Ueslei Marcelino/Reuters
Eduardo Cunha: ainda valioso pelo cargo que ocupa, deputado está isolado
e pode sofrer cassação do mandato pelo Conselho de Ética se não
articular a permanência
São Paulo – A abertura da semana no Congresso amanhã (20) gera grande expectativa no mundo político. Espera-se que nesta terça-feira, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB), decida se acata ou não o principal pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff.
O pedido que tinha tramitação quase garantida, depois de acertado um
rito para aceitação da petição, agora tem destino incerto. Além de a formalidade ser considerada ilegal pelo STF, marcou o noticiário da semana passada — para espanto geral da nação — o fato do presidente da Câmara estar articulando uma reaproximação com a presidente Dilma, com quem está rompido desde julho.
Para entender suas motivações em se aproximar da presidente, EXAME.com
consultou analistas que avaliam seus próximos passos. E a conclusão é
que essa é uma das últimas saídas para que Cunha se livre de um processo
de cassação.
A vida do presidente da Câmara não anda fácil. Conforme o Ministério Público revela novas denúncias sobre a posse de contas bancárias do deputado na Suíça, delatores da Operação Lava Jato citam seu nome como um dos cabeças no pagamento de propina por contratos da Petrobras.
Lula: em nota divulgada pelo Instituto Lula, o ex-presidente rechaça a possibilidade de acordo com Cunha
As acusações foram suficientes para que fosse protocolado nesta semana pelo PSOL e Rede Sustentabilidade
um pedido de cassação de seu mandato, afirmando que Cunha não pode mais
ocupar a presidência por falta de legitimidade. O pedido resultou em um
processo no Conselho de Ética e Decoro da Câmara. Em até 90 dias úteis, o plenário da casa pode decidir por sua deposição e retirada de mandato.
Mesmo com o desgaste causado pela investigação, Cunha ainda interessa à
oposição por ser o único homem com “coragem política” para deflagrar um
processo de impeachment. Dilma, por sua vez, precisa de Cunha para frear
o impedimento, além de ampliar sua articulação no Congresso para
aprovar medidas.
"Cunha está hipervalorizado porque os projetos de poder não podem
prescindir dele. Agora se houvesse um compromisso público, tanto da
oposição, como da situação, eles tentariam inviabilizar Eduardo Cunha no
Congresso, não é?", diz Marco Antonio Teixeira, professor do
departamento de Gestão Pública da FGV de São Paulo. "Ambos passam por
cima de qualquer bom senso político que, nesse momento, recomendaria que
se evitasse Eduardo Cunha e tentasse acelerar o processo que aprecia
sua conduta e as denúncias que pesam sobre ele."
Para Thiago Vidal, coordenador do Núcleo de Análise Política da
Prospectiva Consultoria, fato fundamental para que o governo se
reaproxime é o desgaste sofrido com derrotas em plenário nos últimos
meses, muitas delas articuladas pelo próprio Cunha. Garantir que o
impeachment não seja pautado por algum tempo, já é um bom alívio.
José Carlos Araújo a EXAME.com: "Próximo da base ou não, não fará
diferença. O Conselho não tem nada a ver com tudo isso que está aí"
É certo que Cunha pode ajudar Dilma a ter um respiro. Mas recorrer à presidente é o caminho para livrar Cunha?
“Num primeiro estágio, governo e Eduardo Cunha conseguem respirar. Mas o
Cunha terá que se explicar no Conselho de Ética, isso é inevitável”,
afirma Vidal. “Ele pode recorrer ao governo porque o conselho é
presidido pelo PSD,
que é da base aliada. Mesmo que haja endurecimento, quem decide é o
plenário. E o governo ainda tem um número grande de cadeiras na Câmara
que podem barrar a cassação do mandato.”
O presidente do Conselho, deputado José Carlos Araújo negou que dará tratamento diferenciado a Cunha. Em declaração à Folha de S. Paulo, ele disse que não dará “vida fácil” ao presidente da casa — tudo antes da reaproximação de Cunha com a base aliada.
Procurado pela reportagem de EXAME.com ele reforçou a
posição. “Próximo da base ou não, não fará diferença. O Conselho não tem
nada a ver com tudo isso que está aí”, disse.
Dilma e o próprio PT também já fizeram questão de rechaçar a possibilidade de acordo. Tanto o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva,
quanto o presidente do partido, Rui Falcão, foram a público para negar
articulação ou interferência no Conselho de Ética da Câmara.
Dilma Rousseff: em viagem à Suécia, a presidente deu declaração sobre
denúncias contra Cunha. "Lamento que seja com um brasileiro", disse.
“O governo jamais vai apoiá-lo publicamente. São muitas investigações e
denúncias contra Cunha, pegaria mal demais. Dependendo das condenações, é
capaz que fique impossível apoiar até nos bastidores”, diz Vidal, da
Prospectiva. “O grande vencedor dessa história hoje é o governo, pois à
medida que a opinião pública começar a cair em cima do deputado e a
presidente Dilma percebe que ele não tem legitimidade para impedi-la,
ela também vai se esquivar. Não teria como o público ou o político ter
simpatia por quem é réu do crime que é visto como o problema maior, que é
a corrupção.”
Para os analistas, ainda há uma hesitação no Congresso com relação à
figura de Cunha porque o deputado ainda preside a Câmara e é peça chave
no jogo político.
O apoio à sua cassação, que hoje está em cerca de 50 deputados (10% da
Câmara), ainda não é suficiente para um processo de cassação. Mas, caso
as denúncias forem se tornando em acusações formais, sua figura pode
perder força e o movimento de deposição tende a aumentar.
“O Cunha é uma figura que, para onde for, pode fazer o serviço, mas o
custo político em termos de opinião pública vai ser muito negativo”,
afirma Teixeira, da FGV. “Até pouco tempo atrás, quando não estouravam
denúncias contra, ele era bem visto por quem queria tirar o governo. Ele
perdeu esse grupo. Mas os grupos de apoio à Dilma também agem de forma
bastante pragmática. Há poder, mas também um isolamento.”
Oposição: nota do grupo pedindo o afastamento de Cunha foi um dos
estopins para uma possível aproximação do presidente da Câmara com Dilma
“Houve uma situação muito semelhante num passado recente que foi o caso
do deputado André Vargas. Ele era vice-presidente da Câmara, uma figura
bastante influente lá dentro, mas na hora que tiveram que cassá-lo, para
não prejudicar a imagem da instituição, cassaram”, diz Vidal. “Isso
pesa muito lá dentro.”
Para os analistas, um processo de impeachment só começa amanhã se Cunha
estiver disposto a dar uma última cartada em busca de apoio público e
aberto mão de necessariamente se manter no cargo — deixando de lado
também o foro privilegiado no julgamento da Lava Jato. Caso ele opte
pela renúncia à presidência, seu papel como parlamentar comum seria
ainda mais fácil de derrubar.
Procurada, a assessoria do deputado Eduardo Cunha não deu resposta aos
pedidos de declaração da reportagem sobre o acordo ou as denúncias que
pesam sobre ele.
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