- Desinteresse de investidores privados estrangeiros evidencia falha grave nas licitações
As duas primeiras licitações para concessões de rodovias e os
preparativos para o leilão do campo de Libra, no pré-sal, já permitem
perceber sérias dificuldades no esforço do governo para atrair
investimentos privados para a infraestrutura de transportes e a produção
de petróleo.
O esforço mostra contradições advindas da
indisfarçável ambivalência que vem marcando as convicções,
recém-estreadas, do governo sobre a necessidade de deixar ao setor
privado a responsabilidade pelos investimentos que se fazem necessários
nessas áreas. Embora esteja empenhado em atrair investidores privados, o
governo continua aferrado à extemporânea ideia de que grande parte dos
investimentos requeridos deverá ser financiada pelo Tesouro.
Chama
a atenção o desinteresse de investidores privados estrangeiros. Dos
oito interessados na licitação da BR-050, o único estrangeiro era um
grupo que já vem atuando no País há algum tempo. No caso do leilão de
Libra, das dez empresas estrangeiras que manifestaram interesse em
participar, seis são estatais, três das quais, chinesas. Tanto num caso
como noutro, o desinteresse de investidores privados estrangeiros
evidencia falha grave na concepção das regras que pautam as licitações.
Em
vez de criar condições adequadas para atrair investimento estrangeiro
efetivo para o setor de infraestrutura, o governo insiste em mais do
mesmo: um arranjo em que o próprio Tesouro deverá financiar — a juros
subsidiados, com recursos advindos de emissão de dívida pública e
repassados ao BNDES — 70% do programa de investimento que será exigido
das empresas que ganharem as concessões de rodovias.
Trata-se de
aposta tardia e melancólica na sobrevida do desgastado modelo adotado,
ainda no governo Lula, nas licitações das usinas hidrelétricas do Sul da
Amazônia. Sem poder contar com licitações bem concebidas e um ambiente
de investimento que engendre tarifas módicas de forma natural, o governo
tenta mais uma vez assegurar modicidade tarifária na marra, despejando
sobre as concessões todo o dinheiro público que se fizer necessário. E,
como bem ilustra o fiasco da licitação da BR-262, constata agora que,
mesmo assim, pode não conseguir atrair investidores.
Já no caso do
leilão de Libra, o que se noticia é que a Petrobras não se contentaria
com a participação mínima de 30% que lhe será exigida, sob qualquer
circunstância, por força da esdrúxula legislação que regula a exploração
do pré-sal. E que, nesse caso, tendo em conta a fragilidade financeira
da empresa, o Tesouro lhe garantiria os recursos necessários para fazer
face aos encargos adicionais de investimento que a ampliação de
participação viesse a exigir.
A isso chegamos. Há poucos dias, o
governo, a duras penas, conseguiu evitar, por um voto, que fosse
derrubado o veto da presidente Dilma ao fim da multa de 10% do saldo
FGTS, no caso de demissões sem justa causa. E, para isso, teve de chorar
lágrimas de esguicho sobre o impacto catastrófico que a perda da
receita proveniente da cobrança da multa teria sobre programas de gastos
sociais em curso. Descobre-se agora que, no mesmo orçamento em que os
recursos para gastos sociais são tão escassos, parece haver folga de
sobra para que o Tesouro banque extravagâncias dessa ordem no leilão do
pré-sal.
Continua faltando ao Planalto percepção mais clara da
seriedade da restrição fiscal com que se debate a economia brasileira.
Os três níveis de governo extraem da economia 37% do PIB em tributos,
mal conseguem investir 3% do PIB, continuam com gastos correntes
crescendo bem mais rápido que o PIB e com endividamento em ascensão, já
da ordem de 60% do PIB. Nesse quadro, salta aos olhos que a insistência
numa estratégia de crescimento econômico que atribui ao Tesouro o ônus
de financiar grande parte do investimento privado está fadada ao
insucesso. O mesmo insucesso que terá quem tentar se suspender no ar
pelos cordões dos próprios sapatos.
Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC-Rio
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