sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

UE abre queixa formal contra o Brasil na OMC por "protecionismo"


Por Daniel Rittner e Thiago Resende | De Brasília
 
Wilson Dias/Agência Brasil / Wilson Dias/Agência Brasil 
 
Para o ministro das Relações Exteriores, Luiz Figueiredo, Brasil tem "argumentos sólidos" para defender medidas
 
 
Às vésperas de trocar ofertas nas negociações de um acordo com o Mercosul, a União Europeia "emparedou" o Brasil na Organização Mundial do Comércio (OMC), apresentando uma queixa formal contra medidas de política industrial adotadas pelo governo nos últimos anos. A UE questiona incentivos tributários como o Inovar-Auto, programa que tenta atrair montadoras de veículos para o país, e exigências de conteúdo nacional em equipamentos eletrônicos. O bloco também diz ter incluído, na contestação, benefícios a produtos da Zona Franca de Manaus e "vantagens fiscais" a exportadores.

O governo brasileiro saiu em defesa de sua política. "Estamos confiantes de que temos argumentos sólidos para provar a nossa plena conformidade com as regras multilaterais de comércio", disse o ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo.

Os dois lados terão 60 dias para resolver a disputa com uma negociação. "A expectativa, em qualquer processo dessa natureza na OMC, é de que as consultas sejam bem sucedidas, que as partes [os países] cheguem a um entendimento ainda nessa fase, sem a necessidade de se recorrer a um contencioso", afirmou o diretor-geral da organização, Roberto Azevêdo, após evento na Confederação Nacional da Indústria (CNI). Ele disse ter sido informado sobre a queixa europeia ontem de manhã, assim que chegou ao Brasil. Se não houver solução amigável no prazo estipulado, a UE pode pedir a abertura de uma arbitragem pelo órgão de solução de controvérsias da OMC.

O Mercosul e a UE estão em plena negociação para um acordo de livre comércio. Em janeiro, está prevista a primeira troca de ofertas entre os blocos, quando as duas partes vão apresentar suas propostas de queda gradual de tarifas. O governo brasileiro evitou fazer comentários sobre os efeitos da reclamação aberta ontem na OMC nas conversas para avançar no acordo. Questionado sobre o assunto, o chanceler brasileiro se limitou a afirmar que esse tipo de procedimento faz parte das regras do organismo multilateral. "Não quero fazer nenhum tipo de ilação sobre motivações ou impactos. Faz parte das regras que um país ou um grupo de países busque a OMC para a solução de controvérsias."

O bloco europeu questiona principalmente o regime automotivo adotado pelo Brasil, o Inovar-Auto. Nesse programa, a equipe econômica buscou estimular o setor por meio de benefícios tributários para automóveis produzidos no país e, ao mesmo tempo, elevou impostos sobre veículos estrangeiros.

De forma geral, a acusação é de que o Brasil viola as regras internacionais de comércio com políticas tarifárias que discriminam empresas do exterior. Benefícios tributários para outras mercadorias, como smartphones, semicondutores e computadores também fazem parte da queixa.

A CNI também saiu em defesa das ações adotadas pelo governo. Para o presidente da entidade, Robson Andrade, o Brasil não é um país protecionista, mas sim França e a Alemanha, por exemplo. Ele citou ainda dificuldade de exportar veículos para a Europa e produtos manufaturados para os Estados Unidos. "Muitas vezes não é preço, e sim questões de especificações técnicas, barreiras não tarifárias que esses países adotam", disse Andrade.

Essa não foi a primeira vez que medidas para incentivar a produção de carros no Brasil foram tema de reclamação em reuniões da OMC por parte de europeus, japoneses e americanos.

Em 2011, o governo elevou o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) dos carros importados em 30 pontos percentuais, deixando de fora apenas os veículos trazidos do México e do Mercosul. A medida tentava conter sobretudo a importação dos modelos chineses, em franca expansão. Depois, em 2012, foi criado o programa Inovar-Auto, que alivia o adicional do tributo para quem produz no país. Incentivadas pela medida, marcas de luxo como BMW, Audi e Land Rover, hoje importadas da Europa, decidiram instalar fábricas no país. Para minimizar as críticas internacionais, o governo adotou uma cota de importação para as marcas estrangeiras. O Inovar-Auto permite que até 4,8 mil veículos, pro importador, possam entrar no país sem pagar o imposto elevado.

A Comissão Europeia reclamou várias vezes com o Brasil por causa das medidas. Sem mudanças e com as medidas se "proliferando", o bloco decidiu recorrer à OMC. O bloco europeu alega que o Brasil tem usado o sistema tributário de modo incompatível com os compromissos da OMC, dando vantagens aos produtores nacionais e os protegendo de competição.

Essas medidas têm um impacto negativo nas exportações da União Europeia, que enfrenta maior tributação do que os competidores locais. As medidas restringem o comércio e resultam e aumento de preços para os consumidores brasileiros, menor oferta e acesso restrito a produtos inovadores", afirma texto dos representantes do bloco na OMC.

O diretor-geral do organismo multilateral frisou que grande parte das queixas abertas não resultam em um contencioso. Ele lembrou que o próprio Brasil apresentou diversos questionamentos na OMC que se resolveram em um consentimento entre os dois lados. "Não estou dizendo que não vai chegar a um contencioso, mas não é descabido de que haja uma solução negociada antes de se chegar a um contencioso", disse.

Para Azevêdo, "cada caso é um caso" e, portanto, é "impossível traçar um paralelo" entre um procedimento anterior e a reclamação feita pela União Europeia contra a política industrial brasileira. "Não existem casos idênticos na OMC até quando as medidas [adotadas] são muito parecidas, porque, do ponto de vista comercial e econômico, são diferentes", completou. (Com agências noticiosas)

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