Exercício da advocacia por portugueses é limitado.
O exercício da advocacia por portugueses no Brasil depende do 
atendimento aos requisitos estabelecidos no Estatuto da OAB, que 
pressupõe, dentre outros requisitos, a aprovação no exame de Ordem. 
Mesmo sendo beneficiários do Estatuto da Igualdade, o advogado 
português, ressalvada a possibilidade de ser consultor de direito 
estrangeiro, não se afasta daquelas exigências que incluem a aprovação 
no exame de Ordem. Sem elas, estar-se-ia exigindo menos de um 
estrangeiro do que de um brasileiro para ser advogado no país.
O estudo da situação jurídica dos estrangeiros no Brasil, durante 
muitos anos, foi feito com enfoque na vulnerabilidade que a sua simples 
presença em território nacional lhe causava. Embora a 
Constituição 
Federal assegurasse a igualdade entre brasileiros e estrangeiros, muito 
se discutia sobre a efetiva possibilidade de o estrangeiro gozar de 
benefícios como a progressão de regime prisional, a transação penal, o 
sursis da pena privativa de liberdade ou a fruição das liberdades 
provisórias. As autoridades preocupavam-se com a garantia da aplicação 
da lei brasileira, uma vez que a falta de vínculo com o Brasil 
possibilitaria ao estrangeiro furtar-se de responder o processo ou de 
cumprir as obrigações assumidas nas medidas despenalizadoras.
Esses assuntos não perderam a importância. Ao lado de outros temas 
corriqueiros como a cooperação jurídica internacional, o cometimento de 
crimes próprios de estrangeiros[1] ou a submissão a sanções 
administrativas que são peculiares a sua condição, como a expulsão e a 
deportação, somaram-se questões relativas ao exercício regular de 
direitos pelos estrangeiros no país que emergiram pela intensificação de
 sua presença no país.
A establização e o crescimento econômico dos últimos anos trouxeram 
para o Brasil um grande número de estrangeiros que pretendem trabalhar 
no país como babás, recepcionaistas, garçons, profissionais liberais ou 
executivos de empresas. Segundo o IBGE[2], norte-americanos, japoneses, 
paraguaios, portugueses e bolivianos constituíram os principais grupos 
que imigraram para o país nos últimos 5 anos. Com esse fluxo de pessoas,
 emergiram problemas jurídicos novos que não eram comuns.
Sejam haitianos que ingressam no país pelo Acre, sejam japoneses que,
 em regra, vêm trabalhar em empresas, há um traço comum que liga todas 
essas pessoas: a necessidade do estrangeiro trabalhar regulamente no 
país. Neste artigo, pretendo abordar o exercício da advocacia por 
estrangeiros, em especial por advogados portugueses, haja vista as 
peculiaridades que o regime constitucional brasileiro dispensa aos 
cidadãos de Portugal.
O exercício da advocacia pelos portugueses no Brasil
Os portugueses, assim como qualquer estrangeiro, são considerados não
 nacionais. Essa definição é dada por exclusão, englobando todos os 
estrangeiros de qualquer nacionalidade ou mesmo os apátridas, que se 
encontram sob as leis brasileiras e é importante porque representa o 
primeiro passo para entender a situação dos estrangeiros no país. A 
partir desse gênero, as leis brasileiras dispensara tratamento jurídico 
diferenciado a uma série de grupos reunidos por características 
próprias: há os estrangeiros que estão no Brasil por motivo transitório,
 como um turista, estudante ou missionário; há os estrangeiros que se 
encontram no país para fugir de perseguições políticas ou para fugir de 
situação de risco ou de maciça violação aos direitos humanos, como são 
os asilados e refugiados; há os estrangeiros que têm a intenção de se 
fixar no território nacional, que são os imigrantes em geral; e há, por 
último, os portugueses, que são estrangeiros em condição especial, aos 
quais é assegurada a igualdade de direitos inerentes ao brasileiro.
Com efeito, são assegurados aos portugueses os direitos inerentes aos
 brasileiros, se houver reciprocidade em favor dos brasileiros em 
Portugal, nos termos do parágrafo 1º do artigo 12 da Constituição da 
República:
“Art. 12. (in omissis)
§ 1º Aos portugueses com residência permanente no País, se houver
 reciprocidade em favor de brasileiros, serão atribuídos os direitos 
inerentes ao brasileiro, salvo os casos previstos nesta Constituição”.
A regra constitucional, claramente, não é autoaplicável. 
Para a fruição da igualdade de direitos é necessária a existência de 
reciprocidade em favor de brasileiros, o que é apurado nos termos do 
Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta firmado entre Brasil e 
Portugal, promulgado pelo Decreto 3.927/2001.
De acordo com o artigo 15 do Tratado, o português que se encontrar no
 Brasil somente pode se beneficiar do Estatuto da Igualdade por decisão 
do ministro da Justiça, após requerimento fundamentado para o gozo de 
direitos civis e políticos. Sem a decisão ministerial, o português, em 
solo pátrio, é um estrangeiro como outro qualquer.
