Com o surgimento dos livros digitais, as edições impressas pareciam condenadas à morte. Mas, após a explosão inicial, a venda de e-books começa a desacelerar
São Paulo - Em tese, a pequena livraria da americana Keebe Fitch, a
McIntyre’s Books, em Pittsboro, na Carolina do Norte, já deveria ter
fechado as portas. Keebe viu o avanço das grandes redes, como Barnes & Noble, nos anos 90. Testemunhou também a explosão das vendas pela internet, sobretudo o fenômeno varejista Amazon, nos anos 2000.
E, mais recentemente, foi a vez de os e-books
mudarem novamente o mercado livreiro nos Estados Unidos. Mas a loja de
Keebe, herdada de seus pais e há 25 anos no mercado, vai muito bem: a
expectativa é faturar 10% mais em 2013. E a McIntyre’s Books é tudo,
menos um caso isolado.
As vendas das chamadas livrarias alternativas nos Estados Unidos
aumentaram 8% em 2012. O número de lojas também voltou a crescer.
“Oferecemos uma série de serviços que enriquecem a experiência do
cliente na livraria. Caso contrário, ele compraria online”, diz Keebe.
Em seu cardápio estão encontros com escritores e discussões entre
leitores com interesses comuns. O curioso é que, até há pouco tempo, a
morte do livro em papel era dada como certa — e, consequentemente, das
livrarias. Sim, vendem-se menos livros em
papel hoje do que em 2007 nos Estados Unidos, ano do lançamento do
Kindle, o leitor eletrônico da Amazon. O futuro, porém, não parece ser
de uma onipresença eletrônica.
Depois de um início espetacular, o crescimento da venda de e-books
nos Estados Unidos, mercado considerado um laboratório das experiências
digitais, perdeu fôlego. De acordo com a consultoria
PricewaterhouseCoopers, as vendas de e-books devem crescer 36% em 2013,
mas apenas 9% em 2017 — embora sobre uma base obviamente maior.
“Não há mais fôlego para o e-book crescer como antes”, diz o consultor
Mike Shatzkin, um dos maiores especialistas em mercado editorial
digital. Não é que o consumidor vá perder o interesse, pelo contrário.
No mundo, a venda de e-books deverá movimentar 23 bilhões de dólares em
quatro anos. Ainda assim, de cada dez livros vendidos em 2017, apenas
dois serão eletrônicos, segundo as previsões mais respeitadas.
Não faz muito tempo, acreditava-se que a indústria do livro sofreria o
mesmo destino da indústria fonográfica. O surgimento do MP3 abalou o
mercado de CDs e, consequentemente, as grandes lojas de discos. O
mercado de livros, no entanto, tem se comportado de maneira diferente.
Quase metade dos livros é comercializada pela internet nos Estados
Unidos. Mas apenas 23% dos americanos leem livros eletrônicos. Ou seja, a
experiência da leitura digital não acompanhou na mesma velocidade o
hábito de comprar livros pela internet.
Um levantamento do instituto de pesquisas Pew Research com 3 000
leitores mostra que o livro digital leva vantagem frente ao papel em
algumas situações. No caso de viagens, a maioria prefere os e-books.
Quando se trata de leitura para crianças, 80% preferem as edições
físicas.
Essas evidências frustraram quem contava com um futuro 100% digital. A
rede de livrarias americana Barnes & Noble apostou suas fichas no
Nook, leitor eletrônico lançado em 2011. A venda do aparelho e de
títulos digitais, porém, tem sido uma decepção. As sucessivas quedas de
venda custaram o emprego de William Lynch, que até julho presidia a
empresa. Especula-se que a Microsoft esteja negociando a compra do Nook.
A previsão mais aceita atualmente é de que haverá uma convivência entre
e-books e papel. “A participação do livro digital deve alcançar no
máximo 40% do total de vendas”, diz Wayne White, vice-presidente da
canadense Kobo, fabricante de leitores eletrônicos, com 14 milhões de
usuários no mundo.
Hoje, nos Estados Unidos, a fatia dos e-books na receita do setor é de
22% — no Brasil, é de 1,6%. “O livro digital será parte do negócio, não
todo ele”, diz Sergio Herz, dono da Livraria Cultura, na qual os e-books
representam 3,7% das vendas. É provável que não tenhamos de explicar a
nossos netos o que são livros de papel — nem o prazer que temos ao
lê-los.
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