O recuo do governo federal na proposta de renegociar as dívidas de
Estados e municípios é o mais recente testemunho da confusão que reina
na política econômica.
Indisfarçavelmente moldada para ajudar a cidade de São Paulo --cuja
dívida de R$ 54 bilhões cairia para cerca de R$ 30 bilhões--, a proposta
de corrigir os valores devidos com a aplicação retroativa de taxas de
juros mais baixas deixou de ser viável no atual contexto de erosão da
credibilidade do governo. A prioridade é evitar ainda maior desconfiança
de que o cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal esteja sob
ameaça.
O prefeito Fernando Haddad (PT) contava com a renegociação. Diminuir a
dívida é condição necessária, por lei, para a cidade poder fazer novos
empréstimos. Pelos termos da proposta, haveria espaço para R$ 5 bilhões.
O dinheiro sem dúvida fará falta. A prefeitura prevê desembolsar R$ 25
bilhões em investimentos até 2016: gastos com mobilidade urbana
representam 43% desse montante; moradia absorve 26%.
Diante da realidade orçamentária, o valor é descomunal. Pela proposta da
prefeitura para 2014, o Orçamento será de R$ 50,7 bilhões, 20% maior
que neste ano.
Gastos com a operação de serviços públicos, custeio da máquina e
aposentadorias absorvem pouco mais de dois terços do bolo. Outros 13%
são destinados a juros e amortização da dívida. Considerando ainda
outras vinculações, resta pouco para realizar investimentos em escala
transformadora --em 2013, segundo Haddad, havia cerca de R$ 3 bilhões
para investir.
Por isso, duas das três diretrizes do Conselho da Cidade buscavam
garantir investimentos pela redução das dívidas --a renegociação com a
União e a imposição de limites ao pagamento de precatórios, cujo estoque
atinge R$ 17 bilhões.
A terceira, a busca de fontes de financiamento para os transportes,
levou ao famigerado aumento do IPTU. Descontados os custos políticos,
foi uma solução cômoda. A proposta inicial elevaria a arrecadação de R$
5,5 bilhões para R$ 6,8 bilhões em 2014. A versão aprovada na Câmara
Municipal permitirá aumento R$ 150 milhões menor --a diferença é maior
em relação aos anos seguintes.
Para fins de comparação, o ISS, ora no foco de denúncias de corrupção, arrecada R$ 9,8 bilhões.
De resto, Haddad dificilmente poderá contar com as transferências
federais prometidas em julho, próximas de R$ 8 bilhões. O Planalto
parece ter acordado para a dura realidade das contas públicas.
Endividamento elevado, máquina pública ineficiente e impostos já altos
demais, de um lado, e população que, com razão, demanda melhores
serviços, de outro. A situação de São Paulo é ilustrativa do grande nó
que enfrenta a administração pública brasileira.
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