Publicado no Globo
Assistimos aos últimos dias do projeto criminoso no poder. O país
padeceu durante treze anos de uma forma de ação política que associou o
velho coronelismo tupiniquim ao leninismo — e com toques de um
stalinismo tropical, mais suave, porém mais eficaz. Ainda não sabemos —
dada a proximidade histórica — quais os efeitos duradouros deste tipo de
domínio que levou à tomada do aparelho de Estado e de seus braços por
milhares de funcionários-militantes, que transformaram a ação estatal em
correia de transmissão do projeto petista, criminoso em sua ação e
devastador na destruição do patrimônio nacional.
É nesta conjuntura — a mais grave da história do Brasil republicano —
que as nossas instituições vão ser efetivamente testadas. Até o
momento, uma delas, o Supremo Tribunal Federal, ainda não passou no
exame. Muito pelo contrário. Inventou um rito de impeachment que viola a
Constituição. Sim, viola a Constituição. Deu ao Senado o “direito” de
votar se aceita a abertura de processo aprovada pela Câmara, o que
afronta os artigos 51 e 52 da Constituição. E interferiu até na
composição da comissão processante da Câmara. Pior deverá ser a
concessão de foro privilegiado e, mais ainda, do cargo de ministro-chefe
da Casa Civil a Luís Inácio Lula da Silva. Caso isso ocorra — e
saberemos nesta semana — o STF deixará de ser um poder independente e
passará a ser um mero puxadinho do Palácio do Planalto, uma Suprema
Corte ao estilo da antiga URSS.
Ainda na esfera do STF, causa preocupação o seu protagonismo em um
processo estritamente político como é o impeachment. Não cabe à Suprema
Corte decidir o andamento interno e o debate congressual do impeachment.
O STF não pode, em nenhuma hipótese, se transformar no Poder Moderador —
de triste memória, basta recordar os artigos 98-101 da Constituição de
1824. E nem desempenhar o papel que o Exército teve nas crises políticas
desde a proclamação da República até a promulgação da Constituição de
1988. Em outras palavras, o STF não pode ser a carta na mão de
golpistas, que a colocam na mesa quando estão correndo risco de derrota.
Judicializar o impeachment é agravar ainda mais a crise e jogar o país
no caos social e político.
A solução do impasse político é no Parlamento — e com a participação
das ruas. A manifestação de 13 de março — a maior da história do Brasil —
impediu uma saída negociada do projeto criminoso do poder. O sinal das
ruas foi claro: fora Dilma e Lula na cadeia. A estas duas palavras de
ordem, as ruas reforçaram ainda mais a necessidade imperiosa de
continuidade da Lava Jato até o final. O impulso popular levou o PMDB a
mudar radicalmente de posição, basta recordar a dúbia decisão tomada a
12 de março — de independência — e a meteórica reunião de 29 de março,
quando rompeu com o governo.
A participação das ruas na política brasileira inaugurou um novo
momento na nossa história. É incrível o desinteresse da universidade em
estudar o fenômeno representado, entre outros, pelos movimentos Vem pra
Rua e Brasil Livre. Ao invés de enfrentar este desafio interpretativo,
os docentes das instituições públicas organizam atos e manifestos em
defesa de um governo corrupto, antibrasileiro e criminoso. É a apologia
ao crime — e paga com dinheiro público.
A resposta do projeto criminoso de poder foi pífia. Tentou de todas
as formas organizar manifestações para demonstrar que ainda domina as
ruas e tem apoio popular. Fracassou. Mesmo utilizando-se de fartos
recursos públicos, de partidos políticos, centrais sindicais pelegas e
contando com setores da imprensa para inflar o número de participantes.
Pior foram os comícios realizados no Palácio do Planalto. Nunca a sede
do Executivo Federal assistiu aos tristes espetáculos de incitação à
violência, de ameaça à propriedade privada e ao rompimento da ordem
legal. E contando com a conivência de Dilma. Lula, o presidente de fato,
optou por permanecer em uma suíte de hotel, em Brasília, de onde
governa o Brasil, como se a ficção dos clássicos da literatura
latinoamericana — “A festa do bode”, de Mário Vargas Llosa, entre outros
— fosse transformada em realidade.
Neste momento decisivo da vida nacional é necessário evitar cair nas
armadilhas produzidas à exaustão pelo projeto criminoso de poder. Num
dia insinuam que adotarão o Estado de Defesa (artigo 136 da
Constituição), noutro que vão antecipar a eleição presidencial, depois
que contam com um número confortável de deputados para impedir a
abertura do processo de impeachment, ou que o Senado vai rejeitar a
decisão da Câmara. E mais: que a saída de Dilma vai produzir uma grave
crise social. Falácias. É o desespero, pois se avizinha — ainda neste
mês — a derrota acachapante do petismo.
A hora do acerto de contas político está chegando. Manter o respeito à
lei, à ordem e à Constituição é essencial. Lula — que é quem, de fato,
vai ser “impichado” — agirá para desestabilizar o processo democrático,
como se fosse um general abandonando território conquistado. Destruirá o
que for possível destruir. Não deixará pedra sobre pedra — daí a
necessidade da sua prisão, pois solto coloca em risco a ordem pública,
desrespeita as instituições e ameaça o país com uma guerra civil. Quer
transformar a sua derrota em um cataclismo nacional. Não vai conseguir. A
desmoralização da política não pode chegar ao ponto de dar a ele o
direito de decidir que vai incendiar o país. Ele sabe que, desta vez,
como se diz popularmente, a crise não vai acabar em pizza — ou na rota
do frango com polenta, em São Bernardo do Campo. Vai terminar em sushi.
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