A fama de país festivo, com povo
hospitaleiro e clima agradável, economia (ainda) estável e
futura sede de
eventos esportivos como a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 tem
atraído cada vez mais pessoas de outros países para o Brasil. Porém, entre os
turistas, homens de negócios e interessados em começar uma vida nova, também
chegam aqueles que querem driblar a lei. Assim, acompanhando o aumento no
número de estrangeiros recebidos no Brasil, também cresceu a quantidade de
expulsos por cometerem crimes – e o país caminha para bater o recorde histórico
nos próximos meses.
De janeiro a agosto, o governo federal
determinou a expulsão de 414 estrangeiros. Esse total equivalente a 90% de
todas as expulsões decretadas no ano passado – e o Brasil dificilmente não
registrará uma nova marca até o fim de 2013. No ano passado, as expulsões já
haviam sido recordes: 459 ante 300 ao longo de 2011 e 375, em 2010. O número
mais elevado até então fora o de 2009, com 412 estrangeiros expulsos do país.
“Sempre variamos na casa dos 300 e
tivemos alguns anos de pico como 2009 e 2012. E 2013 também prenuncia que deve
ultrapassar [a marca]", diz o diretor do Departamento de Estrangeiros do
Ministério da Justiça, João Guilherme Granja. Ele ressalva que "enquanto
as expulsões aumentam na casa das centenas, os fluxos de trânsito aumentam aos
milhares". De fato, o Censo de 2010 registrou que 455 333 pessoas
imigraram para o Brasil nos últimos dez anos, ante 279 822 imigrantes em 2000.
Crime –
A expulsão de
estrangeiro do Brasil é prevista em lei de 1980, como punição para quem comete
crimes em território brasileiro. O delito mais comum, segundo a Polícia Federal
(PF), é o tráfico de drogas – embora também haja casos frequentes de
falsificação de documentos.
“Historicamente, a expulsão tem uma
relação muito forte com o tráfico de drogas. O modus operandi do tráfico
internacional torna mais expressiva a presença do estrangeiro”, diz Granja.
“Mas também, evidentemente, o aspecto maior é a intensificação dos fluxos de
trânsito que envolvem o Brasil em geral. Tem um aumento da intensidade de todos
os aspectos da vida social, inclusive os menos desejáveis como os crimes. O
Brasil passou a ser muito mais frequentado, está mais centralizado no fluxo internacional
de pessoas."
Para ser expulso, o estrangeiro tem de
ter sido condenado pelo judiciário, com sentença transitada em julgado. O réu
preso só pode deixar o país depois de cumprir todos os anos da pena – ou quanto
tiver, por exemplo, progressão de regime fechado para semiaberto. Para sair do
país ele precisa receber autorização da Justiça e fica impedido de
retornar.
É o que deve ocorrer com um espanhol
detido em flagrante no Aeroporto Internacional de Salvador (BA) no dia 12. Ele
despachou uma mala recheada com cinco quilos de cocaína. A PF disse que o
espanhol adquiriu a droga no Peru e viajaria para Lisboa, em Portugal, para
depois distribuir a droga em Bruxelas, na Bélgica. No mês anterior, quatro
franceses foram presos na mesma rota, mas com uma quantidade de pó bem
superior: 18,5 quilos de cocaína escondidos no fundo falso de uma mala.
Em julho, catorze estrangeiros foram
presos no mesmo dia no Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP). A maioria
deles era da Nigéria e viajava para Abu Dhabi, nos Emirados Árabes, com cintas
recheadas de cocaína presa ao corpo. A PF também prendeu uma portuguesa, um
boliviano e um sul-africano na mesma operação, além de 40 quilos da droga.
