quarta-feira, 20 de maio de 2015

Mulheres criativas, economias criativas



Arquivo pessoal
Irene Natividad
Irene Natividad: "muitas mudanças só acontecem mesmo quando quem está na liderança assume e acredita na causa"
 
Bárbara Nór, da VOCÊ S/A


Empresárias, líderes de governo e CEOs de mais de 50 países estarão presentes no encontro, que acontece em São Paulo, nos dias 14 a 16 de maio de 2015. Confira a nossa conversa com a criadora do evento e ativista Irene Natividad sobre a presença feminina no mercado de trabalho e o Summit, que, este ano, leva o tema de “Mulheres Criativas, Economias Criativas”.

VOCÊ S/A - Por que o Brasil esse ano?
Por que não o Brasil? É a sétima maior economia no mundo. E como esse é um encontro  de negócios que tenta introduzir diferentes mercados para os executivos, seria estúpido perder a maior economia da América Latina. É muito importante que saibam quais são as oportunidades aqui e como acessar esse mercado. É por isso que estamos felizes que o ministro Levy presidirá a conversa sobre fazer negócios com o Brasil. Nós queremos que ele nos fale a respeito disso, porque muitas mulheres que vêm ao encontro estão interessadas nesse mercado. É gigante.

VOCÊ S/A - Por que o tema “Mulheres Criativas, Economia Criativa?”?
O Brasil é criativo em termos de crescer ao mesmo tempo tentando conservar recursos limitados e as mulheres são essenciais para criar economias em modelos novos e ainda desconhecidos. Elas não têm muitos modelos prontos, porque normalmente estão mais à margem, então não estão presas em uma moldura. O que quero mostrar nesse encontro é a criatividade das mulheres. Uma delas é a Robin Chase, que criou o Buzz Car e Zip Car, ela foi pioneira na nova economia, que usa a tecnologia para agregar pessoas, mercados e produtos e, no processo, maximizar o uso do que quer que você esteja trocando. E aí vem o lado brasileiro. Tem essa jovem, a Lorrana Scarpioni, que criou o Bliive. Nele você troca tempo, não dinheiro, o que acho criativo. E tem uma enorme reserva de mulheres talentosas e com diploma nos países emergentes ainda subempregadas – juntas, elas formariam uma economia equivalente à China e Índia combinadas.

VOCÊ S/A - Tem algum desafio em particular para o Brasil quanto à questão das mulheres?
Todo país enfrenta desafios relativos à questão de como integrar mulheres em um ambiente de trabalho que foi criado por homens. A cultura de trabalho não é delas, elas não estão no poder, elas não são a maioria de CEOs, diretores de conselho ou executivos sêniors no mundo, mas elas têm que ter um bom desempenho mesmo assim. É por isso que eu chamo as mulheres de imigrantes no trabalho, porque não é a linguagem delas, não é a cultura delas, não é o jeito delas de fazer as coisas. E é uma lógica que ainda não acomoda o fato de que as mulheres ainda são responsáveis pelo cuidado de famílias numa escala maior que os homens.

VOCÊ S/A - Como podemos melhorar isso?
Um exemplo é a controvérsia recente com Ellen Pao, no Silicon Valley. Ela processou a empresa em que trabalhava por discriminação sexual. Eram detalhes sutis, como não ser convidada para certas reuniões ou ser excluída de discussões. O nome dela está morto no Vale do Silicone, porque é uma comunidade bem fechada, mas nunca mais essas companhias vão ignorar esse tipo de problema. Essas são as heroínas. Como Anita Hill (advogada norte-americana), por exemplo. Foi só depois dela que aprendemos o que era assédio sexual, e empresas começaram a a falar sobre como identifica-lo e o que fazer a respeito. Mas muitas mudanças só acontecem mesmo quando quem está na liderança assume e acredita na causa. É por isso também que no encontro tenho discussões de CEOs homens, que vêm de companhias que já fazem um esforço pela diversidade – quero que eles falem disso e sirvam de modelo.

VOCÊ S/A - Qual seria uma das vantagens em ter mais mulheres na liderança?
Tem um estudo de um economista chinês, ele analisou casos de infrações de um período de 10 anos e descobriu que as empresas com mais mulheres nos conselhos tinham menos casos de infração do que as companhias que tinham maioria masculina. Eles tinham números que mostravam isso. E não é que as mulheres sejam puras. É só que elas se arriscam menos com o dinheiro dos outros. Elas também tendem a seguir regras e perguntar mais questões. Esse é um dos tópicos do nosso encontro, sobre como ter um negócio mais ético. Corrupção não é exclusividade do Brasil, está no mundo inteiro, nos países desenvolvidos, nos países emergentes. E estudos têm mostrado que mulheres acreditam mais em valores como transparência e responsabilidade.

VOCÊ S/A - Por que elas acreditam mais nisso?
Porque elas são tradicionalmente excluídas. Teve um estudo nos Estados Unidos sobre igualdade salarial e eles descobriram que a diferença salarial baseada em gênero era menor em empregos do governo do que no setor privado. Isso porque os salários, atribuições e requisitos para os empregos do governo são divulgados, todo mundo pode ver. Tem mais transparência em quanto você ganha, em como você é avaliado, como você pode ser promovido. O ponto chave do estudo é que as empresas deveriam ter descrições muito mais transparentes e do salário dos cargos. Nas empresas ninguém quer falar em salários, mas isso deveria acontecer.

VOCÊ S/A - A senhora está otimista a respeito da situação das mulheres em geral e no Brasil?
Sim. E não quero me focar no que não temos, mas sim no que temos. Temos a força de trabalho, temos educação, somos jovens. É melhor falar disso do que do que não temos. Que a gente use o que temos como argumento para ter o que ainda falta, como horas flexíveis para que possamos ter uma família e também trabalhar e melhorar sua companhia. Ninguém faz nada baseado no que é justo. Nós normalmente pedimos no começo do encontro que os direitos básicos, que ainda não são cumpridos, sejam postos em prática, mas depois quero falar do que de fato temos, porque ainda temos uma cultura tradicionalista que diz o que mulheres podem ou não fazer.

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