Poucas empresas apostaram tanto no crescimento do Brasil quanto a americana General Electric. O problema é que o país não colaborou — e a empresa teve problemas em suas principais áreas de negócio
Fábrica de turbinas da GE: a empresa perdeu um contrato com a Embraer
São Paulo - Jeff Immelt, presidente mundial do conglomerado americano General Electric (GE),
sempre foi um otimista convicto com o Brasil. Sua primeira visita, em
2005, encerrou um período de 25 anos sem que um presidente da empresa
viesse ao país — seu antecessor, o mítico Jack Welch, basicamente
ignorava o Brasil.
Desde então, Immelt sempre disse que o país era um de seus mercados
mais promissores. Em 2011, o otimismo chegou ao ápice. Immelt foi o
primeiro empresário a ser recebido por Dilma Rousseff
após sua eleição. Anunciou que investiria 500 milhões de reais em um
centro tecnológico a ser construído no Rio de Janeiro — um dos seis em
todo o mundo.
O Brasil tinha se tornado o terceiro maior mercado para a GE — atrás de
Estados Unidos e China. A economia do país havia crescido 7,5% em 2010,
e o governo prometia investir 1,6 trilhão de dólares em infraestrutura até o fim de 2014.
Um dos maiores conglomerados do mundo, com receita de 140 bilhões de
dólares em áreas que vão de petróleo a transportes, a GE parecia ser a
empresa certa, no lugar certo. Mas, três anos depois, quase nada saiu
como o previsto. A GE até fez sua parte para empurrar o Brasil. Já o
Brasil...
A última visita de Immelt ao país, no fim de março, é simbólica. O
plano inicial era que ele viesse cortar a fita do centro de pesquisas,
cuja inauguração já havia sido adiada duas vezes. O convite chegou a ser
enviado à presidente Dilma.
O centro teria até 250 pessoas, grande parte delas cientistas
pesquisando novas tecnologias, principalmente para a exploração de
petróleo. Mas a abertura foi adiada novamente. Em vez de fazer bonito
com a presidente, Immelt foi a Brasília dizer que o Brasil ainda é
prioridade.
Além do centro de inovação, a empresa enfrenta dificuldades em áreas
como petróleo, transporte e aviação, que respondem por metade da receita
no país. A GE não concedeu entrevista.
Em grande medida, a empresa foi vítima de um Brasil que não aconteceu.
Como se sabe, de 2011 a 2013, o crescimento do país foi pífio. E alguns
dos setores prioritários para a GE sofreram ainda mais. No setor de
petróleo, todas as fornecedoras da Petrobras penam para atender às exigências de conteúdo nacional que o governo impôs. E a estatal é a maior cliente da GE no Brasil.
“Havia uma euforia generalizada com o pré-sal.
Agora muita gente diminuiu o ritmo”, diz Maurício Guedes, gestor do
parque tecnológico do Rio de Janeiro, onde fica o centro de inovação da
GE. Diante do baixo-astral generalizado no setor de óleo e gás, a GE
parece não ter pressa para inaugurar o centro de inovação.
Isso, claro, se tudo desse certo com Eike, e não foi esse o caso. No segundo trimestre de 2013, a GE reconheceu em seu balanço que perdeu 108 milhões de dólares com a queda no valor das empresas de Eike.
Além da perda contábil, a GE se tornou um dos principais credores da OGX
por causa de equipamentos não pagos. Conseguiu receber uma parte em
março, quando a petroleira OGX pagou cerca de 75 milhões de reais a um
grupo de fornecedores encabeçado pela GE.
Em outros mercados, houve uma combinação de crescimento abaixo do
esperado e concorrência maior — afinal, a GE não foi a única
multinacional a mergulhar em países emergentes na última década. Na
divisão de transportes, a produção anual de locomotivas na fábrica de
Contagem, no interior de Minas Gerais, caiu de 116 em 2011 para 50
unidades em 2013.
Em 2008, com a produção no limite, a empresa investiu 35 milhões de
dólares para ampliar a capacidade da unidade. Desde então, sofre com a
concorrência da americana Caterpillar, que há dois anos produz
locomotivas na cidade vizinha de Sete Lagoas — perto o suficiente para
se beneficiar da cadeia de fornecedores que a GE construiu ao longo de
50 anos na região.
“O mercado não cresceu e as encomendas foram divididas”, diz Vicente
Abate, presidente da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária. Mas
talvez o pior baque tenha acontecido no mercado de aviação. Em 2013, a
empresa perdeu para a americana Pratt Whitney a concorrência para ser a
fornecedora de turbinas da nova família de jatos da Embraer, num
contrato de 600 milhões de dólares anuais.
Desde 1999, a GE forneceu turbinas para mais de 1 000 aeronaves da Embraer.
Somando todas as dificuldades, a GE não cresceu no país em 2013 — o
faturamento repetiu 2012, na casa dos 3,3 bilhões de dólares. A meta era
crescer mais de 10%.
Não é, claro, um pesadelo. Muitos dos principais negócios da GE têm
maturação longa. Mas a pressão por redução de custos é imediata. Segundo
executivos da empresa, em algumas áreas a meta é cortar mais de 25% os
custos administrativos em 2014.
Em julho de 2013, a GE transferiu a maior parte de seus funcionários
administrativos para um novo edifício, em São Paulo, com o objetivo de
economizar 30 milhões de reais em dez anos. A oferta de carros para os
executivos foi reduzida e até o plano de saúde piorou.
É bem verdade que, em momentos de aperto em alguns negócios, a
diversificação da GE vira um trunfo. A Celma, especializada na
manutenção de turbinas de avião, já fatura mais de 1 bilhão de dólares. A
divisão de equipamentos médicos fez duas aquisições desde 2012.
A empresa também ampliou sua fábrica de equipamentos para energia
eólica em Campinas e anunciou a construção de outra para o Nordeste.
Mas, passada a euforia com o Brasil, a GE já tem um novo mercado
favorito: a África. Aos acionistas, Immelt disse que a meta é crescer
30% ao ano no continente. O Brasil não ajudou a GE — é natural que,
daqui para a frente, a GE nos ajude um pouco menos também.
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