Demora –
O Ministério da
Justiça determinou, nos seis primeiros meses do ano, 331 expulsões. Mas só 139
pessoas de fato deixaram o país nesse período. Na série histórica, a quantidade
de estrangeiros retirados de solo brasileiro nunca chega à metade da quantidade
de decretos expedidos. Encarregada de localizar e transportar o estrangeiro
após determinada a expulsão, a PF diz que a demora ocorre porque é necessário
“aguardar o cumprimento de pena ou a liberação do poder judiciário”.
A expulsão decretada pode se referir a
um inquérito policial e um julgamento de anos atrás. Há casos em que os
condenados saem espontaneamente do país, mas eles são exceção.
Via de regra, a PF transporta de avião
o estrangeiro ao país de origem – só não ocorre quando há fronteira com o
Brasil. E quem paga as passagens são os brasileiros.
Questionada pela reportagem, a Divisão
de Retiradas Compulsórias da PF não revelou quanto gasta por ano com voos
comercias para efetivar as expulsões. Disse apenas que os aviões dão “maior
segurança” ao transporte. Como o órgão fecha contratos com empresas por pacotes
de bilhetes, as passagens aéreas não ficam registradas em nome de quem as usou
nos sistema financeiro do Tesouro Nacional – o que permitiria identificar o
custo das expulsões. Há ainda mais despesas, porque policiais federais também
escoltam os estrangeiros em alguns voos.
Além disso, nem sempre a PF localiza os
estrangeiros a serem retirados do Brasil. No dia 17 de junho, a diretora ajunta
do Departamento de Estrangeiros, Izaura Maria Soares, arquivou o processo de
expulsão do britânico Ally Habarugira – preso em janeiro de 2010 e condenado a
2 anos e 11 meses em regime fechado. Depois de tanto tempo, o britânico, que
segundo o Tribunal Regional Federal veio ao Brasil “unicamente para traficar
cocaína”, já não estava mais no país. Contratado por traficantes do Burundi por
3 000 dólares para levar droga até a África do Sul, ele fora preso com 2 quilos
e 145 gramas de cocaína dentro de um táxi nos arredores do Aeroporto
Internacional de Guarulhos.
Depois de o réu ser condenado, o juiz
comunica a sentença ao Ministério da Justiça. O diretor do Departamento de
Estrangeiros, então, determina a instauração de um inquérito de expulsão pela
PF. Os agentes fazem diligências e verificam se os estrangeiros estão entre os
casos em que não se admite a expulsão: se for casado ou tiver companheiro
brasileiro; ou caso tenha filhos dependentes economicamente dele. Basicamente,
leva-se em conta o interesse público e se um nacional brasileiro pode sofrer
danos com a efetivação da expulsão.
Concluído o inquérito, a PF recomenda
ou não a expulsão ao ministério. O ministro baixa a portaria e a PF faz a
operação para tirá-lo do Brasil. Todos ficam registrados no sistema de
impedidos de reingressar no Brasil.
Transferência –
O Ministério da Justiça
tem evitado a expulsão de estrangeiros e incentivado acordos para que as
pessoas possam cumprir, na terra natal, a pena de um crime cometido no
exterior. A alternativa é a chamada transferência de condenados. Ela precisa
ser firmada por acordo entre os países.
A transferência pode ser solicitada em
casos de condenação a regime aberto ou semiaberto e pressupõe que brasileiros
detidos no exterior sejam enviados, em contrapartida, para cumprir a pena em
território nacional. No caso da transferência, o estrangeiro continua impedido
de voltar ao Brasil. Entretanto, minimiza-se o "risco de marginalização e
de perda de cidadania".
O Brasil firmou o tratado com
Argentina, Bolívia, Canadá, Chile, Espanha, Paraguai, Peru, Portugal, Países
Baixos e Reino Unido. Também assinou a Convenção Interamericana sobre o
Cumprimento de Sentenças Penais no Exterior, ao lado de Arábia Saudita, Belize,
Canadá, Chile, Costa Rica, El salvador, Equador, Estados Unidos, Guatemala,
México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, República Tcheca, Uruguai e Venezuela.
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