O que as escolas de samba têm a ensinar sobre trabalhar com entusiasmo e compromisso para qualquer profissional
Desfile do Salgueiro: escolas de samba têm uma organização que favorece o trabalho coletivo
São Paulo - O que as escolas de samba podem
ensinar sobre comprometimento com o trabalho? "Muita coisa", diz
Alfredo Behrens, professor da Fundação Instituto de Administração (FIA),
de São Paulo. Desde o início deste ano, Behrens tem frequentado a
quadra da Mocidade Alegre, bicampeã do Carnaval paulista, para entender as semelhanças e as diferenças entre uma escola de samba e uma empresa.
As visitas do acadêmico aos ensaios fazem parte de um projeto
intitulado No Fear at Work ("Sem medo no trabalho", em português), uma
série de vídeos em parceria com a cineasta Cecilia Delgado, que será
lançada em fevereiro de 2014. "Eu queria descobrir o que levava pessoas
comuns a trabalhar com tanto afinco e engajamento no Carnaval", diz
Behrens.
A grande questão era compreender por que tanta gente se empenha tão
apaixonadamente em uma atividade não remunerada, muitas vezes com vigor
superior ao destinado ao emprego que provê o sustento. Segundo o
professor, nas comunidades carnavalescas sobra o que falta nas
empresas: senso de pertencimento.
"A cultura da competição não funciona tão bem no Brasil. Aqui os profissionais trabalham melhor quando se sentem emocionalmente ligados ao trabalho", diz Behrens. Aprenda o que as escolas de samba têm a ensinar sobre o trabalho comprometido.
As lições das escolas de samba
Escolha baseada em valores
Graças a essa sintonia, os integrantes rapidamente percebem as carências da escola e como podem contribuir para supri-las. Na carreira, ter valores alinhados com o emprego ajuda a formar vínculos com chefes, colegas e equipes.
Recrutamento por afinidades
Uma das grandes lições de gestão das escolas de samba está no
recrutamento. Quando um novato chega, os dirigentes conversam para
entender em que função ele se encaixa melhor. "A falta de experiência
não importa, o que vale é a personalidade e a disposição para aprender",
diz Behrens.
Feito dessa maneira, um recrutamento tem mais chance de dar certo, pois
assegura a existência de uma afnidade entre o profissional e o trabalho
para o qual foi contratado.
Treinamento intensivo
Os veteranos ensinam os novatos. A dedicação para o aprendizado é
enorme, pois existe a consciência de que fazer bem é fundamental para o
sucesso. Na Mocidade Alegre, o treinamento tem duas fases: técnica e
engajamento. Na primeira, os membros decoram o samba-enredo e treinam a
coreografia. Na segunda, a liderança faz com que a comunidade se apaixone pelo tema.
"Temos de sensibilizar todos para a escola se sair bem", diz o carnavalesco Sidney França.
Valorização dos mais experientes
Mesmo com o risco de perder minutos preciosos do desfile, as escolas
fazem questão de manter a velha guarda. "É uma maneira de homenagear
quem se dedicou por tanto tempo", diz Alfredo Behrens, da FIA.
A velha guarda serve para que os mais jovens percebam que serão
prestigiados se dedicarem anos à escola. Os experientes também têm o
papel de inspirar os jovens, pois têm histórias de muitos carnavais para
contar.
Líderes empenhados
Para conseguir o respeito e a admiração da comunidade, os dirigentes
colocam a mão na massa. Em desfiles, é possível ver diretores empurrando
carros alegóricos com defeito. No Carnaval deste ano, líderes da
Mocidade Alegre alinharam fleiras com outros participantes da escola
para fazer escoar a água que alagava a quadra da escola.
Essa proximidade entre a diretoria e a comunidade fortalece o vínculo e
aumenta o engajamento de todos. "Nós precisamos contagiar as pessoas com
o espírito da escola", diz Sidney França, carnavalesco da Mocidade.
Reconhecimento hierárquico
Como não existe remuneração, o reconhecimento ocorre com a oferta de
cargos. Por isso existem tantos gerentes e diretores nas agremiações. "É
um jeito de mostrar que qualquer um, se tiver dedicação, poderá
crescer", diz Behrens.
No dia a dia da empresa, quando existe reconhecimento, os profissionais
tendem a trabalhar com mais afinco, pois se sentem valorizados.
Senso de permanência
Nas escolas de samba, não há o fantasma da demissão. Para um membro ser
expulso, o motivo tem de ser muito grave. Como existe segurança, as
pessoas trabalham com mais calma e dedicação. Pode acontecer trocas de
lugar. "Às vezes é preciso mudar as pessoas de função, seja pela idade,
seja porque elas fcaram acomodadas", diz Sergio Henrique Silva, diretor
de marketing da Mocidade.
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