desligando. Quando conseguiu ligá-lo novamente, todas as suas
informações - programas de e-mail, contatos, fotos de família,
aplicativos e músicas que havia baixado - tinham desaparecido.
"Parecia que ele tinha vindo direto da fábrica", afirma Irvin, consultor independente de planos de saúde. Não era um defeito do aparelho. As informações haviam sido apagadas pela AlphaCare, de Nova York, um cliente para quem ele estava trabalhando em tempo integral desde outubro. Irvin recebeu um e-mail da AlphaCare confirmando que os dados do aparelho haviam sido remotamente deletados. À medida que mais companhias permitem e encorajam funcionários a usarem seus próprios telefones e tablets para atividades profissionais - tendência chamada "bring your own device", ou Byod (traga seu próprio dispositivo, em português) -, trabalhadores têm se deparado com algumas consequências inesperadas. Eles têm visto os dados dos seus aparelhos serem apagados remotamente e até mesmo sem nenhum aviso prévio. Em alguns casos, isso tem ocorrido depois que saem da empresa. Em outros, enquanto ainda estão trabalhando nela. O objetivo das empresas é proteger suas informações. Segundo uma pesquisa da empresa de proteção de dados Acronis, 21% das companhias promovem essas limpezas remotas quando o funcionário se desliga delas. Joel Landau, diretor do conselho de administração da AlphaCare, não quis confirmar se os dados do telefone de Irvin tinham sido apagados. Ele enviou uma cópia dos procedimentos de Byod da empresa, que começaram a vigorar em julho e incluem uma referência à limpeza remota. Irvin diz que nunca recebeu uma cópia dessas regras. A exclusão de dados de telefone é apenas um exemplo das complicações que surgem quando se elimina a divisão entre vida pessoal e profissional. Os empregadores cada vez mais esperam que os funcionários estejam disponíveis todos os dias, 24 horas por dia, mas nem sempre oferecem os equipamentos para que isso seja possível, deixando os trabalhadores diante de um dilema: correr o risco de perder seus dados pessoais ou se negar a usar o próprio aparelho para fins profissionais, o que pode aparentar falta de comprometimento com o trabalho. Por enquanto, essa prática encontra-se em um limbo jurídico, segundo advogados, graças à incapacidade da legislação de acompanhar o ritmo da inovação e à falta de jurisprudência. A Sociedade de Gestão de Recursos Humanos dos Estados Unidos alertou seus membros em novembro que a eliminação de dados dos telefones acabará provavelmente sendo avaliada pelos tribunais. Se apagar dados dos telefones é uma necessidade do ponto de vista da proteção das informações, as empresas devem avisar antecipadamente os empregados para que eles possam fazer uma cópia dos seus dados pessoais, diz Lewis Maltby, fundador do Instituto Nacional dos Direitos dos Trabalhadores, organização americana sem fins lucrativos que monitora questões relacionadas ao ambiente de trabalho, como a privacidade. Muitos empregadores têm um acordo de uso pró-forma que aparece na tela do aparelho quando o funcionário acessa o e-mail ou o servidor de rede por meio do seu próprio dispositivo, acrescenta Maltby. Mas mesmo que esses documentos afirmem explicitamente que a companhia pode apagar dados remotamente, os funcionários geralmente não leem essas mensagens antes de clicar na opção "aceitar". A eliminação dos dados de telefones se tornou a queixa mais comum recebida nos últimos meses pela organização, diz Maltby. Philip Gordon, um dos líderes do grupo de privacidade e checagem de antecedência do escritório de advocacia Littler Mendelson, especializado na área trabalhista, tem dois clientes que enfrentaram queixas de ex-funcionários cujos dados dos telefones foram apagados, todos exigindo indenizações. (Em um dos casos, o funcionário perdeu fotos de um parente que havia morrido.) Apesar de nenhum deles ter recorrido à Justiça, Gordon prevê que os meios legais para os trabalhadores podem ser encontrados nos estatutos dos Estados americanos sobre invasões a computadores, originalmente criados para processar hackers. Um ex-funcionário da empresa de computação em nuvem EMC Corp., de Massachusetts, que pediu anonimato, disse que os dados do seu celular foram apagados há alguns anos após ele ter sido demitido por não ter cumprido metas de vendas. Quando ele começou a trabalhar, ele não tinha um smartphone e a EMC não providenciou um. Segundo ele, como estava perdendo mensagens enviadas tarde da noite sobre mudanças de reuniões e outras informações importantes, decidiu comprar um. À meia-noite do dia em que foi demitido, o telefone apagou. "Fiquei totalmente surpreso", disse. "Eu sei que eles podem proteger seus dados, mas se essa é uma política tão importante, não deveríamos estar misturando o profissional e o pessoal." Ele não se lembra de ter assinado nenhum acordo de uso, apesar de admitir que uma mensagem surgiu na tela na primeira vez que acessou o servidor da EMC, mas que, "como todo mundo", apenas clicou onde estava escrito "OK". Em um comunicado, a EMC se recusou a comentar casos individuais, mas disse que, "em termos de procedimentos padronizados", não remove informações pessoais de celulares particulares de funcionários que deixam a empresa. Desde que a tendência de usar aparelhos próprios no trabalho começou a crescer, há cerca de dois anos, a maioria das grandes empresas adotou sistemas de gerenciamento de dispositivos móveis para abranger o número crescente de produtos tecnológicos que os funcionários usam, diz Lawrence Pingree, da empresa de pesquisas de tecnologia Gartner. As versões mais recentes desses softwares permitem que a equipe da área de Tecnologia da Informação remova cirurgicamente de um smartphone ou computador dados relacionados ao trabalho, um recurso que está se tornando a melhor prática nesses casos, diz ele. |
Fonte: Valor Econômico / The Wall Street Journal, por Lauren Weber , 23.01.2014 |
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