Relatório aponta indícios de ‘gestão temerária’ e falhas ‘acima do razoável’ na compra de refinaria
Andreza Matais e Murilo Rodrigues Alves
BRASÍLIA - Relatório do Ministério Público junto ao
Tribunal de Contas da União (TCU) recomenda que os responsáveis pela
negociação de compra da refinaria de Pasadena sejam responsabilizados
por eventuais perdas da estatal. O negócio, que contou com o aval da
hoje presidente da República, Dilma Rousseff, foi iniciado em 2006 e
concluído em 2012, após um longo litígio e gasto superior a US$ 1
bilhão. O documento da procuradoria de contas, ao qual o Estado teve
acesso, e que subsidiará a decisão dos ministros do tribunal, afirma que
a alta cúpula da Petrobrás, "incluindo os membros do
Fabio Motta/Estadão
Dilma discursa no dia da posse de Graça Foster
Conselho de Administração", respondam "por dano aos cofres públicos,
por ato antieconômico e por gestão temerária", caso sejam comprovadas
irregularidades. Para o MP, as falhas dos gestores da Petrobrás na
condução do negócio foram "acima do razoável". Em 2006, Dilma, que era
chefe da Casa Civil do governo Luiz Inácio Lula da Silva, presidia o
Conselho de Administração da Petrobrás. No mês passado, ao saber que o
Estado publicaria uma reportagem que revelaria seu voto favorável à
compra de 50% da refinaria naquele ano, a presidente divulgou nota na
qual afirmou só ter apoiado o negócio porque foi mal informada sobre as
cláusulas do contrato.
Em 2008, ainda como presidente do Conselho de Administração, Dilma
passou a ser contra o negócio e atuou para tentar barrar a compra de
100% da refinaria, algo que, em razão de custos judiciais, encareceu
ainda mais a transação, que precisou ser concretizada.
Palavra final. O relatório final do TCU, que usará o trabalho da
procuradoria de contas como base, deve sair em julho, mês em que a
campanha eleitoral será iniciada. Em entrevista no mês passado, o
relator da caso de Pasadena no tribunal, ministro José Jorge, afirmou:
"Como a compra passou pelo Conselho Administração e pela Diretoria, como
regra geral do TCU, eles podem ser chamados a se explicar".
A procuradoria afirma que a Petrobrás foi "vítima" da "inabilidade de
seus gestores em firmar acordos contratuais". Para o MP junto ao
tribunal, da forma como o negócio foi fechado, o grupo belga Astra Oil
adquiriu o direito "líquido e certo" de vender sua participação à
Petrobrás, recebendo o valor fixado nos contratos. "Para ela (Astra
Oil), tudo era possível, e, para a Petrobrás, ao que parece, restava
acatar a decisão da sócia", afirma o relatório do Ministério Público de
Contas.
Os auditores designados pelo ministro relator trabalham, ainda, com
outra linha de responsabilização. A intenção dos técnicos é se basear no
artigo 158 da Lei das S.A., que prevê punição aos gestores quando
houver violação "ao dever de cuidado e diligência" ou "imprudência,
negligência e imperícia".
A legislação impõe que "o administrador da companhia deve empregar,
no exercício de suas funções, o cuidado e diligência que todo homem
ativo e probo costuma empregar na administração dos seus próprios
negócios".
Belgas. A Astra impôs várias condições à estatal para firmar a
parceria, exatamente o contrário do que deveria ter ocorrido, afirmam os
procuradores. "Ela estava fora do negócio e tinha o direito, se não a
obrigação, de exigir garantias mínimas da futura sócia, sobretudo ante o
preço que se dispôs a pagar", diz o documento. "O poder de decisão não
minimizou os riscos do negócio para a estatal brasileira. Ao contrário,
só os aumentou", completa o relatório.
Um dos pontos criticados no texto é o fato de a Petrobrás pagar duas
vezes pelo combustível estocado na refinaria, já que arcou pela unidade
com estoques inclusos e, posteriormente, pagou mais uma vez pelos
estoques. Há "evidências consistentes", diz o texto, de que o valor dos
produtos estocados não estava incluso nos US$ 360 milhões pela aquisição
porque a Petrobrás nem sequer tinha conhecimento do volume e do valor
dos estoques.
A análise da operação ainda critica a oposição da estatal de levar
adiante uma batalha judicial para não cumprir as cláusulas contidas no
contrato de compra da refinaria. Laudo da Justiça dos EUA confirmou o
valor de US$ 466 milhões pelo restante da unidades e ainda obrigou a
Petrobrás a desembolsar US$ 173 milhões por garantia bancária dos
sócios, juros, honorários e despesas processuais, o que fez com que a
conta aumentasse para US$ 639 milhões.
O documento afirma que há de se apurar por que a Petrobrás não
cumpriu a decisão proferida em abril de 2009. "Ao que parece, essa
postura levou a empresa a arcar com milhares de dólares referentes a
juros e correção monetária. E mais uma vez pede a responsabilização do
Conselho de Administração caso se constate que não havia razões
suficientes para o descumprimento da decisão arbitral, deve-se apurar a
responsabilidade dos gestores e membros do Conselho de Administração."
Crise. A manifestação da presidente ao questionamento do Estado
causou uma crise política, que acarretou na aprovação de uma CPI para
investigar a estatal. Em meio ao caso de Pasadena, outras suspeitas
recaíram sobre a Petrobras. A principal delas envolve o ex-diretor de
Abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa, alvo da Polícia Federal
por suas ligações com o doleiro Alberto Youssef.
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