Míriam Leitão
Quando a presidente da República participa de um evento em que se
acusa a cúpula do Judiciário de manipulação, e de ter realizado um
julgamento de exceção, está enfraquecendo a democracia brasileira. Foi o
que a presidente Dilma fez. O que ela não disse explicitamente, o
ex-presidente Lula o fez. O que ela demonstrou no 5º Congresso do PT,
por ação ou omissão, é grave.
Dilma sabia o que seria a abertura
do 5º Congresso do seu partido. Sabia que lá defenderiam os condenados
do mensalão. Ao mesmo tempo, como chefe do Poder Executivo, ela não pode
participar de um ato em que a Justiça brasileira está sob ataque. O
Supremo Tribunal Federal cumpriu todo o devido processo legal. Dilma
consentiu — pelo silêncio e pela presença — com as acusações ao
Tribunal. Ela é militante do PT e é a candidata. A situação era
delicada, mas ela só poderia participar de um evento sóbrio em que não
ocorresse o que ocorreu.
O presidente Lula, como é de seu feitio,
fez o que disse que não faria e acusou o julgamento de ter sido
resultado da “maior campanha de difamação". Dilma pensa que se protegeu
atrás de afirmações indiretas como a de que os petistas têm “couro duro"
ou o partido está em “momentos difíceis". Pensava que ficara em cima do
muro, mas estava tomando partido.
A chefe do executivo de um
governo democrático só pode ir para uma reunião de correligionários em
que o Poder Judiciário é atacado se for para defendê-lo. Seu silêncio a
coloca do lado dos que acusaram o processo de ser de exceção. Ela sabe
bem a diferença.
Seus amigos e companheiros José Dirceu, José
Genoino, Delúbio Soares, João Paulo Cunha e aliados de outros partidos
foram investigados pelo Ministério Público e denunciados. O STF aceitou a
denúncia e em sete anos de tramitação do processo deu amplo direito de
defesa aos réus e analisa os recursos. Os juízes foram em sua maioria
escolhidos por ela ou por seu antecessor. Houve troca de juízes mas não
de juízo da maior corte do país. Eles foram considerados culpados.
O
julgamento foi feito com base nas leis e na Constituição. Os militantes
podem gritar qualquer coisa, mas o grave é a presidente estar ali,
consentir pelo silêncio ou por menções indiretas para serem
interpretadas pelos militantes como concordância. Enquanto exercer o
mandato ela não é apenas a Dilma, ela representa o Poder Executivo.
Dilma
pode sentir solidariedade pelos companheiros. É natural. Mas não pode
aquiescer, por silêncio ou meias palavras, com os que acusam a Justiça
do governo democrático. Ela estar nesse desagravo é um ato com
significado institucional.
A democracia passou por várias rupturas
ao longo da história republicana. É conquista recente e que pertence ao
povo brasileiro. Não pode ser ameaçada por atitudes que solapem a
confiança nas instituições, e por interpretações diante das quais a
presidente se cala e, portanto, consente.
Dilma tentou manter uma
posição ambígua até agora. Mas aquele era um local em que a militância
gritaria as palavras de ordem oficiais do partido. Rui Falcão,
presidente do PT, disse que os mensaleiros “foram condenados sem provas
num processo nitidamente político".
O nada a dizer diante disso,
por parte da presidente, diz muito. O Supremo Tribunal Federal se
debruçou com abundância de tempo sobre as provas, julgou e condenou.
Dilma pode não ter gostado do resultado, pode discordar das penas
pessoalmente, mas enquanto exercer o cargo não existe o “pessoalmente”
em assuntos institucionais. Militantes podem atacar o Supremo. Mas a
presidente da República, não. Sua presença naquele ato é lamentável e
enfraquece a democracia.
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