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por Silvio Caccia Bava | ||
Em setembro de 2011, a OAB ajuizou junto ao Supremo Tribunal Federal
uma Ação Direta de Inconstitucionalidade – a ADI 4.650 – contra o
financiamento de campanha eleitoral feito por empresas. Contou com a
CNBB, o PSTU, o Instituto de Pesquisa em Direito Eleitoral da Uerj e o
Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) como amici curiaeda
ação, isto é, copatrocinadores. O argumento central é que o
financiamento empresarial de campanhas eleitorais fere a democracia, que
é uma relação entre cidadãos, e que essa distorção acaba submetendo a
democracia aos interesses do poder econômico.
Uma breve retrospectiva sobre a questão pode ajudar a compreender a
importância dessa iniciativa. A Lei Orgânica dos Partidos Políticos, de
1965, proibia as doações de empresas privadas a campanhas eleitorais, o
que se manteve até o impeachment do presidente Collor, em 1992. Foi no
governo Fernando Henrique Cardoso que o Congresso Nacional aprovou as
Leis n. 9.096/1995 (Lei Orgânica dos Partidos Políticos) e n. 9.504/1997
(Lei das Eleições), que permitem doações financeiras por pessoas
jurídicas a campanhas eleitorais e a partidos políticos. Tal modificação
nas regras do financiamento eleitoral deu um enorme poder às grandes
empresas, que passaram a ser determinantes para a eleição de candidatos.
Essa é mais uma das características do período, no qual o
neoliberalismo impôs a hegemonia do “mercado” no comando da sociedade.
Em 2010 foram grandes empresas que bancaram 95% do custo das campanhas
eleitorais. Apenas 4,9% das doações vieram de pessoas físicas, ao passo
que em 2004 essa fatia era de 27%.
O custo das eleições teve também um aumento estratosférico. Nas
eleições de 2002, os gastos totais de campanhas eleitorais somaram R$
800 milhões. Em 2010, eles chegaram a R$ 4,9 bilhões, segundo o juiz
eleitoral Márlon Jacinto Reis, um dos criadores do MCCE. Para eleger um
deputado federal, gastou-se em 2010, em média, R$ 1,1 milhão; um
senador, R$ 4,5 milhões; um governador, R$ 23,1 milhões. O encarecimento
das campanhas é um funil: quanto mais caras, menos chances para os que
têm menos recursos.
Os resultados são evidentes: 62% dos deputados federais eleitos – 320
parlamentares – receberam doações de apenas 5% das empresas que
financiaram campanhas eleitorais naquele ano. E assim se formam as
bancadas dos interesses privados. Esses gastos também são considerados
um bom investimento, uma vez que, para cada real investido nas campanhas
eleitorais, as empresas obtêm R$ 8,50 em contratos públicos, segundo
pesquisa do Instituto Kellogg Brasil. Entre as principais empresas
doadoras em 2010 estão: Camargo Corrêa, OAS, Andrade Gutierrez,
Siderúrgica Gerdau, Banco Alvorada (Bradesco), BMG, Itaú/Unibanco,
Santander, JBS/Friboi, Ambev, Votorantim Comércio de Energia. Os
investimentos são altos. Segundo a Transparência Brasil, o custo total
das eleições de 2010 e 2012 chega a R$ 10,8 bilhões. Apenas para
comparar, nas últimas eleições ocorridas na França, no ano passado,
somado todo o dinheiro empregado nas campanhas eleitorais presidenciais e
legislativas, foram gastos US$ 30 milhões.
Em 5 de novembro de 2013, o grupo de trabalho criado na Câmara dos
Deputados para discutir a reforma política aprovou o texto da Proposta
de Emenda à Constituição que estabelece mudanças no sistema eleitoral e
de representação dos partidos. Quanto ao financiamento de campanhas, a
proposta mantém a legislação atual e determina que cada partido político
poderá escolher se quer receber dinheiro privado, público ou ambos.
Em 20 de novembro de 2013, o Senado aprovou uma minirreforma eleitoral
que, no entanto, também mantém o financiamento por empresas de campanhas
eleitorais. As mudanças são tópicas e, segundo avaliações, favorecem os
grandes partidos e reduzem o poder de fiscalização da Justiça
Eleitoral, entre outras coisas.
No julgamento pelo STF da ADI 4.650, iniciado em 11 de dezembro de
2013, quatro dos onze ministros dessa instituição votaram a favor da
proibição do financiamento de campanhas eleitorais pelas empresas. São
eles: Dias Toffoli, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Joaquim Barbosa. O
ministro Teori Zavascki pediu vista da ADI, e o julgamento foi suspenso
sem data para ser retomado. Faltam dois votos para que se obtenha a
maioria, e a expectativa é de que, dos sete ministros que faltam votar,
ao menos dois concordem com a tese da proibição. Para concluir a
votação, Teori Zavascki precisa devolver o processo ao pleno do STF. Se a
decisão de impedir o financiamento de campanhas eleitorais por empresas
ocorrer antes do dia 10 de junho, ela vale para a eleição deste ano.
Na corrida contra o tempo, para tentar impedir uma possível decisão do
STF proibindo o financiamento privado de campanhas eleitorais, a Câmara
dos Deputados se prepara para votar logo sua proposta de reforma
eleitoral. Aí, como se sabe, a “bancada das empresas” tem maioria.
Silvio Caccia Bava
Diretor e editor-chefe do Le Monde Diplomatique Brasil
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Atuação: Consultoria multidisciplinar, onde desenvolvemos trabalhos nas seguintes áreas: fusão e aquisição e internacionalização de empresas, tributária, linhas de crédito nacionais e internacionais, inclusive para as áreas culturais e políticas públicas.
sexta-feira, 11 de abril de 2014
Uma disputa e tanto
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