sexta-feira, 17 de maio de 2013

Coutinho : é perigoso depender demais daexportaçao de commodities



Regis Filho/Valor

Por Cristiano Romero | Valor

SÃO PAULO - 
É perigoso depender excessivamente da exportação de commodities. O ciclo de commodities, puxado pelas importações da China e que ajudou o Brasil a crescer de forma mais rápida entre 2004 e 2010, está passando por mudanças.

A advertência foi nesta quinta-feira, em Nova York, por Luciano Coutinho, presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). “Deixem-me adverti-los sobre os perigos de se depender muito pesadamente das commodities”, disse Coutinho, que está sendo homenageado neste momento pela Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos. Ele foi agraciado com o prêmio “Personalidade do Ano”.
“A contribuição positiva das commodities para o crescimento, o investimento e, acima de tudo, a balança comercial foi intensificada pelo comportamento favorável dos preços das exportações nos anos recentes”, disse o presidente do BNDES em seu discurso. “No  entanto, o ciclo das commodities está passando por uma mudança. Portanto, olhando em direção ao futuro, não é recomendável contar com quaisquer bônus decorrente de preços mais altos de commodities.”
Defensor inarredável da revitalização da indústria nacional, Coutinho fez um discurso otimista sobre as perspectivas da economia brasileira nos próximos anos e, particularmente, do setor industrial. Segundo ele, a onda d e investimentos do país em energia, infraestrutura, logística e telecomunicações deve criar “fronteiras dinâmicas”, envolvendo muitas redes de oferta de bens, materiais, partes e componentes, bem como de serviços especializados.
“Se apoiados por políticas firmes, essas oportunidades podem alimentar grupos industriais e de serviços inovadores com potencial para atingir níveis de excelência internacional. Entre elas, oportunidades criadas pela exploração de petróleo em águas profundas, conhecida como camada pré-sal, são um exemplo notável”, observou.
Para Coutinho, outros setores que considera na “fronteira da produção” no Brasil, como o agronegócio, a produção de energias renováveis, o complexo industrial da área de saúde, o segmento de tecnologia da informação e comunicação (TIC), vão ajudar a desenvolver a indústria. Ele acredita que, para chegar lá, será necessário, contudo, repensar e redesenhar a estrutura industrial do país e sua projeção internacional.
O presidente do BNDES defende a conservação do atual base industrial brasileira, mas acha que o país precisa tirar proveito das oportunidades e se posicionar em relação ao reordenamento da indústria internacional. Ele lembrou que, em meio ao atual cenário de crise nas economias avançadas, vários países estão reformulando suas políticas industriais.
Os Estados Unidos, por exemplo, estão recuperando a competitividade com base em custos mais baixos de energia, melhoras na infraestrutura, automação avançada e um “dólar mais depreciado”. Além disso, têm adotado iniciativas “proativas” para acelerar sua liderança científico-tecnológica em projetos avançados de TIC, automação, fontes de energia limpa, transporte e motorização.
A China, por sua vez, disse Coutinho, está procurando alcançar posições de liderança em muitas áreas de alta tecnologia, além de almejar o aumento de sua participação no PIB mundial de 5% para 15% até 2020. Mesmo a Europa, em crise, não pode ser descartada como um ator importante — “Tempos difíceis podem estimular a inovação quando a sobrevivência está em risco”. Nem o Japão, assinalou o presidente do BNDES, deve ser subestimado. “Pelo contrário, a prioridade atual é recuperar a liderança que o Japão teve no passado em muitas indústrias.”
Coutinho acredita que tudo isso revela uma tendência de competição global feroz, algo que diminuirá os espaços disponíveis para países emergentes. Por isso, ele defende uma política ativa de apoio à indústria. “Acredito que o Brasil não deveria abandonar suas legítimas ambições como um ator industrial relevante”, afirmou.
O dirigente do BNDES lembrou, em seu discurso, que o Brasil foi uma das três nações que mais cresceram entre as décadas de 50 e 80 do século passado — 7,7% ao ano, em média. Depois disso, o estagnou, vítima do recurso excessivo ao endividamento externo nos anos 70, que levou à crise da dívida na década seguinte. A crise provocou muitas rodadas de desvalorização da moeda, desorganização das finanças públicas e o enfraquecimento das empresas estatais A consequência foi inflação alta e estagnação, só revertidas pela estabilização promovida pelo Plano Real e, mais adiante, pelo boom ec onômico do período 2004-2010.
Agora, o país volta a ter dificuldade para crescer. A literatura econômica, assinalou Coutinho, ide ntificou fenômeno conhecido como “armadilha da renda média”, segundo o qual, a maioria dos países emergentes enfrenta dificuldades para manter o ritmo rápido de crescimento depois de atingir o nível intermediário de renda per capita — entre US$ 10 mil e US$ 16 mil (pelo conceito da paridade do poder de compra, em dados de 2005).
A partir desse nível de renda, a propensão ao consumo de bens e serviços com maior elasticidade em relação à renda se transforma no motor do crescimento. Em consequência disso, a dinâmica macroeconômica depende mais do consumo que do investimento e da poupança. Como as oportunidades para diversificar as fontes de produção “secam”, uma vez que os setores intensivos em conhecimento requerem investimento de longo prazo em ciência, tecnologia e educação avançada, fica mais difícil obter ganhos de produtividade elevados e sustentáveis. A partir daí, a economia passa a crescer a taxas mais baixas.
Na opinião de Coutinho, muitos analistas acreditam que isso explica o baixo crescimento neste momento da economia brasileira, que teria perdido a vitalidade. A desaceleração da atividade e a inflação estariam causando ceticismo e fortalecendo a ideia de que o país caiu na “armadilha da renda média”.
“Discordo inteiramente”, disse o presidente do BNDES. Segundo ele, as causas do momento atual são claras e refletem, entre outras razões, as medidas adotadas pelo governo para reduzir a inflação em 2011, a crise da zona do euro, a dificuldade de exportação de bens industriais, a queda da produção agrícola e a desalavancagem de pessoas físicas e pequenas empresas. Ele aposta, entretanto, que as mudanças promovidas pelo governo na política econômica, como a redução da taxa de juros, a depreciação do real e adoção de uma série de medidas de estímulo fiscal, vão reanimar o PIB.
“Nenhuma armadilha pode prejudicar o futuro se apenas permanecermos confiantes em nós e para nós mesmos”, disse ele.

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