Publicado no Estadão deste sábado
Com a decisão de duplicar com recursos públicos parte das rodovias
cujas operações e obras de manutenção e melhoria serão transferidas para
empresas privadas em leilões de concessão que começam daqui a duas
semanas, o governo Dilma mostra, mais uma vez, que ainda não conseguiu
definir um modelo adequado para a participação do setor privado na
infraestrutura de transportes. Mais de um ano depois de anunciado pela
presidente Dilma Rousseff, o Programa de Investimentos em Logística, que
previa a transferência de 7,5 mil quilômetros de rodovias federais
(número revisto para 7 mil km) e de 10 mil km de ferrovias para o setor
privado, ainda não saiu do papel.
Se o cronograma inicial tivesse sido cumprido, os nove lotes
rodoviários que compõem o programa já teriam sido leiloados. O primeiro
leilão de rodovias chegou a ser marcado para o início do ano, mas as
condições definidas pelo governo não atraíram investidores privados.
Diante do risco real de que não haveria interessados, o empreendimento
foi cancelado. Só no próximo dia 18 será realizado o primeiro leilão,
para a concessão da BR-050, que liga os Estados de Goiás e Minas Gerais,
e da BR-262, entre o Espírito Santo e Minas Gerais. O segundo leilão,
da BR-101, na Bahia, está programado para 23 de outubro. Mas as regras
continuam sendo alteradas, porque o governo não tem conseguido
compatibilizar seus próprios interesses com os dos investidores e dos
usuários.
Como noticiou o Estado (1/9), depois de constatar que os
investimentos exigidos dos consórcios vencedores de três dos nove lotes a
serem leiloados exigiriam pedágios bem mais altos do que o máximo que
havia sido definido, o governo decidiu duplicar esses trechos com
dinheiro do Tesouro Nacional. Serão duplicados pelo governo 221 km da
BR-101 (BA), 180,5 km da BR- 262 (ES) e 281,1 km da BR-163 (MT).
O governo do PT demorou vários anos para, afinal, se dar conta de que
os investimentos em infraestrutura de transporte, necessários para
evitar crises e assegurar o crescimento do país, ultrapassam a
capacidade do setor público. Admitiu, com relutância, a entrada do
capital privado no setor, mas vem tentando impor aos investidores
condições que não asseguram a remuneração do investimento no prazo
concedido. Para evitar o fracasso dos leilões, vem modificando as regras
com frequência ─ e nem sempre tem tido êxito, pois as mudanças geram
insegurança e incerteza entre os investidores. O resultado é o atraso na
execução de seu programa de logística.
O primeiro leilão tinha sido marcado para 30 de janeiro, mas, por
causa da falta de interessados, o governo o suspendeu. Em fevereiro,
foram anunciadas regras mais favoráveis para os investidores, como a
possibilidade de obtenção de financiamentos oficiais a juros mais
baixos, a revisão do aumento do tráfego nas rodovias a serem leiloadas e
mudanças não muito claras na taxa de retorno do investimento.
Esperava-se que o leilão fosse, afinal, realizado em maio, mas as
mudanças anunciadas em fevereiro não foram suficientes para atrair
investidores. Só então, o governo anunciou de maneira clara que a taxa
interna de retorno do investimento para os leilões de rodovias passaria
de 5,5% para 7,2% – como está definido nos editais para os dois leilões
que já têm data definida.
Mas as pressões para mudanças nas regras continuam fortes.
Ironicamente, no momento, elas estão concentradas num ponto que o
governo do PT considerava básico em seu programa de concessões, a
chamada modicidade tarifária, isto é, a cobrança de tarifas baixas pelos
serviços prestados. No caso das concessões rodoviárias, o governo
federal insinuava que seu programa era muito melhor do que o do governo
do Estado de São Paulo, ao qual acusava de impor pedágios caros aos
usuários. Para evitar o aumento nos pedágios das rodovias federais a
serem concedidas, o governo usará dinheiro público para aliviar os ônus
do investidor privado, mas, ainda assim, em alguns postos de pedágio, os
usuários desembolsarão até R$ 12. Não é uma tarifa módica.
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