segunda-feira, 6 de maio de 2013

Política Nacional de Resíduos Sólidos: implementação, desafios e oportunidades



– José Valverde Machado Filho

No Brasil, em 2009 foram geradas cerca de 182 mil toneladas diárias de resíduos sólidos, apenas considerada a população urbana. Isto significa uma média de 1.152 quilos de resíduos por habitante das cidades. Destes totais, apenas cerca de 161 mil toneladas diárias de resíduos (1.015 quilos diários por habitante) são coletados de alguma forma. Isto significa que em todo o Brasil algo em torno de 20 mil toneladas diárias de resíduos sólidos simplesmente ficam “por aí”, afetando diretamente o meio ambiente e a saúde das populações diretamente afetadas.

Ao se considerar o processo de crescimento da economia brasileira dos últimos anos – o qual deve continuar adiante – pode-se especular que haverá um aumento proporcional nestes números, tanto na geração de resíduos sólidos, como na sua coleta e principalmente na não-coleta.

Destinação dos resíduos em São Paulo

Deste total de resíduos gerados, 56,8% vão para aterros sanitários, 23,9% para “aterros controlados” e 19% diretamente para lixões. No geral, isto significa que estamos simplesmente “enterrando dinheiro”, no sentido de que parte significativa destes resíduos poderia ser reciclada e voltar para a cadeia produtiva.

O problema tende a piorar em todo o mundo, já que até 2050 estima-se que serão gerados mundialmente 13 bilhões de resíduos urbanos, sendo que atualmente apenas 25% dos resíduos são recuperados de maneira apropriada. É fundamentalmente, portanto, um processo de “esverdeamento” da economia, no sentido de dar valor econômico tangível ao tratamento de resíduos de forma a se fazer os investimentos necessários para a sua coleta e tratamento adequados.

No Brasil as coisas avançam, ainda que lentamente. A Lei Nacional de Resíduos Sólidos levou 21 anos para ser aprovada, especialmente por desacordos sobre o aspecto econômica da sua implantação, com as empresas e o governo se digladiando para ver como seria o pagamento desta conta. Por muito tempo se apostou em uma estratégia do “deixa como está para ver como fica.”

Mas agora, o marco regulatório existe e veio para ficar, com a aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos e sua regulamentação. Em junho próximo deverá ser divulgado o Plano Nacional de Resíduos Sólidos.

Alguns elementos significativos da nova legislação:
  • Diferenciação entre “resíduo” e “rejeito” – o primeiro tem valor e é possível de ser reciclado e voltar para a cadeia produtiva. Para o segundo não existe ainda tecnologia para reaproveitamento e, portanto, tem de ser tratado de forma adequada. Os resíduos sólidos não poderão ir diretamente para os aterros sanitários, o que representará um enorme desafio para fortalecer a cadeia de coleta, reaproveitamento e destinação. Mesmo para uma cidade como São Paulo, que não tem aterros sanitários, isto é um desafio na medida em que na cidade há somente 20 cooperativas de catadoras conveniadas com a Prefeitura.
  • Destinação final é diferente de disposição final.
  • Será necessária uma gestão integrada dos resíduos.
  • O ciclo de vida dos produtos entra definitivamente na agenda e vai requerer especial atenção.
A coleta seletiva é um grande gargalo da implantação da Lei. Em 2000 apenas 451 municípios brasileiros contavam com algum tipo de coleta seletiva formal. Em 2008 a situação melhorou, mas pouco: há coleta em 994 dos 5.565 municípios brasileiros.
Elementos da gestão e gerenciamento de resíduos sólidos

A participação de catadores formalizados é essencial para sucesso da política nacional de resíduos sólidos. No contexto da nova legislação, o sistema de coleta de resíduos sólidos e logística reversa prioriza a participação de cooperativas e de outras formas de associações de catadores. No Brasil mais de um milhão de pessoas vivem desta atividade. Os catadores serão fundamentais na implantação da logística reversa, no trato diário e na segregação de resíduos, na geração de oportunidades de negócios, e de inclusão social.

