Juiz concluiu que há uma série de indícios de fraudes na Secretaria de Transportes; negócio deve render quase 10 bilhões de reais aos empresários do setor
Hugo Marques, de Brasília
A Justiça de Brasília suspendeu licitação bilionária conduzida pelo governo petista Agnelo Queiroz
(Elisa Fiuza/AGENCIA BRASIL/Divulgacao )
A Justiça de Brasília suspendeu uma licitação bilionária para
substituir as empresas de ônibus que controlam todo o transporte do
Distrito Federal (DF), conduzida pelo governo petista Agnelo Queiroz. O
juiz de direito da Primeira Vara da Fazenda Pública do DF, Mário
Henrique Silveira de Almeida, mandou suspender, em decisão liminar, o
contrato administrativo da Bacia 1, cuja vencedora foi a Viação
Piracicabana, e o contrato administrativo da Bacia 4, que beneficiou a
Viação Marechal. As ações serviam para favorecer o fundador da companhia
aérea Gol e dono de grupo de transportes coletivos, Nenê Constantino. A
sentença foi proferida nessa quinta-feira, 26.
O juiz concluiu que há uma série de indícios de fraudes na licitação
conduzida pela Secretaria de Transportes do DF. Ao todo, foram licitadas
cinco bacias, com a previsão de troca de toda a frota de ônibus. O
negócio deve render aos empresários do setor quase 10 bilhões de reais
em dez anos.
O juiz proferiu sua decisão em grande parte com base na participação
do escritório dos advogados Guilherme Gonçalves e Sacha Reck na
licitação. A atividade de consultoria do escritório na licitação, diz o
juiz, “ultrapassou a função de mera consultoria, atuando como efetivos
julgadores dos atos relacionados ao processo licitatório”. O juiz
concluiu que o advogado Sacha Reck participou na elaboração da ata de
apresentação dos envelopes, “o que é bastante estranho”, diz o
magistrado, “tendo em vista que a realização dos atos de registro e
averbação são competência exclusiva da Comissão de Licitação”.
Na decisão, o magistrado registrou que membros da Comissão de
Licitação sentiam-se constrangidos com a atuação de Sacha Reck, já que
tal escritório definia previamente o conteúdo das decisões
administrativas da Comissão. O magistrado aponta a semelhança das
fraudes cometidas na licitação do DF com a licitação do transporte no
Paraná, que descrevem roteiros parecidos de irregularidades. Sacha Reck
atuou em ambas as licitações.
Em Brasília, o advogado ajudou a redigir mais de cem editais, atas e
pareceres da licitação. Muitos desses documentos não foram lidos pelos
próprios membros da Comissão de Licitação, a quem caberia redigir, ler e
analisar os atos administrativos.
A fraude era tão evidente que alguns membros da Comissão de Licitação
escreviam nos documentos enviados por Sacha Heck, e incorporados no
processo da licitação: “Parecer não lido, apenas vistado por exigência
do Secretário de Transportes”. O juiz aponta ainda que Sacha já
trabalhou para duas empresas ligadas à licitação, o que seria
"suficiente a impossibilitar a realização do parecer do mencionado
escritório".
O secretário de Transportes do DF, José Walter Vazquez Filho, é
citado em outro trecho da sentença. O juiz lembra que em seu depoimento
na Câmara Distrital, Vazquez Filho afirmou que a contratação do advogado
Sacha Reck foi feita por intermédio do Banco Interamericano de
Desenvolvimento, o BID. Mas o próprio BID informou à deputada distrital
Celina Leão que não possui relação nem indicou o escritório Sacha Reck
para participação no contrato de licitação dos transportes no DF. “Essa
licitação foi toda fraudulenta. A cidade inteira espera ônibus novos,
mas a licitação não pode lesar o erário”, diz a deputada Celina.
A decisão da Justiça deverá complicar a
situação do presidente da Comissão de Licitação, Galeno Furtado Monte.
Ex-sócio do delator Durval Barbosa, Galeno nunca conseguiu a cópia do
contrato do escritório Sacha Reck com o governo de Agnelo Queiroz, mas
mesmo assim conduziu os trabalhos até o fim.
Galeno já comentou com várias pessoas em Brasília que, ao final da
licitação é que teve consciência de que todo o processo era fraudulento,
para beneficiar as empresas do Grupo Constantino, e que todos os
documentos enviados por Sacha Reck eram no sentido de direcionar a
licitação a manter preços mais altos de tarifas, para beneficiar os
grupos econômicos pré-selecionados. Galeno certa vez tentou suspender a
licitação, mas recebeu ordem direta do Palácio do Buriti para encerrar o
processo, mesmo com todas as fraudes envolvidas no que deveria ser uma
concorrência pública.
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