Angelo Pavini |
A Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Espírito Santo negou ontem à tarde o pedido de recuperação judicial,
espécie de concordata, feito pela Ympactus Comercial, conhecida como
Telexfree. O pedido já havia sido rejeitado em primeira instância pelo
juiz da Vara de Recuperação Judicial e Falência de Vitória.
Segundo o comunicado do TJES, o julgamento foi acompanhado por vários
investidores da Telexfree, que lotaram a sala de sessões. Em seu voto, o
relator do processo, desembargador substituto Lyrio Regis de Souza
Lyrio destacou que a Lei de Recuperação Judicial estabelece que a
empresa só pode pedir o benefício se estiver exercendo suas atividades
há mais de dois anos. O juiz de primeiro grau e o Ministério Público
Estadual defenderam que o prazo de dois anos deveria ser contado a
partir do exercício regular da atividade empresarial. Já a Telexfree
alegou que o prazo deveria contar a partir do registro na Junta
Comercial.
O relator lembrou que a empresa foi constituída há dois anos como uma
sociedade limitada, cujo objetivo era o ramo de comércio varejista de
cosméticos, produtos de perfumaria e higiene pessoal, bem diferente,
portanto, do negócio de venda de créditos para ligações telefônicas. Em
março de 2012, observou o relator, a Ympactus firmou contrato de cessão
de uso da marca com a Telexfree LLC, empresa americana “cujo objetivo
era a prestação de serviços de divulgação da contratada pela contratante
e a cessão de uso da marca Telexfree com duração de dois anos”.
A Telexfree só se tornou sociedade anônima a partir de julho de 2013,
passando de Ympactos Comercial Ltda para Ympactos Comercial S/A. Os
objetivos sociais também foram alterados, passando a ser portais,
provedores de conteúdo e outros serviços de informação na internet e
processamento de dados; agências de publicidade com prestação de
serviços de anúncios, promoção de vendas diretas e portais de divulgação
comercial, consultoria em publicidade; pesquisa de mercado e de opinião
pública e intermediação e agenciamento de serviços e negócios em geral.
Para o relator, como o pedido de recuperação judicial se refere às
novas atividades, o prazo de existência da empresa deveria ser julho de
2013, e não o registro da empresa anterior.
Assim, o pedido de recuperação judicial, que permitiria à Telexfree
evitar a falência, foi rejeitado pelo relator, e pelos outros dois
desembargadores que analisaram o caso.
Em 18 de julho de 2013, a 2ª Vara Cível da Comarca de Rio Branco, no
Acre, julgou favorável pedido do Ministério Público daquele Estado para
suspender as atividades da Telexfree, acusada de montar uma pirâmide
financeira. Com a decisão, foram suspensos os pagamentos e as adesões de
novos contratos até o julgamento final da ação.
Comissão na Câmara para marketing multinível
Ontem, a Câmara dos Deputados criou uma Comissão Especial da
Regulamentação do Marketing Multinível para analisar o projeto de lei
6667/13. A iniciativa dos deputados visa regulamentar o marketing
multinível, sistema no qual empresas montam redes de revendedores
independentes que ganham comissões sobre as vendas feitas pelos
associados que conseguiram trazer para o grupo. O sistema é usado por
empresas como Avon, Natura, AmWay e Tupware, mas acabou sendo
desvirtuado para empresas que criam pirâmides financeiras.
No caso da Telexfree, a acusação é de que a empresa, que oficialmente
vende assinaturas de telefonia via internet (Voip), estaria oferecendo
ganhos na montagem de redes de vendedores que, em lugar de oferecer o
serviço, receberiam por publicar anúncios na internet. Como, para
anunciar, cada interessado tem de pagar um valor inicial, ou comprar um
“kit”, que pode ir de US$ 50 a US$ 1.425,00, recebendo uma remuneração
proporcional ao investimento, o ganho viria mais da conquista de novos
integrantes do que do negócio em si.
Estimativas são de que mais de um milhão de pessoas entraram no esquema da Telexfree.
Outra empresa, a BBom, de Goiás, também teve seus bens bloqueados
pela Justiça, acusada de montar uma pirâmide financeira a partir da
venda de rastreadores para carros. Para o Ministério Público de Goiás, o
negócio da BBom é uma pirâmide porque se sustentaria mais do pagamento
de taxas de adesão pelos clientes/vendedores do que da venda efetiva dos
equipamentos.