Mas é preciso capacitar as cooperativas, fortalecer os modelos de gestão. Ou seja, é um grande desafio.
A logística reversa veio para ficar. Alguns setores já são obrigados a implementá-la independente do serviço de coleta pública: Agrotóxicos, pilhas e baterias, pneus, lâmpadas fluorescentes, óleos lubrificantes, produtos eletroeletrônicos e seus componentes. Mas vai alcançar todas as cadeias produtivas de todos os produtos.

O consumidor tem também um papel fundamental em todo este processo. Na verdade os consumidores não estão preparados. Temos um apego ao que usamos, não temos a cultura de devolver. Abrimos nossas gavetas e encontramos montes de celulares, baterias, carregadores sem uso guardados. Neste sentido, a acessibilidade também é importante, não temo obrigar o consumidor a se deslocar por quilômetros para devolver seus produtos usados.

Pela nova lei os consumidores serão obrigados a devolver os resíduos sólidos sempre que haja sistema de coleta seletiva eficiente. Também deverá acondicioná-los adequadamente e de forma diferenciada, além de e disponibilizar adequadamente os resíduos sólidos reutilizáveis e recicláveis para coleta ou devolução.

Fica um desafio novo também para as entidades que representam os consumidores para que atuem de forma propositiva na mobilização e capacitação dos consumidores. Isto porque a responsabilidade compartilhada quer dizer que cada ponta tem de atuar. Se uma das pontas falha, o sistema não funciona.

Coleta seletiva em São Paulo – Eduardo Ferreira de Paula – Comissão Nacional do Movimento Nacional dos Catadores de Resíduos (MNCR)

Na cidade de São Paulo há cerca de 20 mil catadores, a maioria trabalhando de maneira informal e em más condições.
Parte pequena deles fazem parte das 20 cooperativas conveniadas com a Prefeitura, com média de 50 cooperados cada uma. A Prefeitura paga as despesas (água, luz, telefone, galpão). As cooperativas se encarregam da gestão dos catadores e da prestação de contas.

Mas a prefeitura não paga pelos serviços dos catadores porque entende que sua parte já está coberta pelo pagamento das despesas. Há um tema aí que precisa ser melhor discutido e que se refere ao pagamento pelos serviços ambientais que os catadores prestam.

A coleta propriamente dita é feita por empresas contratadas pela Prefeitura, que geralmente usam caminhões compactadores. O Movimento acredita que a coleta deveria ser feita usando caminhões-gaiola, que não compactam os resíduos, e que os catadores deveriam participar deste processo, deveriam estar mais visíveis para o publico, e não “escondidos” nos galpões.

Em São Paulo, apenas 1% dos resíduos sólidos produzidos na cidade são recicladas. A cidade produz cerca de 14 mil toneladas de lixo por dia. Além das cooperativas conveniadas, há 96 grupos de catadores sem convênio com a Prefeitura.

Para o MNCR, o modelo de coleta seletiva solidária inclui a coleta porta-a-porta, participativa, com educação ambiental, com os catadores na rua participando da coleta, com autogestão democrática, valorização do trabalho dos catadores, infraestrutura adequada e pagamento pelos serviços ambientais prestados. Várias cidades já tem implementados estes aspectos. Mas não em São Paulo.
A catação de lixo bem organizada não é uma questão puramente social, mas é de negócios também.
Em termos de condições de trabalho já existem soluções desenvolvidas como carrinhos elétricos que levam cargas de até 300 kg, o que aumenta não apenas aumenta a quantidade de resíduos transportados, como a quantidade de catadores que deles se beneficiam.

É importante fechar os lixões e investir em aterros sanitários corretamente planejados e construídos. Mas é importante que o fechamento dos lixões leve em conta os catadores que deles vivem, na sua da inclusão social.

A catação de lixo bem organizada não é uma questão puramente social, mas é de negócios também. Não se trata mais tratar os catadores como coitados, mas como gente produtiva e que exerce um papel importante na cadeia produtiva e isso tem de ser reconhecido.

O modelo brasileiro de organização dos catadores é referencia mundial. Existe uma Rede Latinoamericana de Catadores, cuja sede está no Brasil. O que se procura é levar esta experiência para outros países da região.

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