quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Um valor que é retornável



a política nacional de resíduos sólidos deu um estímulo extra às empresas que lidam com um desafio cada vez mais presente: encontrar um destino para seus produtos depois do consumo

Por Ricardo Lacerda

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Oportunidade a céu aberto: gerar energia a partir do lixo é uma atividade com alto potencial de retorno – mas é preciso adotar as tecnologias certas

Este não é um filme de ficção. Existe um lugar chamado Ilha das Flores. Deus não existe.” Escrito sobre uma tela preta e com letras garrafais, o prólogo do curta-metragem Ilha das Flores, de Jorge Furtado, dá a tônica do filme-denúncia de 13 minutos, lançado em 1989, e que pode ser facilmente encontrado no YouTube. 
 
Diante de um pedagógico acompanhamento do ciclo de vida de um tomate – desde o plantio até chegar, já podre, a pessoas paupérrimas –, o telespectador se vê diante de uma malfadada cadeia alimentar. Felizmente, aquela realidade está ficando para trás. Mais de duas décadas depois, o Brasil se mostra cada vez mais mais atento ao desafio de dar a correta destinação a resíduos.
 
A mais célebre iniciativa nesse sentido remete a meados de 2010. Trata-se da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), legislação que tem se mostrado uma espécie de divisor de águas no que diz respeito à destinação de detritos não orgânicos no país. 
 
A lei, que estabelece instrumentos de enfrentamento de problemas ambientais, sociais e econômicos decorrentes do manejo inadequado de resíduos sólidos, traz entre suas principais diretrizes a proposta de aumentar os níveis de reciclagem e reutilização de itens passíveis de reaproveitamento. Também define que a responsabilidade pela gestão dos resíduos deve ser compartilhada entre todos – fabricantes, importadores e distribuidores. 
 
A fiscalização, por sua vez, cabe ao ente público, o que envolve uma   divisão de esforços entre União, Estados e municípios. “O tema já vinha sendo tratado há bastante tempo pela legislação. A novidade, que já não é tão novidade assim, está no fato de que se criou uma política nacional para ele”, explica Bibiana Azambuja da Silva, especialista em Direito Ambiental da Veirano Advogados.

Na prática, o que havia no Brasil era um acúmulo de regramentos impostos sem um critério claro – ou, dependendo dos casos, ordenados local ou regionalmente, sem uma unidade nacional. Enquanto determinados segmentos já estavam enquadrados em alguma norma há mais tempo, como os mercados de pneus, as embalagens de agrotóxicos e de pilhas e baterias, outros careciam de normas específicas de destinação no pós-consumo.

João César Rando, presidente do Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias (inpEV), lembra que o setor de agrotóxicos tem uma legislação própria desde o ano 2000. “Já tínhamos, muito antes disso, um projeto piloto de logística reversa que serviu como referencial, pois começamos a trabalhar junto com os legisladores e ajudamos a construir a lei do setor”, destaca. À época, predominava a opinião de que o estabelecimento de regras e obrigações significaria um incômodo para quem tivesse de cumpri-las. 
 
Felizmente, o prognóstico estava errado. “Pensávamos que poderia haver resistência por parte do produtor, mas não. As embalagens já eram um problema e eles queriam uma solução, então aderiram muito rápido”, explica. Hoje, segundo o inpEV, existem no Brasil mais de 5 milhões de propriedades agrícolas incluídas no chamado Sistema Campo Limpo, que registra índice de recolhimento de embalagens de agrotóxicos superior a 90%.

Foram legislações isoladas como essa que ajudaram a dar vida à PNRS. Agora, mais de dois anos depois da promulgação da lei, o país passa por um processo de enquadramento dos atores envolvidos no processo. Além dos planos que devem ser desenvolvidos pelo poder público, alguns setores-chave da economia devem formular suas previsões de gerenciamento de resíduos. 
 
Entre eles, destacam-se a indústria, as atividades da área da saúde, os serviços públicos de saneamento básico, a mineração, a construção civil, os portos e aeroportos e até mesmo os estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços geradores de resíduos danosos ao meio ambiente. 
 
“Os acordos setoriais estão sendo costurados, assim como os regulamentos e os termos de compromisso. Caso algum acordo setorial não seja efetivado, a legislação prevê a exigência da logística reversa por meio de decreto”, explica Bibiana. Ou seja: quem não se adaptar à nova realidade, irá sofrer sanções.

Para Sabetai Calderoni, presidente do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Sustentável (Ibrades), o desafio parece mais complexo do que de fato é. “Não adianta mais o consumidor fazer o descarte. Agora, a própria indústria tem de criar mecanismos econômicos que façam o material voltar sem custo, instituindo uma diferença de preço vantajosa para o consumidor que faz a devolução.
 
” Para isso, Calderoni sugere que seja replicada uma prática há anos conhecida no país: a reutilização do vasilhame de garrafas de cerveja. “A ideia é a mesma para os mais diversos tipos de produto, oferecendo interesse econômico a quem consome, que não é louco de jogar o que tem valor em qualquer lugar. A parte mais sensível do corpo humano ainda é o bolso”, ironiza.

Ora embalagem, ora display
A despeito de leis ou regramentos isolados, cada vez surgem mais companhias engajadas em se adiantar às obrigações da Justiça. Um exemplo disso é a PepsiCo,


fernandovon
Fernando Von Zuben
Diretor de meio ambiente da Tetra Pak




“Em matéria de lixões, ainda estamos na Idade Média. Temos um prazo para acabar com eles. Quem não cumprir vai pagar.”



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