sábado, 16 de novembro de 2013

Falta de liderança na América Latina é a que mais preocupa

Conjuntura


Pesquisa divulgada nesta sexta-feira junto com a Agenda Global de 2014 do Fórum Econômico Mundial mostra que habitantes da região se mostram os mais preocupados com a forma como suas lideranças conduzem a política

A presidente do Brasil, Dilma Rousseff, e o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro

A presidente do Brasil, Dilma Rousseff, e o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro (Iván Franco/EFE)

A questão da falta de liderança é motivo de preocupação mundial não só pela dificuldade da população de se identificar com seus representantes políticos, mas também porque poucos líderes, atualmente, são reconhecidos por pensarem no bem comum. Pesquisa divulgada juntamente com a agenda de 2014 do Fórum Econômico Mundial mostra que na América Latina e na África Subsaariana a sociedade se mostra mais preocupada com contravenções praticadas por seus representantes no setor público — sejam funcionários de alto ou baixo escalão dos governos — do que em todas as outras regiões do planeta pesquisadas. Numa escala de 0 a 5, sendo 5 o número que classifica maior preocupação com a falta de liderança, os latino-americanos mostraram pontuação de 4,04.

Sadako Ogata, chefe do escritório japonês do Fórum Econômico Mundial, afirma que o principal motivo de insatisfação, sobretudo dos jovens, é a percepção de que os líderes atuais não pensam em nada além de seus próprios interesses. “Nós esperamos que os líderes não defendam apenas seus pontos de vista, mas que sejam conduzidos por algo que nos mova adiante e possa unir as pessoas”, afirma Ogata.

Para ilustrar o tema da falta de liderança no documento que será apresentado em Davos, na Suíça, durante o encontro anual do Fórum, há uma imagem da manifestação de professores em frente à Assembleia Municipal do Rio de Janeiro, em outubro deste ano, quando pediam por mudanças no sistema de ensino e melhores salários. Para Ogata, a educação é ferramenta essencial para mudar a situação de descrença nas lideranças — não apenas porque uma população mais educada tem mais acesso à informação e pode votar de forma mais consciente, mas também porque, por meio da educação, cria-se massa crítica para exigir melhorias e viabilizar mudanças.

Martina Gmür, coordenadora da agenda de 2014 do Fórum Econômico Mundial, falou ao site de VEJA sobre o problema da descrença da população nas lideranças de hoje. Confira trechos da entrevista. 

O estudo do Fórum Econômico Mundial mostra que hoje as pessoas estão fartas dos líderes que só pensam em seus próprios interesses. Mas sempre foi assim, não? 

O estudo mostra uma preocupação crescente com a falta de valores nas lideranças. Especificamente percebemos que os entrevistados da América Latina e da África estão mais preocupados com o abismo que se abriu entre o comportamento e o desempenho da classe política e as expectativas dos que escolhem os líderes, ou seja, da população. Eu concordo em dizer que a quantidade de informação à qual as pessoas têm acesso hoje ajuda a capturar os instantes em que seus líderes mostraram falta de valores. Mas eu também preciso dizer que nosso mundo vivencia um período mais complexo do que antigamente no que diz respeito aos caminhos de liderança.

O que é mais amedrontador no conceito de falta de liderança: o fato de as pessoas estarem insatisfeitas com seus líderes ou o fato de jovens brilhantes não desejarem o mundo da política? 

 Acho que é a insatisfação com a perda de liderança. A falta de jovens brilhantes na política é um problema justamente porque faltam jovens brilhantes em muitas outras áreas. É preciso criar ambientes para que os jovens brilhantes floresçam. Empresas precisam de grandes líderes, assim como a sociedade civil. Sou otimista e acredito que sempre vai haver gente boa atraída pela política. O desafio é criar um ambiente para que eles possam contribuir de forma positiva para a sociedade.

Diante desse cenário de falta de liderança, os jovens agem nas redes sociais para criar outros movimentos. Com isso, a ideia de liderança se torna muito mais difusa. Você acredita que esse conceito de liderança espalhada, sem um líder específico, seja o futuro?  

As multidões têm emergido com muita força nos recentes movimentos sociais mundo afora. Por exemplo, eu não acho que o movimento Occupy (Wall Street) teria ganhado importância se não tivesse essa característica descentralizada. Apesar disso, ainda há espaço para o nascimento de líderes individuais. O Fórum (Econômico Mundial), por exemplo, estimula isso. E como eu fui privilegiada em poder conhecer muitos desses jovens líderes ao longo dos anos, me sinto muito otimista com a nova geração e sua capacidade de liderar e seguir.

A ideologia perdeu espaço no processo de nascimento de um líder. Quais são os efeitos disso?

A ideologia tem papel menos importante na política da Europa Ocidental, mas claramente define a política dos Estados Unidos. Não acredito que essa mudança na questão do peso da ideologia afete o poder que um país exerce no mundo. Mas é inegável que, hoje, o que leva um indivíduo a votar são questões muito mais profundas e complexas do que antigamente, quando se seguia um partido e pronto.

A América Latina tem demonstrado preocupação com a falta de liderança, segundo levantamento do próprio Fórum. A corrupção tem que peso nessa piora da avaliação das lideranças? 

A força da ideia de corrupção está intimamente ligada à perda de valores de liderança. Talvez o fator mais preocupante seja que a corrupção esteja presente em muitos níveis das empresas e dos governos. E isso demonstra necessidade de liderança e transparência em todas as esferas. Afinal, não adianta apenas um líder que esteja no topo dissipar os bons valores. É preciso que todas as esferas participem.

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