O G-20 quer obrigar as
empresas multinacionais a revelar seus agressivos esquemas de otimização
tributária para as autoridades fiscais de cada país onde operam e obtêm
lucros, para forçá-las a pagar o imposto devido.
O grupo das maiores economias desenvolvidas e emergentes anunciará
hoje um plano global de ação para neutralizar as brechas pelas quais as
multinacionais desviam artificialmente lucros e dividendos para
jurisdições com impostos baixos ou inexistente.
Entre as 15 recomendações do plano, ao qual o Valor teve acesso, estão um futuro "realinhamento de taxação" e novos padrões tributários internacionais.
A negociação entre os países para definir as medidas é prevista para
ser concluída em 2015. O texto defende a importância de implementação
rápida das medidas. Mas alerta que elas não poderão ser bem sucedidas
sem mais transparência. Por isso, a importância de obrigar as companhias
a revelar "transações agressivas ou abusivas, arranjos ou estruturas"
de seu planejamento tributário para o fisco de país a país onde operam.
Para o G-20, a "erosão da base de imposição de impostos e
transferência de lucros" pode minar a justiça e integridade dos sistemas
tributários. Isso ainda distorce a concorrência, pois as empresas com
atuação internacional ganham vantagem competitiva em relação a empresas
que operam principalmente no mercado doméstico.
O plano de ação, preparado no âmbito da Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Economico (OCDE), procura cobrir todos os aspectos que
hoje permitem às empresas multinacionais se aproveitar de assimetrias
nas regras tributárias domésticas e internacionais para pagarem menos
impostos.
A estratégia de transferir artificialmente a declaração de lucros
para paraísos fiscais afeta não só os países industrializados, mas
também as nações emergentes e em desenvolvimento.
Usando legalmente brechas deixadas pelos fiscos ou tratados
tributários, muitas múltis acabam pagando apenas 1% de seus lucros,
quando a média de imposto sobre as empresas nos países ricos é de 24%.
Não é à toa que paraísos fiscais aparecem no topo dos investidores
direitos externos (IDE). Para os governos, a perda de centenas de
bilhões de dólares por ano tornou-se hoje insuportável com a crise
global.
As maiores economias do mundo se engajam agora em estabelecer um novo
padrão tributário para "garantir a coerência da tributação do
rendimento das empresas em nível internacional", e resolver diferenças
entre sistemas tributários dos países, sempre respeitando a soberania de
cada um para desenhar suas próprias regras.
Serão revisadas as regras atuais para acordos de bitributação e preço
de transferência (valor cobrado por uma empresa na venda ou
transferência de bens, serviços ou propriedade intangível a uma empresa a
ela relacionada). A ideia é que no futuro seja assegurado que o
resultado do preço de transferência esteja em linha com o valor criado,
por exemplo. Deverá ser mais alinhada a alocação do rendimentos com a
atividade econômica que gera o lucro. A documentação de preços de
transferência será reexaminada. As regras deverão facilitar coleta de
informações sobre rendimento, atividade econômica e impostos pagos entre
os países.
A definição de "estabelecimento permanente", que é importante e
necessário para atenuar ou evitar a dupla tributação internacional, será
atualizado para prevenir abusos por empresas.
Boa parte do dinheiro que escapa das autoridades tributárias em
direção de paraísos fiscais deixa os países por meio de pagamento de
royalties ou de juros sobre dívidas. Dessa forma, Google, Apple,
Starbucks e outros cobram royalties de subsidiárias em valor
praticamente equivalente aos lucros gerados num país. E sem lucro
tampouco há imposto a pagar.
Pelo plano de ação, os países vão definir regras para limitar o
pagamento excessivo de royalties. Para enfrentar os desafios tributários
na economia digital, o plano poderá, na prática, forçar as empresas a
pagar royalties por software e serviços nos locais onde foram
desenvolvidos. Por exemplo, na Califórnia, e não mais em paraísos
fiscais.
Se o plano se desenvolver, como esperam alguns países, as companhias
terão severamente limitada a margem para criar dívidas para fugir de
pagar impostos. Serão examinadas novas regras para definir quanto de
dívida é atribuído às subsidiárias com o objetivo claro de evitar
taxações. O grupo quer limitar a erosão da base via deduções de juros e
outros pagamentos financeiros excessivos.
O plano pretende reforçar as regras sobre companhias estrangeiras
(controlled foreign company, CFC). E evitar que companhias escapem de
fixar "presença tributária" nos mercados onde têm grandes atividades.
A expectativa é de os países desenharem um conjunto de regras em dois
anos. O exercício obrigará os países a examinar mais de perto o impacto
econômico disso tudo nos fluxos de investimentos, e em como estabelecem
a política tributária em nível nacional.
Mas o desafio é enorme. Como notam analistas, os governos são
cúmplices do que procuram combater agora, na briga para atrair empresas.
Assim, mesmo uma reforma mínima é complicada. O primeiro instinto de um
país é competir para atrair empresas, não para cooperar.
Os ministros de Finanças da Alemanha, da França e do Reino Unido, ao
lado do secretário-geral da OCDE, Ángel Gurría, vão divulgar o plano de
ação hoje, em Moscou. De seu lado, os EUA já deram a entender que não
aceitarão regras duras que mirem as companhias da era digital e só quer
mudanças "moderadas" nas regras tributárias internacionais.
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