Como os vendedores recebem pelo número de novas adesões que conseguem
– a custos que variam de R$ 600 a R$ 3 mil – os associados novos
pagariam a remuneração dos antigos, o que tornaria a arregimentação de
vendedores o verdadeiro negócio da empresa, e não os rastreadores.
A estimativa é que 300 mil pessoas teriam aderido ao sistema da BBom.
Priples e anúncios na internet
Outra empresa na mira da Justiça é a Priples, empresa de anúncios
virtuais, mas que faturava com a cobrança de taxas de adesão. Criada em
1º de abril (não é mentira…) do ano passado, a Priples começou a atrasar
os pagamentos aos associados já no fim de maio.
O esquema teria movimentado R$ 107 milhões, quase tudo originado das
adesões, segundo o delegado Carlos Couto, responsável pelo inquérito,
que resultou, em agosto do ano passado, na prisão dos sócios, o
estudante de ciências da computação Henrique Maciel Carmo de Lima, de 26
anos, e a enfermeira Mirele Pacheco de Freitas, de 22 anos.
Cerca de 200 mil pessoas teriam sido prejudicadas pelo esquema. No
dia 31 de janeiro, a Justiça de Pernambuco decidiu obrigar a Priples a
devolver R$ 11 mil a dois investidores. A Justiça bloqueou cerca de R$
100 milhões que estavam no caixa da empresa. Segundo o jornal “Diário de
Pernambuco”, laudo do Instituto de Criminalística que analisou os
livros contábeis da Pribles atesta que 99,9% da movimentação financeira
da empresa se relacionam com as novas adesões ao negócio, o que indica
falta de sustentação econômica ao da empresa.
Blackdever ou pode chamar de Wishclub
O Ministério Público de Minas Gerais entrou com ação em outubro do
ano passado contra a Blackdever, empresa que se apresentava como negócio
de marketing multinível a partir de uma rede que ofereceria desde
serviços a um clube de compras com descontos para associados (outlet).
Criada em março de 2013, a empresa teria arrecadado R$ 72 milhões até
agosto, quando a 10ª Vara Cível de Uberlândia determinou o bloqueio de
R$ 36 milhões das contas da Blackdever. Para a Justiça mineira, o
esquema da empresa se caracterizava como uma pirâmide financeira pois os
participantes recebiam comissões por novas adesões, e não apenas pelas
vendas dos produtos, que nem sequer eram citados no site.
Bônus de qualificação
O presidente da empresa, Rogério Alves, teria se mudado para a
Espanha, onde abriu outro negócio semelhante, o Wishclub, que oferece
também bônus de equipe, no qual o associado recebe pela adesão de novos
integrantes da rede. O Bônus de Liderança, segundo o site, que tem o
mesmo endereço da Blackdever, informa que os interessados podem receber
de 2% a 50% do valor do bônus de qualificação da equipe formada por ele.
“Exemplo: Isabela se qualifica a Black Diamond, recebendo € 50 mil: 50%
do valor fica para Isabela e outros 50% vai para a Rede”, diz a nota no
pé da tabela com as categorias.
Produtos selecionados
O texto, porém, não bate com a tabela, que estabelece que o Black
Diamond recebe 25% dos bônus. Na tabela, as categorias vão de 2% na
classificação Bronze, 3% na Silver, 5% na Gold, 8% na Sapphire, 10% na
Esmeralda, 15% na Diamante, 20% na White Diamont e 25% na Black
Diamont. O site não explica que produtos são vendidos nem que serviços
são oferecidos, limitando-se a dizer que são “produtos e serviços
selecionados e de alta qualidade, sempre alinhados ao conceito de
bem-estar e qualidade de vida”.
Em comunicado divulgado no Facebook, Rogério Alves, falando de Madri,
disse que fechou uma parceria internacional com a WishClub, até que a
situação da Blackdever seja definida no Ministério Público. Enquanto
isso, os associados teriam a opção de migrar para a WishClub ou ficar na
Blackdever. Os que ficarem receberão a devolução de seus
“investimentos” (sic) quando o Ministério Público chegar a uma conclusão
sobre a legalidade da Black e liberar o dinheiro bloqueado.
Cartão de banco espanhol
A migração para o Wishclub não terá custo e os consultores receberão
um cartão de débito de um banco espanhol. “Como os assinantes do club
wish terão um valor mensal de ativação, isso garantirá um ganho mensal
aos consultores”, diz o texto.
Recentemente, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) divulgou uma cartilha explicando as diferenças entre marketing multinível e pirâmide financeira.
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