José Pastore
Por 315 votos a favor, 95 contrários e 1 abstenção, a
Câmara dos Deputados aprovou em 3 de julho de 2013 o Projeto de Lei
Complementar (PLP) nº 200, que extingue o adicional de 10% da
indenização de dispensa do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
A razão foi simples. Trata-se de um adicional instituído para pagar um
déficit na conta do FGTS que, em fevereiro de 2012, foi integralmente
pago.
A aprovação do referido adicional decorreu de uma longa negociação
entre governo, empresários e trabalhadores no ano de 2001. Na época, o
governo anunciou que o Brasil havia realizado "o maior acordo do mundo".
De fato, o valor envolvido para cobrir o déficit era de R$ 42 bilhões!
Para dar vida ao acordo, a Lei Complementar nº 110/2001 acrescentou 0,5%
na alíquota mensal do FGTS, passando de dispensa sem justa causa, que
saltou de 40% para 50%.
Apesar da grande vantagem de votos, o PLP 200 foi vetado pela
presidente Dilma sob a alegação de que os cerca de R$ 3 bilhões anuais
decorrentes do referido adicional farão falta ao Programa Minha Casa,
Minha Vida.
Não há dúvida de que a presidente Dilma se equivocou na sua
justificativa. Aqueles recursos nunca fizeram parte do Orçamento da
União. Por mais nobres que sejam os seus propósitos do programa
habitacional, os 10% do FGTS não foram criados para aquele fim. Não há
como destinar tais recursos a qualquer finalidade que não seja a conta
geral do FGTS.
O veto da presidente Dilma trouxe à tona uma desagradável notícia.
Ficou-se sabendo de que os referidos recursos já vinham sendo usados
para o fim almejado, o que levou Everardo Maciel a tratar esse
expediente como um grave "desvio ético do Estado brasileiro" (Estadão,
5/9). Custa acreditar que isso seja feito por um governo que se elegeu e
reelegeu com o decidido apoio dos trabalhadores. Sim, porque os
recursos do FGTS são sagrados e pertencem exclusivamente a eles.
Estamos diante de uma situação muito clara. A Lei Complementar
110/2001 cumpriu o seu papel: o déficit do FGTS foi coberto. O PLP 200
também cumpriu o seu papel: extinguiu o adicional. Ou seja,os
parlamentares agiram corretamente. O que não se justifica é a gula do
governo em querer abocanhar recursos que não lhe pertencem. Se a ideia é
reforçar o Minha Casa, Minha Vida, que seja enviado ao Congresso
Nacional um projeto de lei específico para criar os necessários
recursos. Tampouco é aceitável o malicioso argumento segundo o qual tais
recursos irão para as contas individuais dos trabalhadores. Isso é
falso. Os 10% se destinaram a cobrir um rombo existente na conta geral
do FGTS. Nunca foram para as contas individuais. Nem podem ir. Os que
assim alardeiam visam a buscar uma legitimação para o ilícito que
pretendem praticar e, ao mesmo tempo, embaraçar os parlamentares perante
trabalhadores mal informados que acreditam na possibilidade de
engordarem suas contas individuais do FGTS.
Essas manobras chocam muito porque, para o bom relacionamento entre
empregados, empregadores e governo, a boa-fé é indispensável. O veto
jogou por terra a palavra empenhada pelo Poder Executivo. Se tal
desrespeito ocorre em relação ao maior acordo do mundo, o que dirá nos
demais acordos? O veto não pode subsistir, sob pena de se desmoralizar o
processo de negociação. A demais, ele vai na contra mão da própria
política do governo, que vem patrocinando a desoneração da folha de
salários. Os 10% adicionais do FGTS representam para as empresas uma
pesadíssima sobrecarga nas despesas de contratação e descontratação,
comprometendo ainda mais a baixa competitividade da economia brasileira. Com eles, há um aumento de 25% da indenização de dispensa, fixada na Constituição federal em 40%.
Em suma, não há razões técnicas, morais e econômicas que possam sustentar esse veto. Só resta revogá-lo.
É PROFESSOR DE RELAÇÕES DO TRABALHO DA FEA-USP E MEMBRO DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS
Publicado em 10/09/2013 no O Estado de S. Paulo.
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