A Receita Federal ampliou os requisitos necessários para
dispensar as multinacionais de comprovarem a aplicação dos chamados
preços de transferência nas vendas a vinculadas e coligadas no exterior
para efeitos de recolhimento do Imposto de Renda e da CSLL. As novas
regras, previstas na Instrução Normativa nº 1.312, publicada em 31 de
dezembro de 2012, passam a valer neste ano.
Segundo advogados, o aumento
das exigências fará com que a maioria das empresas brasileiras perca
suas salvaguardas.
Com o preço de transferência, a Receita estabelece margens de lucro
dos insumos ou produtos envolvidos nas operações para assegurar que os
valores de receitas, custos e despesas da operação estão de acordo com
os preços de mercado. Nas declarações, o contribuinte deve demonstrar,
em cálculos complexos, os ajustes de preços que fez em cada item
exportado. O objetivo é evitar que companhias brasileiras remetam
receitas a mais para fora do país com o intuito de recolher menos
tributos.
Pela Instrução Normativa - que regulamentou a aplicação da Lei nº
12.715, de 2012, que traz novas regras do preço de transferência - o
Fisco criou um novo critério para conceder a salvaguarda. As empresas
deverão provar que suas exportações a vinculadas limitam-se a 20% do
total de receita líquida de exportação anual. "Com esse filtro, 90% das
empresas ficarão de fora", diz Diego Marchant, tributarista do
escritório Machado Meyer.
Além disso, a Receita aumentou de 5% para 10% a lucratividade mínima
que a companhia deve ter com exportações a vinculadas para ser
dispensada de comprovar os ajustes dos preços parâmetros. O cálculo deve
considerar a média do ano de apuração e os dois anos anteriores. "Este
aumento prejudica os pequenos exportadores que, para atingir o
percentual mínimo, terão que encarecer suas exportações com risco de
perda de competitividade", afirma Marchant.
Quando a empresa tem a salvaguarda não precisa demonstrar ao Fisco
que os valores dos itens exportados estão de acordo com os preços de
mercado. A companhia simplesmente declara a receita e a despesa que
apurou nas operações para determinar o lucro a ser tributado.
Segundo advogados, os novos critérios para obter a salvaguarda
pegaram todos de surpresa. "A restrição é muito grave por conta do tempo
entre a publicação e início da vigência da norma", diz o tributarista
Alexandre Siciliano Borges, do escritório Lacaz Martins, Pereira Neto,
Gurevich & Schoueri Advogados. Tributaristas afirmam que muitas
empresas trabalharam no ano de 2012 para ficar no limite de 5%. "No
último dia do ano são surpreendida e poderão ter que correr atrás de
documentação das vinculadas para comprovar métodos e recolher os
tributos corretamente no final deste mês", diz Marchant.
A Receita Federal, por meio de sua assessoria de imprensa, informou
que os novos critérios para salvaguarda - previstos no artigo 48 da IN
-- passam a valer apenas para o ano-calendário 2013. "O preço de
transferência é apurado no dia 31 de dezembro de cada ano. Desse modo,
até 31 de dezembro de 2012 vale a regra anterior", diz a nota.
Tributaristas, porém, já elaboram teses de defesa em caso de futuras
autuações fiscais. Para eles, não há segurança jurídica porque a IN não é
clara em relação ao início da vigência dos novos critérios.
Advogados veem risco de empresas que operaram no limite de 5% em 2012
tenham as apurações e recolhimentos do IR e CSLL questionados pelo
Fisco durante as fiscalizações nos próximos anos. "O tema é controverso.
Mas o contribuinte que for autuado tem argumentos, como o princípio da
legalidade e da razoabilidade, para aplicar a nova regra só para o ano
calendário de 2013", afirma Marchant.
O advogado cita o precedente do Conselho Administrativo de Recursos
Fiscais (Carf) que, em março, cancelou uma autuação fiscal de R$ 4,5
milhões (valor de 2008 com multa e juros) contra a empresa de sistemas
automotivos Delphi. Na ocasião, os conselheiros entenderam que a
tentativa da Receita de aplicar a Instrução Normativa nº 243, editada em
novembro de 2002 - que regulamentava a aplicação das regras do preço de
transferência - para as operações realizadas naquele ano violaria o
princípio da proteção à confiança legítima. Isso porque a norma anterior
- a IN nº 32, de 2001- era mais vantajosa ao contribuinte.
A Receita determina ainda, na IN, as hipóteses em que as operações de
"back to back" devem se submeter às regras de preço de transferência.
Nessas operações, uma empresa brasileira compra uma mercadoria de uma
vinculada nos Estados Unidos, por exemplo, e esta exporta as mercadorias
adquiridas para uma terceira empresa estrangeira. A mercadoria
efetivamente não entra ou sai do Brasil. Contabilmente, entretanto, a
apuração ocorreu e afetou o resultado da empresa brasileira.
A advogada Mary Elbe Queiroz, do Queiroz Advogados, vê nessa
determinação um ponto de possível questionamento, apesar de considerar a
nova IN positiva por dar transparência e segurança jurídica ao
contribuinte. "A lei não estabelece a sujeição do back to back às regras
do preço de transferência, mas a IN cria uma obrigação nova", diz. A
previsão, segundo advogados, é fruto da interpretação da Receita
manifestada em soluções de consulta. "A Receita entende que essa é uma
interpretação e o Carf e o Judiciário já tem entendimento de que normas
interpretativas podem ser aplicadas retroativamente", afirma,
referindo-se ao artigo 106 do Código Tributário Nacional (CTN). "Na
visão do Fisco há base legal para essa interpretação, que, portanto, já
vale para 2012", diz
Alexandre Siciliano.
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