O português que está no Brasil pode ter o mesmo tratamento do cidadão
 boliviano, americano ou paraguaio. Mas pode também fruir, em igualdade 
de condições, os mesmos direitos inerentes ao brasileiro, sem precisar 
se naturalizar, distinguindo-se, assim, dos demais estrangeiros. Há, 
portanto, uma duplicidade de tratamento.
Ao trabalhador português no gozo do Estatuto da Igualdade são 
assegurados não só os direitos humanos, que decorrem da sua dignidade 
como pessoa, mas os mesmos direitos trabalhistas, previdenciários e 
sociais que são extensíveis aos brasileiros.
Mas a situação dos advogados é peculiar em razão das qualificações da
 profissão. No Brasil, o exercício de qualquer trabalho, ofício ou 
profissão é livre, desde que atendidas as qualificações profissionais 
que a lei estabelecer, nos termos do artigo 5º, XIII da Constituição 
Federal. Trata-se de um direito submetido a uma reserva legal 
qualificada, que tolhe do legislador a discricionariedade para 
restringir o direito de forma diferente do que dispõe a fórmula 
“atendida as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.
A liberdade de profissão, portanto, é um direito inerente apenas ao 
brasileiro que preencha as qualificações legais. Não decorre 
simplesmente da condição de brasileiro, não sendo extensível, de per si,
 aos portugueses, que devem obedecer aos mesmos requisitos.
Para ser advogado, o brasileiro deve atender aos requisitos do artigo 8º da Lei 8.906/1993, in verbis:
“Art. 8º Para inscrição como advogado é necessário:
I — capacidade civil;
II — diploma ou certidão de graduação em direito, obtido em instituição de ensino oficialmente autorizada e credenciada;
III — título de eleitor e quitação do serviço militar, se brasileiro;
IV — aprovação em Exame de Ordem;
V — não exercer atividade incompatível com a advocacia;
VI — idoneidade moral;
VII — prestar compromisso perante o conselho”
Para os portugueses, não é diferente. A OAB, a quem compete,
 com exclusividade, interpretar seu estatuto[3]— editou o Provimento 
129/2008 que estabeleceu que os advogados portugueses não estão isentos 
do cumprimento do artigo 8º da Lei 8.906/1993, que inclui, dentre seus 
requisitos, a aprovação no exame de ordem, senão vejamos:
“Art. 1º O advogado de nacionalidade portuguesa, em situação 
regular na Ordem dos Advogados Portugueses, pode inscrever-se no quadro 
da Ordem dos Advogados do Brasil, observados os requisitos do art. 8º da
 Lei nº 8.906, de 1994, com a dispensa das exigências previstas no 
inciso IV e no § 2º, e do art. 20 do Regulamento Geral do Estatuto da 
Advocacia e da OAB.
Art. 2º O disposto no o art. 1º não exclui a possibilidade do 
exercício da atividade do advogado português na qualidade de consultor 
em direito estrangeiro no Brasil, cumpridas as exigências do Provimento 
nº 91/2000-CFOAB”.
Conforme decidiu o Supremo Tribunal Federal, no julgamento 
do Recurso Extraordinário 603.583/RS, o exame de ordem, bem como as 
demais qualificações trazidadas pelo Estatuto da OAB, são a “salvaguarda
 de que as profissões que representam serão limitadas, serão exercidas 
somente por aqueles indivíduos conhecedores da técnica”. Segundo esta 
decisão, as limitações ao direito de liberdade de profissão encontram 
sua justificativa para tão somente “assegurar que as atividades de risco
 sejam desempenhadas por pessoas com conhecimentos técnicos suficientes,
 de modo a evitar danos à coletividade”[4].
Se o brasileiro deve atender a todos esses requisitos para exercer a 
advocacia no país, com mais razão devem obedecê-los os advogados 
portugueses. A Constituição não estendeu aos portugueses mais direitos 
do que estendeu aos brasileiros. Estendeu direitos idênticos, com as 
ressalvas previstas na própria Constituição. Se o brasileiro precisa 
fazer exame de ordem, os portugueses, no gozo do Estatuto da Igualdade, 
também precisarão. É a salvaguarda que a advocacia somente será exercida
 por indivíduos conhecedores do Direito brasileiro.
Aliás, a exigência do exame de Ordem em Portugal, que foi criado em 
2009, foi derrubada, há pouco mais de um ano, pelo Tribunal 
Constitucional daquele país, realçando os requisitos diferenciados para 
se tornar um advogado no Brasil e em Portugal. Sem fazer um juízo de 
valor, a lei brasileiroa, a toda evidência, faz mais exigências para o 
bacharel se inscrever na Ordem como advogado.
Com efeito, ao contrário do Estatuto da OAB, o Estatuto de Portugal, 
em seu artigo 187º, determina apenas que podem requerer a sua inscrição 
como advogados estagiários, os licenciados em Direito por cursos 
universitários nacionais ou estrangeiros oficialmente reconhecidos ou 
equiparados.
