Fabiana Maranhão
Do UOL, em São Paulo
Do UOL, em São Paulo
Há seis meses o jogador nigeriano Akin (nome fictício que significa
"homem valente, guerreiro, herói; o entrevistado pediu para não ter o
nome revelado), 25, deixou o futebol profissional em seu país para
seguir carreira no Brasil. Veio sozinho, trazendo na bagagem o desejo de
felicidade e de "uma nova vida". Em situação irregular, vive atualmente
com o que ganha distribuindo folhetos no centro de São Paulo.
O
caso dele se parece com o de cerca de 185 mil estrangeiros que moram na
capital paulista. Segundo estimativa da Secretaria Municipal de
Direitos Humanos, um em cada três imigrantes que vive em São Paulo está
em situação irregular.
O nigeriano desembarcou na capital paulista vindo de Imo, cidade ao sul do país africano, distante quase 7.000 km de São Paulo. Ele não possui visto para trabalhar nem para continuar morando no país.
O nigeriano desembarcou na capital paulista vindo de Imo, cidade ao sul do país africano, distante quase 7.000 km de São Paulo. Ele não possui visto para trabalhar nem para continuar morando no país.
Imigrantes em São Paulo
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368.188
estrangeiros registrados
-
185 mil
imigrantes irregulares (estimativa)
Fontes: Polícia Federal e Secretaria Municipal de Direitos Humanos de São Paulo
"É muito difícil viver aqui, sem a família, sem amigos, sem emprego,
sem casa", diz. O jovem mora em um abrigo no bairro da Mooca, na zona
leste. Ele só fala em inglês e igbo, idioma de sua região, o que torna
difícil conseguir trabalho. "Eu quero ficar. Não tenho para onde ir e
não posso voltar".
Imigrantes irregulares
Cidade de imigrantes por tradição, a capital paulista possui atualmente 368.188 estrangeiros registrados, de acordo com dados do Sincre (Sistema Nacional de Cadastramento e Registro de Estrangeiros), fornecidos ao UOL pela Polícia Federal.
A secretaria acredita que a quantidade de imigrantes na cidade seja
cerca de 50% maior que o número oficial. "Considerando os irregulares,
existem cerca de 600 mil imigrantes em São Paulo", afirma Paulo Illes,
coordenador de políticas para imigrantes da secretaria.
Deisy
Ventura, professora do Instituto de Relações Internacionais da USP
(Universidade de São Paulo), afirma que o número de imigrantes
irregulares pode ser ainda maior. "[Essa quantidade] é só uma
estimativa, pode ser maior. [Os imigrantes] não respondem a censo
populacionais. Ninguém sabe ao certo. Nossas fronteiras são muito
porosas , e o controle das fronteiras é difícil", diz.
José
Renato de Campos Araújo, professor da USP e especialista em política
migratória, explica que a clandestinidade é marca da imigração ocorrida
após a Segunda Guerra Mundial. Antes disso, segundo ele, os estrangeiros
chegavam de forma legalizada.
"O Brasil fazia campanha na
Europa, pagava passagem para o imigrante vir. Era uma imigração
subsidiada, havia uma ação proativa do Estado", diz.
A situação
atual é diferente. "A realidade da imigração [nos dias de hoje] anda
muito próxima às redes de atividades ilegais, como tráfico de drogas,
tráfico de pessoas", acrescenta.
Clandestinidade
Se os
imigrantes encontram facilidade para entrar no país, o mesmo não ocorre
para se manterem aqui. "Essas pessoas conseguem entrar, mas não
conseguem ficar regularmente e, mais que isso, ficar dignamente", afirma
Ventura.
A pesquisadora faz críticas ao processo de
regularização de um estrangeiro no Brasil, que ela classifica como
difícil. "Ao não serem consideradas em situação regular, essas pessoas
não têm acesso a programas sociais e se tornam muito mais vulneráveis",
analisa.
A advogada Adriane Khoury Secco concorda com a estudiosa. "É complicado
o processo de obter visto para permanecer no Brasil. Às vezes é preciso
entrar com um processo administrativo e até um processo judicial",
fala. Ela presta assistência jurídica no Centro de Apoio ao Migrante,
entidade que atende cerca de 400 estrangeiros por mês em São Paulo.
Estatuto do Estrangeiro
A lei 6.815/1980, conhecida como Estatuto do Estrangeiro, prevê poucas
possibilidades para a concessão de visto permanente. Podem solicitar o
documento pais e companheiros de pessoas nascidas no Brasil, refugiado
ou asilado, vítima de tráfico de pessoas e pesquisador estrangeiro com
alta graduação.
A legislação estabelece outros tipos de visto,
como de trabalho e de estudante, mas ambos têm limite máximo de um ano e
só podem ser renovados no país de origem do imigrante.
"A lei
brasileira deveria ser flexibilizada. É uma lei antiga, que diferencia,
criminaliza as migrações, tem preconceito contra o imigrante", diz
Adriane Khoury Secco. O estatuto é de 1980, anterior à Constituição
Federal.
Na opinião da advogada, o grande números de imigrantes
irregulares também pode ser explicado pelo fato de que muitos deles
chegam ao país com a ideia de voltar. "Como pretendem voltar para o país
de origem, muitos não procuram regularização", explica. Ela lembra
ainda que muitos imigrantes são vítimas de tráfico humano e de trabalho
escravo.
O padre Roque Patussi, da Pastoral do Migrante de São
Paulo, critica o fato de o imigrante não poder votar, mesmo tendo visto
permanente. "Uma das nossas lutas é pelo fim da ditadura no meio dos
imigrantes. Eles pagam impostos, mas não podem votar".
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