Brent Lewin/Bloomberg
O aplicativo WhatsApp: 900 milhões de usuários
Filipe Serrano, de Revista EXAME
São Paulo - A lista das plataformas online com mais usuários em todo o
mundo é liderada pela rede social Facebook, com 1,5 bilhão, e pelo
serviço de vídeos YouTube, com uma audiência de 1 bilhão de pessoas —
ambos referências na internet há anos. Mas é o terceiro colocado, o
aplicativo de comunicação WhatsApp, que cresce numa velocidade mais elevada.
Depois de aumentar 350% em apenas dois anos e meio, o número de usuários
acabou de chegar a 900 milhões, segundo o ucraniano Jan Koum,
presidente da empresa. Isso significa que a audiência dobrou de tamanho
nos 18 meses desde que o WhatsApp foi comprado pelo Facebook por 22
bilhões de dólares em 2014. No segmento de troca de mensagens, o
aplicativo é líder em 15 dos 33 países analisados pela consultoria
britânica GlobalWebIndex, inclusive no Brasil, onde metade dos usuários
de internet o abre regularmente.
O sucesso do WhatsApp é um pouco surpreendente. O Facebook foi a primeira rede social
a atingir a marca de 100 milhões de usuários. O YouTube seguiu pelo
mesmo caminho no setor de vídeos. Já o WhatsApp é um caso à parte. Antes
dele, houve dezenas de softwares de troca de mensagens. Alguns, como o
BlackBerry Messenger, foram muito populares.
O que pavimentou a ascensão do WhatsApp foi cair nas graças dos usuários
justamente quando os smartphones começaram a se espalhar pelo mundo.
Com o acesso à internet, suas ferramentas, como a troca de textos, fotos
e recados de voz, ganharam em eficiência. Mais recentemente, as
chamadas telefônicas pela internet entraram no menu de opções. E tudo
isso por apenas 1 dólar ao ano.
É toda essa facilidade quase gratuita que não para de atrair usuários — e também de enfurecer parte das operadoras
de telefonia móvel. Elas não têm dúvidas sobre quem é o culpado pela
queda na receita de SMS e de ligações. No Brasil, o WhatsApp é
abertamente criticado.
“Não temos problemas com serviços de dados e mensagens. Nossa
preocupação são as chamadas telefônicas pela internet”, diz Amos Genish,
presidente da Vivo. “Essa ferramenta não é uma inovação. É uma simples pirataria.”
O pano de fundo dessa briga é a revolução em curso no setor de telecomunicações.
A expectativa é que as operadoras deixem de ser empresas de telefonia
para se tornar, em primeiro lugar, provedores de internet móvel. “O
serviço de voz não vai acabar, mas está havendo uma mudança radical no
perfil de uso do celular e na receita das operadoras no mundo inteiro”,
afirma o economista Ari Lopes, analista para a América Latina da
consultoria Ovum, com sede em Londres.
Em um ano, a TIM
perdeu 35% da receita de mensagens de texto. A Claro viu o faturamento
de voz cair 18%. Até a Vivo, única que registrou crescimento na receita
de telefonia móvel, teve queda de 5,5% nos ganhos com ligações — uma
redução de 164 milhões de reais no último ano. Por outro lado, as
operadoras de telefonia móvel estão ganhando cada vez mais com a venda
de planos de dados.
Nos últimos 12 meses, a receita da Vivo com pacotes de internet cresceu 51%. A da Claro,
a que menos aumentou, teve uma expansão de 35%. A expectativa é que o
faturamento das empresas com serviços de dados ultrapasse a receita de
ligações em quatro anos.
Para um número crescente de usuários de celular, ter acesso a mídias
sociais, mapas, músicas e vídeos é mais importante do que fazer ligações
telefônicas. As pessoas estão mesmo falando menos ao celular. A média
de uso por cliente é de 117 minutos por mês. Há exatamente um ano esse
número era 9% maior.
Nesse contexto, o WhatsApp é ora inimigo, ora aliado. Quando compete
diretamente com as chamadas telefônicas via ligações pela internet, é
atacado. Na hora de convencer seus clientes a comprar planos de dados,
as operadoras tratam o WhatsApp como uma atração. A Claro e a TIM
oferecem pacotes que não descontam o tráfego de dados do WhatsApp ou de
redes sociais, como Facebook e Twitter. O objetivo é gerar um estímulo ao serviço de internet.
“Os aplicativos são um motivo para o cliente gastar mais com planos de
dados. O WhatsApp acelerou a demanda do consumidor por smartphones”,
diz Eduardo Tude, diretor da consultoria em telecomunicações Teleco, com
sede em São José dos Campos, no interior paulista.
Amos Genish, presidente da Vivo: “A Anatel tem de regular o WhatsApp como serviço de telecom”
O coro das operadoras
O que une algumas das principais operadoras é a defesa do que chamam de
competição leal. Genish, da Vivo, diz que o WhatsApp precisa ser
regulamentado como um serviço de telecomunicação. Em suas declarações
públicas, Bayard Gontijo, principal executivo da Oi, tem apoiado a
ideia.
Rodrigo Abreu, presidente da TIM, por sua vez, é contra a proposta de
criar uma regulamentação para os serviços online. Para ele, é preciso
reduzir as obrigações e os impostos que atualmente recaem sobre as
empresas de telefonia móvel. “Com ou sem WhatsApp, o usuário vai
deixar de usar voz no celular para usar serviços de dados. Nosso desafio
é participar do crescimento”, diz Abreu.
Procurada, a Claro não quis se pronunciar sobre essa questão. Até agora a
Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) tem dito que não é
necessário regular os serviços de internet nem afrouxar as regras
existentes para as empresas tradicionais. “Se existe uma dificuldade das
operadoras de rentabilizar os negócios com o tráfego de dados, isso é
um problema do modelo de cada empresa.
O desafio delas é buscar novas
fontes de renda”, diz João Rezende, presidente da Anatel.
Nos Estados Unidos, um dos mais avançados mercados de telefonia móvel, a
competição das empresas com os serviços de mensagem online não provoca
grande debate público. Um dos motivos é que os aplicativos não são tão
populares quanto em outros países. Lá o software de mensagens líder é o
Facebook Messenger, que atinge 25% dos usuários de internet — metade da
taxa de uso do WhatsApp no Brasil.
Uma das explicações para a popularidade menor nos Estados Unidos é que
as operadoras americanas já ofereciam SMS ilimitado para os clientes
quando softwares como o WhatsApp surgiram. Na briga com os aplicativos
que oferecem ligações de voz via internet, as operadoras americanas
também têm mostrado uma postura ativa. Desde o ano passado, oferecem o
mesmo serviço com uma qualidade maior para seus usuários da rede 4G — a
mesma estratégia tem sido seguida por empresas da China e da Coreia do
Sul.
Na Europa, o caminho escolhido aponta na direção da regulação. Em maio, a
Comissão Europeia iniciou uma revisão nas regras do setor de
telecomunicações. O objetivo, segundo a comissão, é adotar medidas para
garantir a igual concorrência entre empresas “tradicionais e novas” — em
outras palavras, entre os aplicativos como WhatsApp e as operadoras.
A meta é elaborar um novo modelo até o fim de 2016. Nesse embate entre
operadoras, WhatsApp e reguladores, o mais importante é não matar um
serviço que se provou tão popular. A cada segundo são trocadas cerca de
350 000 mensagens em todo o mundo. É por aí que as coisas estão
caminhando — pelo menos até a próxima revolução.
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