O estudante licenciado que acessa o estágio, o chamado advogado 
estagiário, já é considerado advogado pela lei portuguesa. O Estatuto da
 Ordem Portuguesa elenca no seu artigo 181º, n.º 1, alíneas a) à e), as 
restrições ao direito de inscrição passíveis de serem aplicadas e 
regulamentadas pela Ordem, não podendo ser inscritos: os que não possuam
 idoneidade moral para o exercício da profissão, os que não estejam no 
pleno gozo dos direitos civis, os declarados incapazes de administrar as
 suas pessoas e bens por sentença transitada em julgado, os que estejam 
em situação de incompatibilidade ou inibição do exercício da advocacia, 
bem como os magistrados e funcionários que, mediante processo 
disciplinar, hajam sido demitidos, aposentados ou colocados na 
inactividade por falta de idoneidade moral.
São essas as qualificações profissionais exigidas pela lei 
portuguesa, que se afastam daquelas enumeradas pelo artigo 8º do EOAB.
No ano de 2009, chegou-se a criar um exame de conhecimentos prévio à 
inscrição na Ordem dos Advogados Portuguesa, por meio da Deliberação 
3.333-A/2009, que aditou o artigo 9º-A do Regulamento Nacional do 
Estágio da Ordem dos Advogados, criando o exame de ordem português. No 
entanto, o Tribunal Constitucional de Portugal, ao julgar o processo 
561/2010, decidiu que, uma vez “[c]omprovados os demais requisitos e 
atestada a posse do grau de licenciado em Direito, não prevê o Estatuto 
da Ordem, em momento prévio e condicionante da inscrição na referida 
associação pública, qualquer outra prova de conhecimentos científicos, 
que se presumirão adquiridos”.
Deste modo, a imposição da aprovação no exame a que aludia o artigo 
9º-A do Regulamento, que tem natureza de ato administrativo, como 
condição para que o candidato licenciado em Direito possa requerer a sua
 inscrição na Ordem dos Advogados trouxe requisito não previsto em lei, 
inovou indevidamente na ordem jurídica e foi taxado, ao final, como 
inconstitucional pelo acórdão 3/2011 da Suprema Corte Portuguesa.
O exame de ordem em Portugal, após breve período, deixou de ser 
requisito para inscrição do formado em Direito como advogado, cujos 
conhecimentos se presumirão adquiridos. A lei portuguesa permite, 
inclusive, que podem requerer a inscrição na Ordem os licenciados em 
Direito por cursos universitários nacionais ou estrangeiro. Basta que 
sejam oficialmente reconhecidos ou equiparados.
Considerações finais
Diante desse quadro, é equivocado pensar que os portugueses têm 
direitos iguais aos brasileiros apenas por serem portugueses. Enquanto 
não se tornarem beneficiários do Estatuto da Igualdade, por decisão do 
ministro da Justiça, os portugueses são estrangeiros como quaisquer 
outros. A isonomia de tratamento não decorre automaticamente da 
Constituição, que faz a ressalva da reciprocidade de tratamento.
E, mesmo quando beneficiários do Estatuto da Igualdade, os advogados 
portugueses só poderão trabalhar como tal no Brasil, sendo procuradores 
ou consultores de legislação brasileira, quando devidamente inscritos na
 OAB, obedecendo os requisitos que qualquer brasileiro necessita para se
 tornar advogado.
Na verdade, após as decisões do STF na ADI 3.026/DF e no RE 
603.583/RS, que assentaram, respectivamente, que a OAB é um serviço 
público independente, não se submetendo ao controle de qualquer órgão 
público, e que o exame de Ordem é constitucional, o exercício da 
advocacia pelo advogado estrangeiro no Brasil, ressalvada a 
possibilidade de ser consultor de direito estrangeiro, dependerá do 
atendimento a todas as qualificações do Estatuto da OAB. Sem isso, 
pode-se estar diante do exercício irregular da profissão, que é 
tipificado como contraveção penal, a qual é cominada penas de multa e 
prisão. Sem isso, pode-se estar exigindo para um estrangeiro advogar no 
país menos do que se exige de um brasileiro.
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[1] Arts. 338 e 339 do Código Penal e art. 125, XI do Estatuto do Estrangeiro.
[3] No recente julgamento do RE nº 603.583/RS, relatado pelo Min. 
Marco Autério, em 16.10.2011, o Supremo Tribunal Federal deixou claro: 
“a Ordem dos Advogados do Brasil, precisamente em razão das atividades 
que desempenha, não poderia ficar submetida à regulamentação 
presidencial ou a qualquer órgão público, não só quanto ao exame de 
conhecimentos, mas também no tocante à inteira interpretação da 
disciplina da Lei nº 8.906/94”.
[4] A questão do risco à coletividade, como critério que norteia a 
interpretação das restrições do direito fundamental à liberdade de 
ofício, também se fez presente em todos os outros julgamentos do Supremo
 sobre o art. 5º, XIII da Constituição: no RE nº 511.961/SP, Rel. Min. 
Gilmar Mendes, j. 16.06.2009, que tratou da exigência de diploma para 
exercício da profissão de jornalista, e do RE nº 414.426/SC, Relª. Minº 
Ellen Gracie, j. 01.08.2011, que cuidou da exigência do registro dos 
músicos no conselho profissional como condição de exercício da 
profissão.
Ricardo Marques de Almeida
(Procurador federal)