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Irene Natividad: "muitas mudanças só acontecem mesmo quando quem está na liderança assume e acredita na causa"
Bárbara Nór, da VOCÊ S/A
Empresárias, líderes de governo e CEOs de mais de 50 países estarão
presentes no encontro, que acontece em São Paulo, nos dias 14 a 16 de
maio de 2015. Confira a nossa conversa com a criadora do evento e
ativista Irene Natividad sobre a presença feminina no mercado de
trabalho e o Summit, que, este ano, leva o tema de “Mulheres Criativas,
Economias Criativas”.
VOCÊ S/A - Por que o Brasil esse ano?
Por que não o Brasil? É a sétima maior economia no mundo. E como esse é
um encontro de negócios que tenta introduzir diferentes mercados para
os executivos, seria estúpido perder a maior economia da América Latina.
É muito importante que saibam quais são as oportunidades aqui e como
acessar esse mercado. É por isso que estamos felizes que o ministro Levy
presidirá a conversa sobre fazer negócios com o Brasil. Nós queremos
que ele nos fale a respeito disso, porque muitas mulheres que vêm ao
encontro estão interessadas nesse mercado. É gigante.
VOCÊ S/A - Por que o tema “Mulheres Criativas, Economia Criativa?”?
O Brasil é criativo em termos de crescer ao mesmo tempo tentando
conservar recursos limitados e as mulheres são essenciais para criar
economias em modelos novos e ainda desconhecidos. Elas não têm muitos
modelos prontos, porque normalmente estão mais à margem, então não estão
presas em uma moldura. O que quero mostrar nesse encontro é a
criatividade das mulheres. Uma delas é a Robin Chase, que criou o Buzz
Car e Zip Car, ela foi pioneira na nova economia, que usa a tecnologia
para agregar pessoas, mercados e produtos e, no processo, maximizar o
uso do que quer que você esteja trocando. E aí vem o lado brasileiro.
Tem essa jovem, a Lorrana Scarpioni, que criou o Bliive. Nele você troca
tempo, não dinheiro, o que acho criativo. E tem uma enorme reserva de
mulheres talentosas e com diploma nos países emergentes ainda
subempregadas – juntas, elas formariam uma economia equivalente à China e
Índia combinadas.
VOCÊ S/A - Tem algum desafio em particular para o Brasil quanto à questão das mulheres?
Todo país enfrenta desafios relativos à questão de como integrar
mulheres em um ambiente de trabalho que foi criado por homens. A cultura
de trabalho não é delas, elas não estão no poder, elas não são a
maioria de CEOs, diretores de conselho ou executivos sêniors no mundo,
mas elas têm que ter um bom desempenho mesmo assim. É por isso que eu
chamo as mulheres de imigrantes no trabalho, porque não é a linguagem
delas, não é a cultura delas, não é o jeito delas de fazer as coisas. E é
uma lógica que ainda não acomoda o fato de que as mulheres ainda são
responsáveis pelo cuidado de famílias numa escala maior que os homens.
VOCÊ S/A - Como podemos melhorar isso?
Um exemplo é a controvérsia recente com Ellen Pao, no Silicon Valley.
Ela processou a empresa em que trabalhava por discriminação sexual. Eram
detalhes sutis, como não ser convidada para certas reuniões ou ser
excluída de discussões. O nome dela está morto no Vale do Silicone,
porque é uma comunidade bem fechada, mas nunca mais essas companhias vão
ignorar esse tipo de problema. Essas são as heroínas. Como Anita Hill
(advogada norte-americana), por exemplo. Foi só depois dela que
aprendemos o que era assédio sexual, e empresas começaram a a falar
sobre como identifica-lo e o que fazer a respeito. Mas muitas mudanças
só acontecem mesmo quando quem está na liderança assume e acredita na
causa. É por isso também que no encontro tenho discussões de CEOs
homens, que vêm de companhias que já fazem um esforço pela diversidade –
quero que eles falem disso e sirvam de modelo.
VOCÊ S/A - Qual seria uma das vantagens em ter mais mulheres na liderança?
Tem um estudo de um economista chinês, ele analisou casos de infrações
de um período de 10 anos e descobriu que as empresas com mais mulheres
nos conselhos tinham menos casos de infração do que as companhias que
tinham maioria masculina. Eles tinham números que mostravam isso. E não é
que as mulheres sejam puras. É só que elas se arriscam menos com o
dinheiro dos outros. Elas também tendem a seguir regras e perguntar mais
questões. Esse é um dos tópicos do nosso encontro, sobre como ter um
negócio mais ético. Corrupção não é exclusividade do Brasil, está no
mundo inteiro, nos países desenvolvidos, nos países emergentes. E
estudos têm mostrado que mulheres acreditam mais em valores como
transparência e responsabilidade.
VOCÊ S/A - Por que elas acreditam mais nisso?
Porque elas são tradicionalmente excluídas. Teve um estudo nos Estados
Unidos sobre igualdade salarial e eles descobriram que a diferença
salarial baseada em gênero era menor em empregos do governo do que no
setor privado. Isso porque os salários, atribuições e requisitos para os
empregos do governo são divulgados, todo mundo pode ver. Tem mais
transparência em quanto você ganha, em como você é avaliado, como você
pode ser promovido. O ponto chave do estudo é que as empresas deveriam
ter descrições muito mais transparentes e do salário dos cargos. Nas
empresas ninguém quer falar em salários, mas isso deveria acontecer.
VOCÊ S/A - A senhora está otimista a respeito da situação das mulheres em geral e no Brasil?
Sim. E não quero me focar no que não temos, mas sim no que temos. Temos
a força de trabalho, temos educação, somos jovens. É melhor falar disso
do que do que não temos. Que a gente use o que temos como argumento
para ter o que ainda falta, como horas flexíveis para que possamos ter
uma família e também trabalhar e melhorar sua companhia. Ninguém faz
nada baseado no que é justo. Nós normalmente pedimos no começo do
encontro que os direitos básicos, que ainda não são cumpridos, sejam
postos em prática, mas depois quero falar do que de fato temos, porque
ainda temos uma cultura tradicionalista que diz o que mulheres podem ou
não fazer.
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